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FREDO

Roma
1, agosto 1997

Al estava lendo seu novo livro na lanchonete onde Mona trabalhava como uma cadela.

— Por que não procura um emprego melhor? Você está se matando de trabalhar - disse ele dando uma pausa na leitura.

— Deixe isso pra lá, Vin. Ah olha, está no meu horário de almoço. Vamos nos fundos?

X

A parte detrás da lanchonete era tão sujo quanto um lixão, e mesmo que fosse à céu aberto dando visão à rua de trás, deixava claro os motivos pelo qual a vigilância sanitária recebeu uma denuncia.

— Vin, eu ganhei uma reserva para duas pessoas no Trattoria Vecchia e ahm... Bem, você gostaria de ir comigo?...

— Seria o dia mais feliz da minha vida.

Ela abriu um sorriso tão radiante como o sol.

— Apenas diga-me a hora em que devo chegar e estarei lá.

— Às 20:00?

— Está bem. Às 20:00.

No mesmo instante, deu as caras através da velha porta dos fundos o chefe de Mona, que a mandava trabalhar.

— Já estou indo, droga! - ela se irritou.

— Pense no que lhe falei. Você não vai passar fome se sair daqui.

— Ah é? E com que tipo de varinha mágica eu construiria um apartamento para morar sem ter que pagar aluguel?

— O solitário apartamento de um tal de Vincent pode lhe servir como moradia até... O resto da sua vida, talvez?- disse ele já planejando a compra de um apartamento novo.

Ela se espantou por um instante, provavelmente feliz por ouvir o que Fredo nem acreditava ter dito. De qualquer forma, ele nem ousou pensar nas consequências disso tudo, apenas deixou se levar pela vida feliz que aceitou viver, metade como Vincent e metade como quem realmente ele era.

— Às 20h! Não vai esquecer!

— Nem se eu quisesse.

Ela se aproximou e inclinou sua bochecha rosada para os lábios de Fredo, que apesar de tentar conter sua vontade de estragar tudo, não conseguiu se conter.

Ele a beijou certamente em um dos maiores surto de adrenalina que já sentiu. E ela, de maneira nenhuma se esquivou. Estava ficando mais sério a cada dia, Fredo sabia disso e ficava tranquilo até um certo ponto. O "certo ponto" se refere a quando ele lembrava que de acordo com o plano, eles terão um final não tão distante.

X
APOLLONIA

Haviam cerca de 6 montes de fotos jogadas ao gramado do grande quintal da casa Palermo. 6 montes cheios de memórias que ela provavelmente guardaria para o resto de sua vida. Haviam fotos desde o começo daquele ano, repleto de momentos e pessoas que ela gostava. Marco em vida, Aléssio e na maioria Al.

Cada monte era separado com a importância que as fotos tinham, tanto sentimental, quanto em caso de vida ou morte. E o nomeado mais importante, por ironia do destino não era comprovantes da participação de Coppola no tráfico, ou evidências de envolvimento na máfia. E sim, as fotos de seu querido amor, Al. Todas tiradas por ela, mesmo que não fosse em um momento específico, ou em um contexto explícito, ela preferia manter como prioridade as de seu amor, não as deu seus negócios.

Naquele momento, ela pensou que provavelmente Fredo não a colocaria como prioridade em quesito fotos, mas não houve de se importar muito. Afinal, ela sabia que Al colocava os negócios acima de tudo, menos dela. Ou pelo menos era isso que ela pensava.

O dia continuava nublado, assim como Marco havia deixado no dia que partiu. E mesmo estando o verão, pelo menos Palermo deixou de expor seu sol às pessoas. Ela sentiu isso como um aviso. Um aviso que lhe dizia no ouvido que ela deveria seguir com sua vida abandonando tais fotos do falecido ragazzo que lhe causava tamanha dor. Porém, teimou consigo mesmo e com o tempo nublado da cidade ao guarda-las todas em envelopes que determinavam o conteúdo.

— Por mim está tudo bem não ver o sol novamente. - disse ela a si mesma conforme aumentava o som do rádio ao seu lado.

Ela sentiu que não foi um acaso, uma coincidência do destino fútil daquela rádio antiga. Ela sabia que tinha sido para ela, mas preferiu não acreditar. Por fim, Apollonia apenas cantou e ouviu "I'll Never Smille Again", conforme as amargas e doloridas lágrimas desvendavam caminho por seu rosto.

Seus olhos ficaram fechados a maior parte da música, e quando se abriam, fixavam-se no horizonte que não era nada claro com a lágrimas embaçando.

— Interrompemos a transmissão desta tarde, para anunciar que o depoimento de Apollonia Palermo referente ao sumiço de Don'Al foi cedido à mídia nacional. Não se preocupem, será transmitido em todos os canais abertos do país. Até daqui a pouco, Itália e companhia!

Sua alma que viajava pelos ventos na neblina, voltou como uma máquina ao seu corpo ao ouvir o anúncio do novo repórter que havia tomado o posto de Brad Connor como fofoqueiro e difamador local.

Apollonia passou a se odiar a partir daquele momento, tendo consciência que lhe restava poucos minutos até que Al tomasse conhecimento do que ela disse ao FBI, e consequentemente passar a odiá-la mais do que qualquer coisa no mundo. Ela sabia que tinha ferrado com a vida do homem que jurava amar mais que tudo, porém não era o que parecia naquele momento. Por um instante duvidou de seu amor por Fredo de fato, se perguntando se o motivo pelo qual ela confessou tais informações com o informante, já que ele mesmo havia dito que veio a mando do FBI, e ela mesmo em meio às alucinações que a merda da LSD a causava, não diria uma coisa assim a menos que quisesse.

Lônia não sabia se quis falar, não sabia o porquê disso, nem se realmente aconteceu. Se é que aconteceu algo. Da mesma forma em que ela pode ter lhe entregado, também poderiam ter saído somente murmuros baixos de sua boca suja.

X

— Você sabe de quem estou falando, Apollonia. Onde está o Al?

— Ele... Eu não...

— Você sabe, eu sei. Não há como ele viajar e você não ter consciência de onde. O que vocês têm, aliás? Uma relação muito mal assumida ou apenas sexo, drogas e rock in roll?

— O Al não ouve rock in roll. É... Death metal.

Naquele instante, ela sentiu como se tivesse aplicado em si mesma meia dose de morfina. Sentiu seu coração relaxar em um nível tão extremo que pensou ter morrido por 1 segundo, e sua respiração em depressão profunda a nível de simplesmente aceitar seu destino final, mesmo que o contexto e as consequências disso tudo seriam boas.

Entretanto, como sempre ela não deixou simplesmente agradecer ao bom Deus pelo milagre, como qualquer outra pessoa que se considera normal no mudo em que vive. Então, logo o questionamento parou de ser "como?" e sim "quem?".

Os Solitários de 1997Onde histórias criam vida. Descubra agora