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FREDO

Milão
28, abril 1997

Naquela tarde ele precisou se recuperar um pouco de tudo que aconteceu. A morte do seu maior capanga com certeza havia afetado sua mente em uma intensidade esmagadora. Mesmo sentado ao lado de fora de sua casa, recebendo o máximo de vento ele não conseguia respirar normalmente, já que seu corpo entrava em tremor como um viciado sem heroína. Tudo girava em seu redor, inclusive seu estômago. Al tentou se conter e deixar a sensação de que algo de ruim estava para acontecer com ele, mas não conseguiu manter as lágrimas e os gritos de pânico que clamavam por despencar sobre em seu resto.

Da mesma forma que sentia tudo de uma vez só, não sabia exatamente do porquê chorava. Afinal, existia em você o sentimento de maior poder dentre os outros naquele momento: o pânico.

E como se não bastasse, já haviam se passado 2 horas desde que Marco saiu. E seria realmente paranoia excessiva se em sua vida inteira, Marco não fosse extremamente pontual.

Al olhou mais de 20 em seu relógio, rezando para que sua visão embaçada tenha confundido o horário a pelo menos 10 minutos antes. Porém, para seu desespero, depois de enxugar o rosto e se acalmar mesmo que 1 batida cardíaca, pode ver com clareza o horário que marcava.

14:08

Prontamente se levantou da grama do jardim, e correu para seu escritório ligar no telefone de Marco, mas sem nenhum sucesso. Entretanto lembrou de um detalhe que o irmão tinha lhe dito: ele iria se encontrar com Aléssio. De imediato, o chefão discou os números e aguardou na linha por um tempo, de forma que seu pânico aumentava a cada chamada.

— Aléssio Moretti, quem fala?

— Ah Dio mio, grazie... Marco está com você?

— Ahm... Não.

— Como assim "não"? Que horas ele saiu daí? Onde você está? Ele disse pra onde iria?

— Fredo você liga pro meu telefone pra saber do Marco? E como eu vou saber onde ele está, se eu nem se quer falei com o seu irmão hoje?!

Ah Dio mio...- disse Fredo ao desabar.

Al não fazia ideia do que fazer, mas tinha certeza de quais passos o irmão tinha seguido para que chegasse ao seu destino final. Ele largou o telefone fora do gancho com Aléssio ainda na linha, se sentou de qualquer modo no chão do escritório de disse a frase que ele mesmo repetia em sua mente.

— Nós estamos perdendo, fratello. Estamos perdendo tudo...

— Que tipo de merda você está falando? Será que pelo menos uma vez na vida pode me explicar o que exatamente está acontecendo, porra?!

Al olhou para o telefone que continuava suspenso entre o chão e a mesa do escritório. O irmão do meio que entrava em pânico a poucos segundos atrás, apunhalou o telefone novamente e o grudou no ouvido para explicar tudo para o mais velho.

X

17:28

Ele estava sentado em sua poltrona, e depois de ter tomado alguns calmantes que Apollonia lhe deu, parecia mais calmo. Na verdade por algumas horas ele apenas existiu. Observava cada detalhe de cada objeto ou pessoa que olhava. Falava pouco e sorria quase que a todo momento. E mesmo vendo que a expressão de Apollonia não era nada feliz, ele continuava a dizer que ficaria tudo bem, e que logo Marco acordaria.

— Não podemos deixar que ele vá ao velório. É muito perigoso, na verdade tanto para ele quanto para nós.

— Eu irei. - afirmou Apollonia - Pode não ser meu irmão de sangue mas o considerava. No caso do Al eu concordo. Ele não está em condições de ir nem a um praça. Ei Fredo- disse ela ao se agachar-, vamos ter que ficar um tempinho separados ok? Mas não se preocupe, eu farei de tudo para que você volte logo, está bem?

Ele apenas continuou a cultivar seu sorriso inocente.

— Você o ama, não é? Tudo bem se quiser mentir, vou continuar com minhas certezas.

— Aléssio amando ou não, se alguma coisa o acontecer eu morro. Por isso temos que mantê-lo em segurança pelo maior tempo possível.

Conforme o novo irmão mais novo ouvia as palavras de Apollonia com nenhum tom de clareza que faça sentido em sua mente, foi adormecendo ali mesmo em sua poltrona, até não haver mais nada.

X

29, abril 1997

Na manhã e tarde do dia seguinte, Fredo passou inteiro com Apollonia. Eles dois tinham consciência o suficiente para saber que poderia de fato ser a última vez que eles passariam um dia inteiro juntos, então lá estavam deitados contemplando o teto do único lugar em que eles estariam seguros o suficiente.

O quarto do Al sempre foi o maior da casa, mas ele só parecia ter percebido isso naquele momento. Certamente o mal humor que Kate guardava ocupava muito espaço ali. Mas do mesmo jeito, ele se sentiu tão sufocado quanto em seu casamento. Talvez até pior.

Ninguém o segurava pelo pescoço ou abafava seu rosto com um travesseiro, mas o pobre Fredo sentiu que talvez a ida para Roma possa fazer mal à Apollonia, caso ela realmente pense que ele a ama. Ele não tinha certeza mas torcia tanto dentro de si, que surpreendentemente, de alguma forma estranha ou não, Apollonia tocou no assunto.

— Fredo você gosta de mim?

— O que? Claro... É claro que eu gosto de você.

Apollonia parecia tão insegura ao olhar nos olhos dele, mas mesmo assim não desviou-os um segundo.

— E você me ama?

Ele demorou um pouco para responder. Mesmo sabendo a resposta, Fredo sabia que não soaria bem aos ouvidos dela, apesar de ser verdade. Não era do modo que ele queria e sentia extrema culpa por isso.

Ele iria a proteger de todo mal que viesse se virar contra ela, mas entendia que pra isso tinha de deixar claro o que era ou não o "amar" dele. "Queria poder te amar como você espera que eu ame." ele pensou antes de reformular para:

— Você é o meu amor, Lônia.

X

O tempo voou como um foguete, sendo que a cada olhada no relógio, Al via uma nova hora se passar.

Marcavam 23:41 quando começaram a primeira chamada do voo para Roma. E lá estava Fredo, Apollonia e o mínimo de seguranças possíveis para manter descrição.

— Eu tenho que ir... - disse ele.

— Eu... Vou estar aqui quando voltar.

O máximo que conseguiu foi soltar um leve sorriso e a abraçar forte o bastante para segurar as lágrimas dentro de si. Al realmente se sentia pegando um voo para o submundo da morte ou literalmente o inferno. Mas ele não via muito problema nisso, só temia que ele não fosse o próximo a queimar lá.

Fredo costumava dizer que não temia a morte, mas que também não queria morrer. Isso era um fato na maioria das vezes. Aquela solitária noite fazia parte da minoria suicída.

Os Solitários de 1997Onde histórias criam vida. Descubra agora