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FREDO

Roma
22, maio 1997

Tudo e todos ao seu redor parecia o observar com o olhar de desconfiança mais súbito que algum dia alguém lhe olhou. Poderia ser apenas uma impressão gerada pelo sentimento de pânico que Fredo sentiu naquele momento, mas mesmo assim ele quis garantir que ele não seria descoberto naquele dia. Mesmo que sua aparência estivesse muito diferente desde a última vez que deu as caras para a mídia.

Al então parou de correr, entrou em uma das milhares de cabines telefônicas implantadas nas grandes avenidas de Roma e discou o número de Apollonia. Porém sem sucesso. Ele esperou, esperou e esperou por cerca de 15 segundos até a linha cair. Depois ligou novamente, com as mãos trêmulas porém cuidadosas para que elas não errassem o número que discava.

Surrou a pobre cabine transparente feita de um material incrivelmente solto e fraco, após a linha cair novamente. "O que diabos ela está fazendo?" Ele se perguntou incrédulo. E ao discar um número diferente dessa vez, lhe trouxe lembranças que não eram nada agradáveis.

- Aléssio? Por Dio, viu as manchetes de hoje?

- Tenho ciência do que está ocorrendo fratello. Mas que fique tranquilo, vamos resolver isso o mais rápido possível. Só peço para que tome cuidado ao sair e principalmente: não mantenha contato com ninguém!

Ele sentiu um pouco com a última frase. Temendo que haveria de largar o emprego que conseguira.

- Apollonia está ai? Você a viu hoje?

- Fredo eu nem se quer liguei pra ela ok? Veja, são 8 da manhã, fratello! Ela deve estar dormindo agora.

- Ah Dio, tomara que sim. Aléssio me escute, por favor. Eu sei que por ironia do destino eu não estou mais no controle dos meus próprios negócios, mas se tem uma decisão a ser tomada quanto a segurança dos negócios, terá de vir de mim. Então...

- Trate de se manter calmo, fratello. -interrompeu o irmão ao outro lado da linha- Por Dio, você tem que manter a sanidade e largar a necessidade de comandar tudo ok? Apollonia está no controle de tudo e sabendo lidar perfeitamente com tudo isso, mesmo com meses de aprendizado. E além disso, pode até não acreditar, mas ela mudou muito desde que você se foi.

- Você acha que eu não confio nela? Mar... - ele engasgou- Aléssio, por ela lhe confio a vida. Mas se quero que algo saia perfeito, terei que faze-lo eu mesmo. Eu não me refiro a isso sobre minha segurança, fratello. Eu não me importo comigo. Apenas com os negócios!

Fredo não esperou para ouvir nem se quer a resposta do irmão ao que teria dito. Pois muito provavelmente havia deixado a impressão de um ego alto, tão alto quanto de Coppola, que o mesmo desprezava. Mas o motivo pelo qual Al mantinha toda essa preocupação e zelo sobre os negócios ele tinha pleno conhecimento: medo de ver tudo indo água abaixo.

X

24, maio 1997

Seguindo as instruções que seu irmão havia lhe passado, o antigo chefão se mantinha trancado em seu novo apartamento obtendo em seu lado direito um pote de sorvete de chocolate e no esquerdo um telefone amarelo.

Ele se isolou da multidão de Roma, pois mesmo que achasse que em meio às almas vazias ele se camuflava, o perigo ainda estava a solta. Ainda mais depois daquela manhã.

Então, ao perceber que a partir daquele momento ele provavelmente teria um raciocínio lógico para entender e saber como lidar com tal situação, apunhalou seu caderno de anotações, uma caneta azul e começou a escrever. E escreveu tanto que sentiu seus dedos cansarem sobre o papel. Porém não parou de modo algum, pois ele tinha plena consciência que se ele mesmo não anotasse tudo que passava pela sua cabeça, não terminaria o que planejava desde a trágica morte de seu irmão.

E quando as palavras sumiram de sua mente como um livro que acabava de ter seu final, se deparou com mais de 25 páginas do pequeno caderno de anotações, repletas de detalhes que ele tinha certeza que em um futuro próximo - ou não- usaria.

Fredo voltou então, para o tédio mais súbito e deprimente que se encontrava minutos atrás. Jogado no sofá estava, ouvindo com total desatenção o que Andrea Mancini - uma entrevistadora de época- perguntava à psicóloga Lucia Greco sobre relacionamentos e seus intermeios.

- É muito fácil, por exemplo, termos uma relação onde não há nada, mas há algo. Por que isso acontece, doutora?

- Bene, nós temos dois casos nessa situação. O primeiro é quando os dois têm plena certeza do que querem, mas nenhum deles toma atitude, seja pelo contexto que os dois vivem, por problemas familiares, enfim. E o segundo é quando apenas um dos dois tem certeza do que sente. Talvez por mudança de comportamento, ou afastamento dessas duas pessoas em um determinado tempo possa ter ocorrido isso.

Fredo ao dar um pouco mais de atenção à entrevista, sentiu-se inseguro com o que a médica havia declarado. Pois ao juntas os fatos, levou o seu caso à uma conclusão que não era nada distante do que ela havia falado ali. Uma vez que seu irmão lhe falara que Apollonia mudara muito desde sua partida.

Al não tinha certeza sobre o que Lônia sentia verdadeiramente quanto à ele. Mas sobre os seus, convicção era o que ele tinha de sobra em seu coração e mente. Ele não a amava. E passou a sentir um certo alívio quanto isso.

Pensou em duas possibilidades, que provavelmente colocariam tudo a perder: a primeira se consistia em tentar ligar para Apollonia e fazer a tal pergunta que lhe deixaria em paz, ou o colocaria em estado de pânico. E a segunda era ligar para Mona, burlando as tais leis de segurança que Aléssio havia posto sobre seu controle.

Fredo colocou o pesado telefone amarelo sobre seu colo, e discou o número. "Se ela não me ama mais, que culpa eu teria?" ele se perguntou ao aguardar na linha.

- Mona? É o Vincent.

X

Ela servia um café à um velho senhor que se mantinha sentado em frente ao balcão quando ele entrou. E logo quando ela o viu, um sorriso doce se abriu.

- Boungiorno mio caro Vincent - cumprimentou ela.

- Giorno.

Depois disso, Mona lhe ofereceu uma xícara de café que jurava com a maior convicção do universo que seria o melhor de todos que ele já havia tomado. Seu rosto transparecia um nível de entusiasmo abundante, o que de certa forma deixou Fredo incrédulo em ver a animação da mulher ao trabalhar. E é claro que aceitou a bebida.

- Você é sempre animada assim?- riu ele.

- Só quando tenho visitas especiais.

Ele sentiu-se avermelhar.

- Não foi trabalhar hoje? - ela perguntou.

- Me deram folga. Senti que precisava de... Um tempo fora dessa bagunça toda.

- Não sabia que a vida de Vincent Vitale era tão complicada assim.

- É... Parece ser legal trabalhar como detetive, mas na verdade é muito complicado- afirmou ele sem mesmo tem passado 1 minuto dentro do tal lugar- Inclusive Mona, eu... Queria lhe perguntar uma coisa. - ela aproximou seu rosto ano dele para que pudesse escutar de forma mais ampla - Ultimamente eu ando me sentindo meio... É como se tudo fosse um silêncio... Quero dizer... As vezes você também se sente meio...

- Solitária? Claro, o tempo todo. É normal, acontece com todo mundo. Não deveria se preocupar com isso, Vin.

- É... Eu não ando legal não.

Os Solitários de 1997Onde histórias criam vida. Descubra agora