SESSENTA

39 2 0
                                    

Ela me olhou de cima a baixo com um sorrisinho forçado, como se tentasse decifrar o motivo da minha aproximação.

— Oi... tudo bem? — respondeu, apertando minha mão com desdém, o olhar se desviando rapidamente para o Giorgian, como se eu fosse uma mera formalidade.

A irmã do Gabriel logo se afastou, percebendo o clima estranho, mas a tal Vitória manteve-se firme, claramente testando limites.

— Oi, Giorgian — ela continuou, ignorando completamente a minha presença e focando nele com um olhar excessivamente simpático.

Ele, para minha surpresa, apenas acenou de forma polida, sem esboçar muita reação.

— Vitória, né? — interrompi, mantendo o tom educado, porém firme. — Quanto tempo, não é mesmo?

Ela enfim voltou a me encarar, os olhos estreitando levemente.

— Pois é... muito tempo mesmo. Achei que não fosse te ver mais.

— A vida tem dessas, né? Sempre dá um jeito de nos lembrar de certas... fases.

Giorgian limpou a garganta, desconfortável, mas não interferiu. Marília, sentada à mesa, nos observava de rabo de olho, atenta ao desenrolar da cena.

— Então... como você está? — Vitória insistiu, agora claramente se dirigindo a ele.

— Estou bem. A gente tá bem, não é, amor? — respondi por ele, forçando um sorriso doce e repousando a mão de propósito sobre a minha barriga, já um pouco evidente.

Vitória pareceu finalmente notar. Seus olhos desceram lentamente para a curva sutil abaixo do meu vestido. O choque, embora disfarçado, foi perceptível no brilho momentâneo em seus olhos.

— Ah... eu... parabéns, eu acho. — Ela tentou se recompor, mas a voz saiu vacilante.

— Obrigada. Estamos muito felizes, não é, amor? — reforcei, e dessa vez Giorgian assentiu, colocando a mão sobre a minha, um gesto simples, porém suficiente para reafirmar nossa união.

Ela pigarreou, claramente desconfortável.

— Bom, eu não quero atrapalhar... Foi só uma coincidência mesmo. Fico feliz por vocês.

— Claro! Coincidências acontecem — retruquei, o tom ainda polido, mas com aquela pitada de "não volte a tentar".

Vitória deu um passo para trás, acenou rapidamente e se afastou, voltando para a irmã do Gabriel, visivelmente menos confiante.

Assim que ela sumiu de vista, soltei um suspiro pesado e me deixei cair de volta na cadeira.

— Foi só isso? — Marília sussurrou, arqueando a sobrancelha.

— Foi — respondi, aliviada. — E espero que ela tenha entendido o recado porque eu tô cansada.

Giorgian, até então calado, segurou minha mão por baixo da mesa, entrelaçando nossos dedos. O toque quente e reconfortante me fez relaxar de vez. O jantar seguiu tranquilo, entre risadas e conversas amenas, como se o pequeno confronto anterior nunca tivesse acontecido.

Mais tarde fomos para casa porque senti meu pé inchando. O silêncio aconchegante da nossa sala parecia ainda mais acolhedor depois da noite cheia. Eu estava descalça, sentada no sofá com as pernas esticadas, enquanto Giorgian preparava um chá para mim na cozinha.

Ele voltou logo em seguida, entregando a xícara e sentando-se ao meu lado, o braço envolvendo meus ombros de forma protetora.

— Está tudo bem? — ele perguntou, a voz suave, mas atenta.

Assenti, soprando o chá antes de responder.

— Tá, sim. Eu só... — Suspirei, buscando as palavras. — Acho que tô começando a ficar nervosa com o parto.

Ele franziu a testa, preocupado.

— Nervosa? Por quê?

Deixei a xícara de lado e segurei a própria barriga, sentindo o leve movimento do bebê.

— Eu sei que parece bobeira, mas... é tudo tão novo pra mim. E se eu não conseguir? Se der algo errado? Tô com medo.

Giorgian se aproximou mais, virando-se de frente para mim. Ele segurou meu rosto com delicadeza, os polegares acariciando minhas bochechas.

— Ei... você é a pessoa mais forte que eu conheço. Você vai conseguir. E eu vou estar lá, o tempo todo.

Meus olhos marejaram, mas de emoção.

— Eu sei... Só... não quero falhar.

— Você não vai falhar — ele afirmou com convicção. — Nosso bebê tem a melhor mãe do mundo.

Eu ri baixinho, fungando enquanto ele me puxava para um abraço apertado. Ficamos assim por um tempo, apenas sentindo a presença um do outro, o calor, a segurança.

— Promete que vai estar comigo o tempo todo? — murmurei, ainda abraçada a ele.

— Eu prometo. — Ele beijou o topo da minha cabeça. — Sempre.

E, pela primeira vez em semanas, adormeci em paz, sentindo que tudo ficaria bem.

Sirena | De ArrascaetaOnde histórias criam vida. Descubra agora