Como Perder A Sua Mulher Em 80 dias | Richard Ríos

Dia 47

Richard

Eu entrei em casa depois de um dia cansativo, mas hoje algo estava diferente. A casa estava em silêncio, como se algo tivesse mudado no ar. Eu sabia que a Nanda estava tentando manter as coisas em harmonia, pelo menos na superfície, mas não era mais como antes. O clima estava tenso, como se ambos estivessem esperando o momento certo para enfrentar os elefantes na sala.

Quando entrei na cozinha, vi a Nanda preparando o jantar. Ela parecia tranquila, mas algo na sua postura me dizia que ela estava segurando algo. Quando nossos olhares se cruzaram, ela tentou sorrir, mas era um sorriso forçado, daqueles que não chegam aos olhos. Não foi o sorriso que eu queria ver, mas não tinha como deixar de perceber.

  – Oi — falei, tentando soar o mais natural possível, embora a tensão fosse palpável.

Ela me olhou por um segundo, e então, sem dizer nada, continuou a mexer na panela. Eu podia sentir a luta interna dela. Não era fácil para mim, e eu sabia que não estava sendo fácil para ela também. Ficamos em silêncio por mais alguns momentos, mas algo parecia me puxar para uma conversa mais profunda. Eu sabia que precisávamos falar, discutir o que estava acontecendo. Era a única forma de entender onde estávamos e, talvez, onde poderíamos ir a partir daqui.

  – Nanda — comecei, hesitando. Ela me olhou, mas continuou mexendo na comida, aparentemente em um esforço para não demonstrar o que estava se passando. Eu sabia que ela tentava esconder seus sentimentos, e eu... eu estava começando a sentir o peso dessa barreira entre nós. — Acho que a gente precisa conversar sobre o que está acontecendo.

Ela fez uma pausa, ainda de costas para mim. Era como se ela estivesse calculando suas palavras. Então, ela se virou lentamente, olhando-me com um olhar que misturava tristeza e preocupação.

  – Eu sei, Richard... Eu sei. Mas o que você quer que eu fale? O que realmente pode ser dito? — ela disse, com uma calmaria que não correspondia ao turbilhão que eu sabia que estava por dentro dela.

Eu respirei fundo. Era difícil lidar com esse tipo de conversa, porque, por mais que tentássemos, o que estávamos realmente fazendo era varrer tudo para debaixo do tapete, esperando que desaparecesse. Mas não ia desaparecer. Eu sabia disso.

  – Eu não sei o que eu quero. Eu só sei que você está distante, e que parece que estamos sempre caminhando em círculos, tentando acertar as coisas, mas... sempre tropeçando. — minha voz saiu mais baixa do que eu queria, como se estivesse vulnerável demais para admitir. — E eu sinto que, por mais que eu tente, você ainda não me deixa entrar completamente.

Ela suspirou e se afastou da bancada, pegando um prato da prateleira. Seus olhos se desviararam dos meus, e eu soube o que ela estava pensando. Eu não precisava ser um gênio para entender que, para Nanda, o maior obstáculo entre nós não éramos nós dois, mas o peso da responsabilidade de ser mãe, de ter Thaís para cuidar. O casamento, o divórcio, tudo isso era secundário perto da missão de proteger a filha dela. Mas, ao mesmo tempo, isso a afastava de mim.

  – Eu só... eu não quero que Thaís sofra, Richard. Eu não sei mais o que é certo. — ela falou, com a voz baixa, e eu vi a fragilidade dela escancarada ali. — Eu fico pensando no que é melhor para ela, e... não consigo imaginar uma vida de separação, com ela dividindo os tempos, as escolhas. E, ao mesmo tempo, não sei se estou fazendo a coisa certa ao continuar com tudo isso... com você.

Eu sabia o que ela queria dizer. A pressão de ter que fazer a coisa certa, de tentar manter a vida da filha estável, era mais forte do que qualquer outra coisa. E eu estava, de alguma forma, preso nisso também. Eu queria ajudar, queria ser o homem que ela precisava, o pai que Thaís merecia, mas às vezes parecia que a vida dela já estava cheia demais para eu caber de novo.