51 - Uma descoberta

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Meu reflexo no espelho refletia um semblante vazio, contrastando com a escuridão das vestimentas que vestia. 

A gravata apertada, a camisa, o colete e o terno negros formavam uma expressão externa da solidão que crescia dentro de mim. 

A perda de meu mentor, minha tia e a distância crescente de Isabelly após os eventos recentes deixavam um peso indescritível em meu coração.

Após o resgate, cada um de nós se viu envolvido em seus próprios demônios. Eu até entendo minha princesa precisar de um tempo, mas a saudade é tanta. 

Allan, especialmente, trouxe consigo o fardo do vício, trancafiado em meu quarto de hóspedes desde que chegamos. Não havia forças em mim para arrancá-lo da escuridão, especialmente após retirá-lo do necrotério onde se agarrava ao pai sem conseguir se despedir.

Tio Donato, em um esforço de proteção, comprou a versão da autópsia que declarava a morte de tio Steve como um afogamento na piscina, e a de tia Jane como um ato de desespero, incapaz de suportar a vida sem seu marido.

Meu pai, assumindo seu papel de advogado da família, tratou de todas as questões legais. Com nenhum herdeiro além de Allan, toda a herança foi destinada a ele. 

Minha mãe, com sua força silenciosa, organizou a cerimônia que seria realizada em nosso complexo, onde meus tios repousariam lado a lado, líderes que foram pilares fundamentais dos Ristrettos. Eles seriam para sempre uma representação de poder e união. 

E todos concordávamos que infelizmente com suas mortes os Ristrettos nunca mais seriam os mesmos. 

Antes de enfrentar a cerimônia, respirei profundamente e peguei meu celular para enviar mais uma mensagem a Isabelly, a trigésima tentativa desde que ela se afastou. 

"Amor, por favor, só me diz que está bem."

Desta vez, o silêncio da ausência de resposta pesou mais do que nunca, eu só queria saber se ela também sente minha falta... Dois dias sem nenhuma notícia. 

Respirei fundo e saí do meu quarto em passos lentos, percorrendo o curto corredor até chegar ao quarto em que hospedei Allan. Sem bater, abri a porta, que rangeu ao revelar um ambiente impregnado pelo odor acre da cocaína. 

Uma luz fraca do abajur no criado-mudo ao lado da imponente cama king size destacava meu primo, cuja atenção estava totalmente absorvida pelo ritual de penitência dele. Ele deslizava um cartão sobre a linha branca que cobria um livro de capa escura, destacando o pó branco. 

Seus olhos dilatados, manchados de vermelho após noites incontáveis sem sono, vagueavam sem rumo pelo quarto, alheios à minha presença. 

A verdade, que optei por encarar, é que mesmo que Allan tomasse consciência da minha presença, era improvável que isso fizesse alguma diferença. Meu primo compreendia que eu não o responsabilizaria por seus atos, especialmente agora, quando ele havia perdido toda a sua família. 

Observo sua presença deplorável inclinando-se sobre o livro, os olhos fixos na fina linha de cocaína diante dele, meu primo começou a enrolar cuidadosamente uma nota de dinheiro, preparando-se para aspirar a substância.

Com mãos trêmulas, ele se aproximou da carreira branca, segurando a nota firmemente. Um breve momento de hesitação foi seguido por um movimento rápido de inalação. 

Todo o pó branco desapareceu.

— Podemos ir agora? — pergunto suavemente, controlando meu tom enquanto dou alguns passos até a cama, me aproximando dele. 

Allan levanta o olhar, revelando uma angústia que eu não testemunhava desde sua infância, quando assistiu aquelas fitas de vídeo. Ele coça o nariz, já vermelho e quase machucado, e percebo seus lábios ressecados apertados de forma fina e estranha.

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