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FREDO

Roma
1, agosto 1997

Naquela mesa ele sentava ansioso por quem estava por vir à alguns metros longe dele. Mona desfilava com um vestido dourado, brilhante como o sol e chamativo o suficiente para cativar os olhos de Al, mas não ao ponto de o deixar cego. E mesmo se ele não quisesse, não havia como desviar seus grandes olhos verdes de cada parte de dela.

E antes que pudesse cumprimenta-lo, Fredo se levantou para receber a apaixonante dama de dourado. Ela se aproximou dando oi, mas ele nem quis saber de cumprimentos formais. Al realmente não queria saber mais de nada, parecia como um sonho calmo mas tentador, que te prende à ilusão da forma mais linda possível, até você despencar e cair na realidade cruel da solidão e culpa. Mas por enquanto ele não estava ligando para o que aconteceria depois do sonho, ou o tamanho da queda quando acordar. Ele só gostaria e ter um jantar perfeito, com a mulher perfeita, de um sonho perfeito.

Porém, demorou cerca de 4 minutos depois da entrega dos pratos, para que a grande queda ameaçasse acontecer. Mona que contava as novidades e notícias como em qualquer outro dia, comentou sobre o depoimento da misteriosa Apollonia.

- Ah Dio mio...

- Eu sei, é lindo ela não ter confessado. Mas você não acha meio dependente? Quero dizer, ela não me parece bem consigo mesma a muito tempo desde que o... Como se chama?

- Ahm... Marco.

- Desde que Marco sumiu... Ela o ama com toda a alma, isso é lindo mas pode a matar. Você não acha?

Fredo não conseguiu parar de olhar para o lustre branco que iluminava aquele grande salão. Tentando disfarçar o fato de ter viajado por meio mundo e por meio milhão de sentimentos muito poucos explicáveis, mas que não traziam nem um pouco de paz.

Mesmo tendo a certeza de que de acordo com o plano, ele teria de amar Apollonia. O que naquela época não era uma realidade. De acordo com o plano ele teria de oficializar tudo isso. De acordo com o plano ele teria de sacrificar sua própria felicidade para um bem ainda maior. De acordo com o plano, Fredo teria como resultado, uma alma descansada, em paz. Ele já até havia escolhido seu destino final: Toscana.

- Vin? Está ai?

- Ah, é. É bem preocupante.

Mona desconfiou por um instante. Pareceu ter percebido o possível desconforto que ele estava, ou a transe em que havia entrado desde o momento em que tocou no assunto, então decidiu desviar a conversa para outro caminho.

- Deus do céu, aquilo é um piano?

Ela apontou para detrás dele, que ao virar seu corpo para trás pode ver ao longe o instrumento que provavelmente era disponível ao público pagante caso quisesse tocar.

- Você toca?

- Claro!! Eu estudei piano o fundamental inteiro!

E então ela foi, desfilando como um anjo em direção ao enorme piano preto. Sentou-se sobre o pequeno banco, prendeu o cabelo, e começou a tocar.

Fredo se permitiu esquecer de tudo. Deixou que seus olhos se enchessem de lágrimas de emoção, mesmo cheio de motivos para que elas fossem de tristeza. Deixou que um sorriso se abrisse em um longo espaço de tempo em que ele a observou tocar. E provavelmente tendo a certeza de que ele não a veria tocando uma outra vez, houve de capturar uma foto, na mesma pequena câmera que carregava consigo o tempo inteiro.

A música teve seu fim, ela voltou para seu lugar e ele escondeu as lágrimas salgadas que não eram capazes de alimentar sua garganta seca.

- O que achou?

- Foi lindo. Foi... Muito lindo mesmo, Mona.

X

O lençol que o cobria, fazia efeito como uma teia de aranha ao prender um inseto. O mantinha na enorme cama, preso e sem energia, provavelmente pela noite passada, que em detalhes se lembrava muito bem.

O quarto de Mona era claro, as janelas do apartamento no centro o transmitia uma luz de cegar os olhos e um barulho de cerrar os ouvidos. Porém era aconchegante, com certeza. E mesmo com algumas peças de roupas de Mona jogadas pelo chão, Al não tirou pontos por isso. Afinal, ele tinha consciência de quem tinha as jogado ali.

Ele buscou por todos os cômodos, e de fato, ela já havia saído. Ele queria a esperar, mas o pobre Fredo que mantinha a imagem de Vincent como um homem pontual, já estava atrasado para mais um dia de pânico.

Vestiu-se como na noite passada, arrumou o cabelo o mais rápido possível, e antes que pudesse sair sem deixar rastros, anotou em um caderno qualquer um significativo bilhete, para a moça que ele desejou tanto na noite passada.

"Ho amato la scorsa notte, mia Mona
dovevo andare al lavoro, ci vediamo stasera?

Con affetto, Vin"

E partiu em direção departamento.

X

As manhãs de Roma, como sempre continuavam nubladas e sombrias, ainda mais com o semblante nada feliz que Ted carregava consigo.

- Isso é hora, Vincent?

- Você é um detetive fodido e quer me cobrar atraso? Vai se foder, Ted.

Quem ligava para como, ou quem ele ofenderia? Não era a imagem dele que estava em risco, e sim a de um morto em decomposição.

Porém, apesar dos primeiros sinais daquele dia de trabalho possam ter aparentado ruins, Fredo não deixou que isso acabasse com sua felicidade.

Então seguiu em frente pelo longo e largo corredor branco, usou o elevador mais suspeito de periculosidade, virou à esquerda e entrou pela porta amadeirada que dava acesso ao seu caótico escritório solitário.

- Dio mio... Dai-me paciência... - disse ele ao se espreguiçar sobre a grande poltrona.

Fredo observou a pilha que tinha em suas mãos, referente à sua família. Ele se sentiu seguro, calmo e até um tanto entusiasmado. Por outro lado, ao olhar para a pilha guardada no enorme armário de pastas, sentiu seu estômago se torcer como um pano molhado.

Em algum momento ela teria de ser investigada. Aberta e estudada com calma. Ele sabia que isso aconteceria, mas lhe doía só de pensar nas consequências ao analisar os chorosos papéis. Mas mesmo que em prantos ele estava, apunhalou metade da grande pilha, a jogando parte por parte sob a grande escrivaninha. Sentou-se com um certo ódio, abriu as páginas com tanta rapidez quanto tirar um curativo, e estudou com cuidado aquilo que seus olhos enxurrados eram capazes de enxergar.

Começou por início na pasta onde apresentavam cada membro da família Coppola. Tinham nomes, idades, nacionalidade e informações diversas. Os nomes eram: John, o don; Leônidas, o filho que Marco havia assassinado; Catarina, esposa de Johnny; E por fim Ângela, a única entre todos eles que não tinha identificação.

Era uma anônima, pelo o que parecia. Uma alma livre dentre as culpadas e sombrias. A provável salvação daquela condenada família, entretanto a possível maior e melhor arma que Coppola poderia ter. Ao mesmo tempo que Ângela era a herdeira de toda a fortuna Coppola, também não era ninguém. Não era nada. Como uma fumaça preta em um espaço de completa escuridão.

Ele buscou em outras páginas e em outras pastas qualquer informação a mais que pudesse se obter além de idade, nome, nacionalidade e cor. Buscou características, suposições de onde poderia estar, do por quê não foi apresentada à mídia e principalmente: seu secreto rosto.

Ele não achou o que queria. Mesmo depois de 3 horas inteiras vasculhando dolorosamente as gigantescas pastas, a única coisa que achou foi vaga e nada certeira para o novo Vincent.

"Há muitos indícios de que ainda vive na Itália. Mais precisamente perto ou exatamente na cidade de Roma, Lazio."

Os Solitários de 1997Onde histórias criam vida. Descubra agora