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APOLLONIA

Milão
16, junho 1997

Apollonia só foi confessar seu feito à Aléssio dois dias depois de ter o feito, seguindo uma idealização vaga sobre a reação dele ser um tanto quanto calma e compreensiva. Mas não adiantou de nada tal espera, já que os gritos de Aléssio dizendo repetidamente "Por que você fez isso?" disputava espaço da cabeça dolorida de Apollonia.

— Eu fiz o que você deveria ter feito à muito tempo atrás!! Depois de tanto ouvir promessas sobre uma vingança sem ver nada parecido, decidi agir por conta própria! Eu não tenho sangue de barata!!

— Apollonia, você não matou um capanga, uma empregada, um afilhado... Você matou a mulher dele!!

E ele matou o seu irmão!!! A morte do Marco pode ter sido só um aviso pra você, mas pra mim não!!! E se pensa que vou deixar a segurança do único que me resta em suas mãos - ela tentou se acalmar - pode tirar seu cavalo da chuva. Não vou deixar que levem o homem que amo.

Aléssio continuava em pé, mas agora encostado ao batente da porta do escritório dela, aparentemente buscando tirar algumas palavras de sua boca, mas falhou miseravelmente. O que de fato facilitou sua saída porta à fora.

Apollonia não se sentia culpada, no entanto, a ira a consumia como um leão. Tinha raiva de Aléssio por não compactuar coma vingança de seu próprio irmão, por não ter imposto vigilância e escolta alguma para o pobre Fredo que continuava em Roma, e por querer de alguma forma, assumir o lugar de que não cabia a ele.

Porém o telefone tocou. Tocou 1, 2, 3 vezes até que ela criasse a possibilidade de ser quem ela torcia que fosse. E realmente era.

— Buonasera, Lônia.

— Fredo!! Dio mio, quanto tempo que não ouvia sua voz... Como você está?

— Ahm... Até que bem. Liguei para saber de você e das coisas que ouvi no jornal hoje.

— Então... Você já sabe que fui eu?

— Como não reconhecer um ato seu, se eu mesmo a treinei para agir assim? - riu ele - Lônia, você é meu maior orgulho! Quando a vejo pela TV, tenho a certeza de que está sabendo lidar muito bem com tudo isso.

Apollonia encheu os olhos, mas não deixou que ele percebesse isso.

— Fredo... Mesmo que estejamos separados um do outro, ainda amo você. E eu vou estar aqui pra você quando voltar.

Houve um silêncio incrivelmente caótico antes que ele pudesse completar com:

— É muito bom saber disso, Lônia.

X

Depois de algumas horas passadas, ela ainda refletia insanamente sobre a ligação que teve com Al. "É muito bom saber disso" não era exatamente a resposta que esperava. Talvez o antigo Al diria de uma forma diferente, com palavras diferentes, que transmitissem uma impressão diferente. E por mais que existissem milhares de interpretações, apenas uma delas parecia ter a certa.

Afinal, ele poderia muito bem ter parado de a amar nessas últimas semanas em Roma. Quem garante que ele não tenha encontrado qualquer vagabunda mais interessante que ela por lá?

Fredo disse que ele a treinou para ser como é hoje. E é provável que ele mesmo tenha a ensinado a pensar tanto assim, no que muito provavelmente não devia. Assim como ele, Apollonia pensou primeiramente em como ficariam os negócios em meio à tudo isso. Ele se apaixonaria novamente e colocaria um espécie de Kate no lugar dela? Ou eles seguiriam como se nada tivesse acontecido antes de Roma?

Ela soube de cara que isso seria impossível. Ficaria marcado em sua memória até mesmo quando não quisessem lembrar.

E em cima disso, vieram várias outras incertezas sobre outros vários assuntos. Sua mente não conseguia ficar em silêncio consigo mesma, mesmo que o único barulho que ouvia ali era o canto dos pássaros. Se preocupou com as facções que a esperavam por respostas, em contratos mal resolvidos, em qual seria a próxima tacada de Coppola para cima dos Moretti e por Deus, Al ainda a amava??

Ela buscou resolver um de cada vez, escolhendo como o primeiro da lista fechar e renovar contratos com a elite Italiana. Apollonia buscou na gaveta do lado direito, na esquerda, no armário de cima e nos compartimentos debaixo, onde estavam misturados papéis de décadas passada, quando seu pai ainda comandava a família.

Depois de tanto procurar pareceu ter pego o certo. Mas ao abrir, percebeu ela que não era nada daquilo que procurava. A escrita grossa e escura não era nada familiar com as daquela época, além de conterem assuntos nada agradáveis.

Apollonia soube de cara do que se tratava. Seu pai costumava dar à comparsas, certos papéis de sigilo e lealdade, para que nunca revelassem quem foi o morto que ele havia mandado matar.

Os dois primeiros nomes eram em ordem: o mandante e o comparsa. De Santis, o velho cafetão ocupava o segundo lugar no contrato, o que não a surpreendeu nem um pouco. Ela sabia que embora seu pai havia sido presente e atencioso, ele não era um homem bom.

Foi necessário procurar no meio de grandes parágrafos o nome de quem morreria naquela situação, e quando viu de quem se tratava, se arrependeu profundamente de ter aberto aquela maldita gaveta.

"Vincenzo Moretti"

Em um primeiro momento, banalizou de todas as formas, qualquer possibilidade de comentar aquilo com os Moretti. Era certo que iriam a odiar pelo que seu pai havia feito. Vincent partiu cedo demais. Todos sabiam disso, incluindo ela.

Mas mesmo com medo, sentiu que havia de se desculpar com uma certa pessoa - mesmo que não tenha sido ela a culpada.

Os Solitários de 1997Onde histórias criam vida. Descubra agora