Dia 6

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Ananda

Quando entrei em casa, a primeira coisa que senti foi o aroma doce e familiar de alho sendo refogado. Meus passos hesitaram por um instante. Não era comum Richard cozinhar, e muito menos preparar algo especial. Isso era coisa minha. Ele sempre estava correndo de treino ou ocupado demais com seus compromissos. Meu peito apertou, mas segui em frente, me forçando a atravessar o corredor até a cozinha.

E lá estava ele. Richard, vestido de avental, cortando legumes de uma maneira quase desajeitada, mas com uma expressão concentrada que eu não via há muito tempo. A mesa estava posta com o cuidado de alguém que se importava: velas, uma garrafa de vinho, pratos bem arrumados. Um cenário que me fez engolir em seco.

  – Oi — minha voz saiu mais suave do que eu queria.

Ele ergueu os olhos, um sorriso que parecia genuíno surgindo em seu rosto.

  – Oi, amor. Cheguei mais cedo e pensei em preparar algo pra gente. — Ele limpou as mãos no avental e se aproximou, tentando me dar um beijo na bochecha, mas eu dei um pequeno passo para trás, mantendo distância.

Não era tão simples. Não depois de tudo. Mesmo assim, algo em mim tremeu. Ele estava sendo carinhoso, quase o Richard de antigamente. E eu sabia que, de certa forma, era exatamente isso que ele queria que eu sentisse.

Eu olhei em volta, tentando evitar seus olhos enquanto ele voltava para a comida, falando casualmente sobre o dia dele. Mas minha mente estava em outro lugar. Aos poucos, enquanto ele mexia na panela e eu me sentava à mesa, os flashbacks começaram a aparecer, fragmentos de momentos do nosso passado que pareciam longínquos, quase irreais.

Me lembrei do nosso primeiro aniversário de casamento. Ele tinha me levado a um restaurante escondido, um lugar só nosso, sem holofotes, sem fama. Ele segurou minha mão a noite inteira, os olhos fixos nos meus como se eu fosse a única pessoa no mundo. Naquela época, eu acreditava que nada poderia nos separar.

E então, vieram as lembranças do nascimento da Thaís. Ele estava lá, ao meu lado, com lágrimas nos olhos quando ouviu o primeiro choro dela. Richard a segurou nos braços, e eu nunca me senti tão conectada a ele quanto naquele momento. Era o homem que eu amava, o pai da minha filha.

Mas, como uma onda de realidade, as lembranças boas foram se dissipando, dando lugar à dor. A traição emocional, a ausência constante, as promessas quebradas que vinham uma após a outra. Me lembrei das vezes que esperei por ele nas noites em que ele preferiu estar com amigos ou em festas. As vezes em que ele não deu a mínima para meus sentimentos, porque seu mundo girava em torno dele mesmo.

Meu coração ficou apertado enquanto eu o observava, sorridente, colocando o prato na mesa, como se nada tivesse acontecido. Como se o passado fosse irrelevante. Mas para mim, ele era um lembrete constante de tudo que eu tinha perdido.

  – Aqui está — ele disse, me servindo com cuidado, como fazia no começo, quando ainda era aquele homem que eu admirava.

Eu olhei para o prato, para o vinho que ele tinha servido, mas a comida parecia distante. O peso das lembranças, dos erros, era mais forte do que o cheiro tentador da refeição.

Richard sentou-se em frente a mim, seus olhos esperançosos.

  – Eu sei que as coisas estão difíceis agora, Nanda. Mas a gente pode voltar a ser como antes, sabe? Eu prometo que vou mudar. Só me dá mais uma chance. — A voz dele era suave, quase suplicante.

Senti uma dor no peito, um nó na garganta. Eu queria acreditar. Parte de mim, aquela parte que ainda amava quem ele foi, queria desesperadamente que isso fosse verdade. Mas a outra parte, a mais racional, sabia que esse ciclo de promessas vazias era o que me trouxe até aqui.

Como Perder A Sua Mulher Em 80 dias | Richard RíosOnde histórias criam vida. Descubra agora