40. Muito além do prazer

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Desde muito cedo aprendi que nada na vida é fácil, pelo menos não as coisas pelas quais vale a pena lutar.

Depois de tudo que fui obrigada a passar devido ao abandono dos meus pais; que apesar de já ser uma mulher adulta e independente, não diminuiu a dor ou os efeitos desse abandono; eu resolvi me fechar para quaisquer tipos de sentimentos. Foi a forma de autodefesa mais eficaz que encontrei de me resguardar de novas decepções. Minha atenção e sentimentos ficaram 100% voltados para David e a URBAN, que se tornaram minhas prioridades.

O casamento com Robin, analisando friamente hoje, eu sei que foi por pura carência, por acreditar não ter mais ninguém ou ser o desejo de alguém. Uma fase difícil na minha vida, onde a falta de afeto me fez projetar todas as minhas expectativas no meu atual namorado na época. Que ingênua eu fui. Não podemos analisar nossos erros com a cabeça que temos hoje, mas sim com a que tínhamos naquele momento. Assim como qualquer outro jovem, eu sempre via os casais felizes nos filmes e até mesmo ao meu redor, e assim eu fantasiei minha vida e a vida que eu pretendia construir com Robin, baseada no homem que um dia ele foi.

Até hoje, no auge dos meus quase 33 anos, eu ainda não conheço esse tipo de amor, avassalador, arrebatador... Na verdade, desde minha desilusão matrimonial, não tive mais a necessidade de senti-lo.

Tudo o que eu precisei no sentido emocional, aquilo que eu buscava quando me desapeguei das fantasias do amor romântico, sempre pude encontrar em David. Um companheiro, um amigo, um conselheiro, um irmão...

Sempre fomos o remédio antitédio um do outro, não importava o que estivéssemos fazendo ou com quem estávamos, sempre estaríamos disponíveis um para o outro e era uma regra não escrita, era natural, sem o menor tipo de cobranças.

O fato dele ter uma filha e sua atenção ser obrigatoriamente dividida entre nós, nunca foi um problema, sempre compreendi suas limitações. David se dividia em dois, nunca deixando a desejar em nem um único aspecto, provando a pessoa incrível que ele sempre foi. Se brigamos nos entendemos, se erramos nos desculpamos e nada mudaria esses fatos.

No entanto, depois de alguns acontecimentos internos, externos e essa  confusão de sentimentos em que me encontro, eu me peguei pensando em nossa amizade. Ela é algo que quero manter para sempre em minha vida, quero tê-lo, se possível, até o último dos meus dias. A ideia de me afastar, de vê-lo me afastar e até mesmo me repudiar é nauseante.

Estou tão acostumada com sua presença, que é como se eu precisasse de suas opiniões, conselhos, piadas sem graça, brigas e tudo dele em minha vida, para que pudesse me sentir capaz de seguir em frente, sabendo que o teria ao meu lado para me segurar quando eu fraquejar.

Eu o amo e sei que ele me ama, nunca precisei duvidar disso até esse momento, onde a situação é diferente, diferente ao ponto de duvidar não somente dele, mas de mim mesma.

Não acredito em amor incondicional, naquele amor fantasioso que tudo supera, que tudo perdoa. Existem coisas imperdoáveis e que mesmo você tendo uma boa justificativa, não torna o seu erro menor. Eu o amo, mas estou num caso escondido com a filha dele, quebrando sua confiança, enganando-o. Subi numa montanha no momento em que Emma me beijou, e conforme eu pensei nela, conforme eu continuei a seu encontro, entregando-me, fui parar no topo, onde há apenas um precipício sem fundo, sem final, onde estou presa e não há como voltar por onde vim.

A diferença entre mim e Emma, é que ela sempre o terá, ele é pai dela, afinal, nunca poderá quebrar esse laço. Mas eu corro o risco de perdê-lo para sempre e esse é o meu maior medo, abdicar da amizade que construímos ao longo dos anos por algo duvidoso e com tantas barreiras.

Não é fácil sentir o que estou sentindo, não é fácil admitir para mim mesma que alimentei sentimentos por alguém tão inalcançável, mas ao mesmo tempo tão acessível. Quando entrei nisso, sabendo que era errado, sabendo o final que teria, que tipo de defesa eu usei? Quais escudos utilizei para me proteger disso? Nada, não fiz absolutamente nada para evitar que isso acontecesse, minha ignorância foi minha própria desgraça.

His Daughter - SwanQueenOnde histórias criam vida. Descubra agora