Capítulo 87

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Cristal

Me pergunto se deveria começar a evitar Dragomir, pois estamos ficando muito próximos e talvez seja ruim, não quero ficar dependente dele, gosto de sua aproximação, de seu abraço, mas não dá para me acostumar a ficar o tempo todo atrás dele.

Além de outras vontades estranham que começaram a aparecer também, eu nunca senti que precisava abraçar, beijar, ficar ao lado, querer dormir abraçada, mas esses dias tem sido foda.

Me pergunto se é assim que pessoas normais se sentem, tipo, como uma pessoa consegue viver com essa vontade imensa de estar ao lado de alguém? Deus me livre de criar dependência nesse tipo de coisa.

Sinto mãos quentes envolverem minha cintura enquanto preparo meu pão com queijo —como está seu tia, Abelhinha? Dormiu bem?— sentir a respiração quente dele em meu pescoço me faz querer sentir coisas estranhas.

—se acredita que tinha começado bem até você aparecer?— falo com um tom irônico? Mas quando sinto as mãos do ruivo apertarem um pouco mais forte minha cintura estremeço.

Dragomir —sei que eu faço seus dias melhores, admita?—  só viro meu rosto, pois nunca vou admitir nada, nunca.

—Drago, você não tem nada para fazer no seu tempo vago não?— eu fico curiosa, queria saber como tem tanto dinheiro, pois conseguiu de alguma forma.

Dragomir —eu mato monstros no inferno para conseguir recompensas, faço a mesma coisa no purgatório, por que? Quer vir comigo, me acompanhar, minha carrapatinha?— de onde diabos ele tirou esse apelido dos infernos.

—eu preciso espairecer um pouco e não seria ruim passar no inferno, quero conhecer um pouco melhor meus avós e tios— falo enquanto noto ele parar de me abraçar e ir em direção ao fogão, vai cozinhar o café da manhã provavelmente.

Dragomir —vai ser bom ter sua companheira até lá, mas me preocupo, estou sendo caçado pelos deuses e se eles me encontrarem e você acabar se envolvendo no meio da confusão? Por favor, prometa que vai se afastar e pensar só em você nesse momento— pelo olhar sério realmente se preocupa comigo.

—pare de se preocupar comigo! Eu consigo me proteger— digo ficando irritada.

Dragomir —eu sei que você consegue, mas não contra Deuses, pode ir descansar e comer seu pão, irei preparar algo mais saboroso para nós dois. Por favor, passar no castelo da sua mãe, acho que precisa conversar com ela sabe, sobre seu tempo de vida, não vou aceitar um não, ela precisa saber, pois se você morrer não conseguirei lidar com o fato de ela ficar de procurando por aí, sem saber que..... Você entendeu. Acho que seu pai não precisa saber agora, mas isso já é contigo— ele está mesmo me obrigando a contar?

—Drago, eu não posso cont...

Dragomir —se você não contar eu conto, entendeu? Eu entendo que não quer ver o olhar desestabilizado de sua mãe, mas  é melhor passar por tudo perto dela, pois vai conseguir aceitar aos poucos, vai ser melhor tanto para você quando para sua mãe— desde quando ele se importa.

—eu entendi Dragomir, eu vou arrumar meu jeito de contar, mas caso eu não volte, saiba que é por não querer olhar para você— digo irritada, apenas fecho meus olhos e desapareço dali.

Dragomir

Apenas respiro fundo enquanto pego as coisas para preparar o café da manhã para mim, ela não vai voltar hoje, e do jeito que é orgulhosa talvez até tente ignorar minha existência por um tempo.

Ela é nova então tenho que pensar que será imatura também, talvez ela nem tenha tempo de criar maturidade.... Pensar nisso não me faz bem, todos a minha volta sempre acabam morrendo.

Cristal, é minha Abelhinha, é a centelha que ilumina meus dias, a única que desafia minha escuridão com sua própria luz. Ela é forte, teimosa, e tão cheia de vida. E saber que essa vida tem uma contagem regressiva... isso me corrói por dentro. Eu fiz o que fiz hoje porque a perspectiva de perdê-la sem que ela tenha resolvido suas pendências me assombra. Mas ao forçá-la a confrontar sua mãe sobre sua morte daqui a quatro anos, fui longe demais. Sei disso agora.

A ideia de que ela só tem mais quatro anos de vida me destrói. Quatro anos para amar, proteger e, eventualmente, deixar ir. E o pensamento de que o tempo que passamos juntos possa ser manchado por mágoas como a de hoje me atormenta. Eu queria que cada momento fosse perfeito, mas a realidade é imperfeita, e minha tentativa de forçá-la a encarar uma verdade dolorosa só aumentou a distância entre nós.

—Ela vai voltar. Ela tem que voltar— tento me convencer, mas a insegurança é uma sombra constante. E se ela não perdoar meu jeito duro? E se eu a perder antes mesmo que o ceifeiro venha para levá-la?

Eu levanto, incapaz de ficar parado, e começo a andar pela cabana. Tento imaginar o que ela está sentindo agora, mas é difícil. Cristal é complexa, com suas camadas de bravura, vulnerabilidade e uma teimosia feroz que a faz lutar contra a injustiça de sua situação. É isso que me faz gostar tanto dela, essa força inquebrável, essa recusa em se render ao destino.

Se ao menos eu pudesse encontrar um equilíbrio, uma maneira de apoiá-la sem impor meu próprio medo e insegurança sobre ela. Sei que ela precisa de espaço, de tempo para processar tudo isso do seu jeito. E talvez, quando o tempo dela estiver acabando, ela possa olhar para trás e ver que meus esforços, por mais desajeitados que tenham sido, eram sempre para o bem dela.

Enquanto espero, tento pensar em como posso me redimir, em como posso reparar a confiança que quebrei hoje. Porque não importa o quão poderosa ou independente Cristal seja, ela precisa de mim tanto quanto eu preciso dela. E eu preciso aprender a estar ao lado dela, não como um guardião sufocante, mas como um parceiro que respeita sua força e seu desejo de enfrentar seus demônios à sua maneira.

Entre Mundos (Deuses Elementais)Onde histórias criam vida. Descubra agora