APOLLONIA
Milão
30, abril 1997Ela estava furiosa. Suas expressões diante à Aléssio não deixavam mentir se quer por 1 segundo.
— Mate-o.
— Apollonia - gaguejou Aléssio -, realmente acha que é uma boa ideia? Muito provavelmente gerarão mais suspeitas contra nós!
— Mate ou mato eu! - ela elevou o tom de voz.
— Está bem, mas que droga! Quer que mande lembranças pelo menos?
— Claro. Mas em meu nome.
Não houve mais discordância da parte de Aléssio, que apesar de parecer irritado com a decisão que
Apollonia tinha tomado por conta própria, confiava plenamente (ou não) nas decisões tomadas por ela.— Ah, não esqueça que daqui poucos minutos você terá...
— Um depoimento para prestar com um dos agentes do departamento de Roma, eu sei. - interrompeu. - Obrigada por lembrar, Aléssio.
Ele chacoalhou a cabeça e com um sorriso amarelo saiu do memorável escritório Palermo, que agora havia virado o local de trabalho de Apollonia.
Entretanto quando percebeu que finalmente estava sozinha, abriu por impulso a gaveta de sua escrivaninha e tirou de lá uma pequena caixa prateada.
Caixa essa que após abrir com um certo esforço, Palermo tirou de lá uma seringa com heroína. Sem pensar muito, amarrou a gravata que usava naquela manhã em seu braço e injetou com o medo mais forte que já havia sentido.
E quando percebeu, entrou em uma completa euforia consigo mesma. O mundo estava numa distorção de espaço e tempo, e ela sem muita consciência do que escutava ou falava. Se é que ela falava alguma coisa.
Ela escutou algum murmuro que parecia vir do vulto que flutuava de preto e sentava à frente, do lado, atrás... Em todo lugar que parecia haver algo, ou não haver nada.
— Como vai, senhorita Palermo? - parecia ter dito o vulto voador - Acredito que esteja desolada desse modo pela morte de seus amigos, eu entendo.
Os murmuros baixos viraram formas geométricas de cores que ela nunca havia visto antes, ou talvez de fato tinha visto. Tudo girava e parecia a cada segundo que não estava mais onde parecia estar.
— Bom, vamos direto ao assunto. Como a senhora deve saber, a família Palermo e Moretti estão sendo investigadas por envolvimento na máfia Italiana e...
— Deus!! Todos sabem que isso é verdade! Mas que se foda! Não podem me prender míseras bolhas acinzentadas! - protestou.
— Não compreendo o que a senhora entende por "bolhas acinzentadas", mas sei que sabe o que podemos ou não fazer contra você.
— Então está aqui por quê?
— Apollonia o departamento de investigação de Roma enviou-me aqui por um motivo único. Curto, direto e certeiro. Onde está o Moretti?
— Aléssio? Ora, veja: ele está ao lado de fora!
— Você sabe de quem estou falando, Apollonia. Onde está o Al?
Ela sentiu sua pele queimar como o sol, que ao mesmo tempo que parecia estar distante, ocupava o lugar da cabeça do vulto preto. Oque já estava girando, começou a ir numa velocidade maior ainda, como um carrossel à 100km/h.
Ela entrelaçou os dedos entre seus fios de cabelo, os puxando para trás como se estivesse tirando alguma coisa ruim de si, mas não saía de jeito nenhum.
— Ele... Eu não...
— Você sabe, eu sei. Não há como ele viajar e você não ter consciência de onde. O que vocês têm, aliás? Uma relação muito mal assumida ou apenas sexo, drogas e rock in roll?
Ela mal conseguia se mexer. Estava entrando em transe, mas antes que não pudesse dizer mais nada respondeu o agente dizendo:
— O Al não ouve rock in roll. É... Death metal.
O sol pareceu se mexer, para cima e para baixo como se entendesse a resposta de Apollonia. Mesmo que ela não tivesse certeza que estava dizendo as palavras certas, ou o se o que saíra de sua boca era realmente aquilo que escutava.
O vulto por inteiro, foi se remexendo enquanto voava, e saiu do nada que ali estavam, para um outro lado vazio - ou real - que lhe aguardava pelo outro lado de uma grande porta. Ou será que aquilo era na verdade um duto? Não havia certeza de nada, nem sabia se estava onde pensava estar. Se é que estava em algum lugar.
Não houve mais bolhas e formas geométrica após o vulto sumir no vácuo. Afinal, ela apagou no mesmo instante em que o vulto ultrapassou a porta.
X
Ela estava sentada sobre a grama de um enorme e vasto pasto. As árvores gigantes ao seu redor não se cansavam de exalar um vento fresco, que trouxesse para ela o cheiro doce que tinham as flores dos canteiros que ali estavam. Tudo estava em plena harmonia. Não existiam problemas, tristeza e muito menos pânico naquele lugar.
Lônia estava em perfeita paz consigo mesma, apenas apreciando a natureza e tudo que ela a proporcionava. Dois pequenos pássaros pousaram sobre o longo galho de uma das milhares de árvores a sua frente. O maior dentre eles, soltou um canto lindo como aquele dia, tão doce quanto o cheiro das rosas e margaridas. Porém por outro lado, o menor deles não cantou de um modo nada agradável. Um toque irritante e agudo. Mas quando despertou assustada percebeu que não havia pássaro nenhum e sim um telefone que clamava por ser atendido.
— Palermo, quem fala?
— Olá Lônia...
Houve um longo silêncio, tentando achar uma forma de não demonstrar desespero por ouvir sua voz, ou por saber que ainda estava vivo.
— Fredo... Come stai?
— Bem, eu acho. Eu... Queria saber se já velaram o Marco.
— Não. Ainda não. Aléssio achou melhor esperar para amanhã.
— Você viu o corpo? Está estampado nos jornais de todo o mundo. Maltrataram o meu irmão da pior forma.
— Aléssio me disse que é muito forte. Preferi não ver por... Sabe, medo de aflorar o trauma.
Uma lágrima caiu sobre o rosto de Apollonia conforme o silêncio de estendeu . Não por Marco, apesar de sentir muito, naquele momento deixara de lado para senti a dor do homem que mais amava naquele momento. Sentindo a dor não só pela distância e contexto, mas também pelo fato de Fredo ter partido sozinho. E apesar de ter passado o processo de luto pelo seu pai sozinha em NY, sabia que era um sentimento totalmente diferente principalmente pelo fato de serem pessoas diferentes entre si.
Ela sabia que chegaria o momento, seu pai não estava bem à anos e havia se preparado para o processo de luto desde quando o exame de câncer saiu do hospital. E no processo de luto, não ousou esconder o que sentia para o mundo e guardar consigo afim de virar uma fortaleza de tristeza.
Entretanto, Fredo não gostava de dividir o que sentia com as outras pessoas. Mesmo que tão próximos, ele nunca chegou a contar o que escondia no fundo de seu coração. Ela não sabia se era uma coisa específica ou vários acontecimentos que influenciam em tais pensamento e comportamentos. O que ela tinha convicção era que existia alguma dor, algum pânico ou ansiedade que em algum momento iria deixar de ser apenas um sentimento de pavor, para uma parte de si mesmo.
E talvez somente naquele momento ela soube que o que sentia por ele realmente era amor. Pois seu maior medo não era mais o temor por não ficarem juntos. E sim, ver Al voltando como uma pessoa de alma escura. Mas doloroso que não ver o Fredo mais, era ver o ragazzo dentro de si morto
— Eu vou estar aqui pra você quando voltar, Fredo. Não se esqueça de mim.
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Os Solitários de 1997
RomanceEsse livro é o primeiro da série "Solitários" e conta a primeira versão da história. Al ou para os mais próximos, Fredo, foi praticamente forçado a tomar frente dos negócios da família quando seu pai morreu, por conta da culpa que sentia dentro de...