Capítulo 43: Reverência.

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Luna desapareceu em um piscar de olhos, usando uma esfera, enquanto o corpo de Aurora desabava no chão. Os guerreiros vermelhos ao redor começaram a desaparecer também, enquanto o caos da cidade se tornava um silêncio assustador. Sky ficou paralisado com o corpo grudado no meu, olhando para onde Aurora estava caída, como se esperasse vê-la se levantando.

Uma lágrima escorreu pela minha bochecha quando aquelas rachaduras no chão começaram a se fechar, quando Abigail finalmente surgiu ali, tarde demais para ajudar. Não podia culpá-la, mas a dor que eu estava sentindo era quase de tirar o fôlego, porque sentia Sky se quebrando contra mim, como se ele também estivesse morrendo.

Ele tentou ficar de pé, tropeçando no chão enquanto se apressava na direção dela. Levei a mão aos lábios quando ele caiu de joelhos ao lado de Aurora, erguendo as mãos como se tivesse a intenção de toca-lá, mas sem saber como. Tentei me levantar e ir até ele, mas minhas formas pareciam ter simplesmente evaporado.

Levei a mão aos lábios quando Heron caminhou pelo meio dos guerreiros. A espada caindo no chão quando ele se aproximou de Sky e se abaixou atrás dele. Sky pareceu não se importar com a presença dele ali, porque seu corpo se inclinou sobre o de Aurora, até ele encostar a testa na dela. Heron segurou a mão dela caída sobre o chão, enquanto passava o braço ao redor dos ombros de Sky.

Fechei meus olhos com força quando não consegui controlar as lágrimas que vieram, quando senti a presença de Mia atrás de mim. Sky finalmente começou a chorar, sem se importar também quando Herou puxou o corpo dele para perto e o abraçou. Olhei para o céu quando escutei o rugido de Falkor, vendo-o se levantar de novo e voar até nos, finalmente conseguindo se juntar com a sua cavaleira.

Heron deu um leve beijo na testa de Aurora, antes de se afastar quando Falkor pousou ali. O enorme corpo assustando vários guerreiros ao redor. Ele soltou um som profundo com a garganta, antes de abaixar a cabeça e tocar em Aurora, mexendo-a como se tentasse fazê-la acordar. Desviei os olhos, escorando meu corpo no de Mia quando ela me abraçou por trás.

Tinha visto todos os guerreiros do Chalé Azul se ajoelharem quando David partiu. Da mesma forma, todos começaram a se ajoelhar, olhando na direção de Aurora. Algumas gotas de chuva começaram a cair do céu, enquanto Falkor rugia para cima, como se fosse ele a causar aquilo. Quando o primeiro trovão atravessou o céu, o guardião de Aurora abriu as asas, focando sua atenção em Sky, antes de se abaixar em uma longa reverência.

[...]

—Ainda sentindo dor? —A bruxa questionou, me olhando com seriedade.

Balancei a cabeça negativamente, encarando as cortinas sem graça da enfermaria do Chalé Azul. Meu braço estava todo enfaixado, sem eu conseguir mexê-lo. Como eu tinha quebrado vários ossos, ia levar mais tempo para se curar, mesmo bebendo uma poção de cura. Ainda estava sentindo dor, mas em um lugar que a bruxa não poderia ajudar.

—Fique deitada e não faça esforço. Tenho que ver os outros. —Ela se afastou, fechando a cortina que separava a área da minha cama das outras. A enfermaria estava cheia. Eu podia escutar os gemidos de dor e os lamentos pelos feridos e mortos.

Fechei meus olhos, tentando apagar a imagem de Aurora morta. De Luna desaparecendo. A imagem de Sky completamente quebrado no chão. Um nó se formou na minha garganta quando abri os olhos ao escutar o som da cortina. Minha garganta ardeu, enquanto um soluço cortava meus lábios quando encarei meu tio.

—Ayla me avisou. Eu vim correndo. —Sussurrou, caminhando até o lado da cama. Me joguei contra o peito dele, deixando aquelas lágrimas violentas virem, quando finalmente me permiti desabar. Meu corpo tremeu por inteiro enquanto meu tio me abraçava com força, tentando me confortar de alguma forma. —Vai ficar tudo bem, querida. Vai ficar tudo bem.

Mas não iria. Enquanto não colocássemos um fim naquilo, nada ficaria bem. Tínhamos perdido Aurora. Tínhamos perdido tantos guerreiros naquele ataque que seria preciso mais do que alguns dias para conseguirmos recuperar os cacos do que havia sobrado. E se conseguíssemos nos recuperar, ainda havia mais batalhas pela frente.

Fui liberada da enfermaria horas depois, mesmo que meu braço ainda estivesse todo enfaixado e meu corpo todo roxo. As marcas das raizes ainda estavam na minha garganta, assim como na raiva que eu guardava. Meu tio me acompanhou até a Casa do Ar quando anoiteceu, onde todos aqueles próximos a Aurora se reuniam.

Tochas estavam espalhadas por todo gramado ao redor da casa, assim como milhares de fadas da luz formavam um círculo naquele lugar. Elas eram seres representantes do ar, então não me surpreendia vê-las reunidas ali. Uma grande fogueira estava sendo preparada, onde o corpo de Aurora estava depositado sobre uma cama de flores e folhas.

Na hora certa, soltei a mão do meu tio e me juntei aos elementais. Fiquei ao lado de Margo, sentindo a mão dela procurar a minha e a segurar com força, como se precisasse de apoio. Naomi, Ravi, Gael e Abigail estavam formando uma linha do nosso lado, de frente para o corpo de Aurora.

Alguém estava falando algumas palavras. Não tinha certeza de quem era, porque meus olhos estavam fixos em Sky. Não tinha conseguido parar de olhá-lo desde que o vi ali, do outro lado daquela pilha de lenhas perfeitamente montada, ao lado de Heron. Os olhos dele estavam fixos na mãe. Nenhum vestígio de raiva ou tristeza. Havia apenas um vazio interminável naqueles olhos nublados.

Uma tocha foi entregue nas mãos de Sky, que caminhou lentamente até Aurora e depositou o fogo nas lenhas. Ele ficou lá, observando as chamas tomarem conta de tudo, até cobrirem o corpo de Aurora. Olhei ao redor quando milhares de luzes começaram a subir para o céu, vendo as fadas da luz com as mãos erguidas, deixando o poder fluir.

Sky foi o único que permaneceu de pé quando todos se ajoelharam mais uma vez. Os olhos dele refletiram as chamas, enquanto algo atravessava seu rosto. Algo que eu não conseguia descrever o que era. Meus lábios tremeram quando desviei os olhos para o chão, engolindo a vontade de me levantar e ir até ele.

Tinha o procurado assim que sai da enfermaria. O Acampamento Vertical parecia estar inteiro de luto. Ninguém sequer se preocupou em olhar na minha direção quando atravessei aquelas pontes até a cabana de Sky. Mas quando bati na porta, ele não apareceu. Devo ter ficado lá por algumas boas horas, esperando para ver se ele mudaria de ideia, até me dar conta de que ele realmente não queria me ver e preferia ficar sozinho.

Acho que também não demorei muito para juntar todos os pontos daqueles últimos acontecimentos. O medo de Sky quando Aurora saiu do Chalé Azul para a batalha. A insistência dele para que ela não fosse antes. Tudo subitamente fazendo sentido na minha cabeça, quando eu percebi que ele sabia. Sky sempre soube que aquilo aconteceria, porque foi exatamente aquilo que a bruxa mostrou a ele. Parecia um fardo insuportável de segurar.


Continua...

As Crônicas de Scott: A Guerra / Vol. 2 Onde histórias criam vida. Descubra agora