36 - Jazzy

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Jazzy

Cansado de tentar fugir ás lembranças, deixei-me ser imerso ás memórias antigas que tanto pesavam nos meus ombros. Este peso, que já ficara desvanecido, antes da situação com Kelley, mas a semelhança abriu novamente aquela ferida.

— Flashback On —

Perguntava inúmeras vezes pelo o seu nome, ás pessoas que estavam perto. Ninguém sabia dela, e isso começara a atravessar por baixo da minha pele. O nervosismo ficava como uma pedra, no fundo da minha garganta. O eco era alto, dos batimentos rápidos do meu coração.

- Viste a Jazzy? - Perguntei a Ryan que engolia o líquido que já tinha na boca.

- Não, bro— Mas a Caitlin deve saber. Elas estavam juntas há pouco.

Ryan mostrava-se confuso á minha pergunta, também á minha agitação.
Afastei-me dele, não ouvindo a última parte do que disse, e procurei por Caitlin, no meio daquela multidão.

Agarrei o seu braço, por impulso, questionando pela minha irmã.

- Autch. - Largou-se da minha mão. - Disse que ia lá fora, apanhar ar.

- Há quanto tempo foi isso, Caitlin? - O meu tom saía ríspido.

O meu olhar curioso, e o maxilar meio cerrado, foi o suficiente para ela perceber que havia desespero em mim. Preocupação, medo...

- N—Não sei, Jason.

- Foda-se. - Resmunguei com um olhar já escuro. - Tu nunca sabes de nada, quando deverias saber.

  Fui bruto com ela, empurrando-a do meu caminho.
Sai do bar/discoteca, descendo um pouco a rua até ao parque velho, perto da esquina. Ninguém, não vi uma alma.
  Pronto para virar as costas e virar aquele bairro do avesso, ouvi um pequeno barulho no parque. Perto do escorrega. Estava escuro e a minha visão não era tão nítida quanto desejava, pela falta de luminosidade naquele sítio.

Aproximei-me, e após uma dúzia de passos, esbarrei-me com o pior cenário. Jazzy estava deitada naquele chão emborrachado do parque, imóvel, de cara molhada, mas com um olhar completamente vazio. Levantei o olhar do chão, encontrando o responsável, a fechar a breguilha das calças, com o maior sorriso satisfeito nos lábios.

- Não viste nada. - O rapaz falou para mim. - Podes aproveitar até.

  O choque foi tanto que demorou segundos para que tivesse alguma reação.
Saí das sombras, e pude sentir o medo a tomar conta de todo o seu nervo do corpo, ao reconhecer a minha cara.

- McCann—

Engoliu as próprias palavras, pois o meu punho colidiu com a sua face. Uma e outra vez. Sentia uma descarga de adrenalina imensa, a cada murro que conectava com a sua cara, o seu peito, até a sua virilha. Toda minha visão gradualmente, tornava-se vermelha, brilhante, colocando-me ainda numa euforia maior, por acabar a sua vida pelas minhas mãos.

- J—Jason— Ele já nem se mexe. P—Pára... - Jazzy falava baixo.

As suas palavras não foram ouvidas pelos meus ouvidos, pois a imagem que tinha do seu corpo no chão, de roupas rasgadas, era mais alta que tudo o resto.
  Senti umas mãos delicadas nos meus braços, abrando a minha velocidade com quem o magoava.

- Pára por favor.. - Pediu, fraca.

Ao largar o seu colarinho, o rapaz apenas caiu no chão, já inconsciente e coberto de sangue.
  Por segundos, o que pareceu uma eternidade, pela imensidade de culpa que sentia no meu peito, olhei para si. Observei bem o seu estado.. O seu cabelo desmanchado, a sua maquilhagem esborratada, e toda a diversão e brilho que antes carregava no seu olhar, apagado. Não havia qualquer emoção naquele olhar... Talvez, dormência?

Sem coragem para a encarar mais ou até responder-lhe, levantei-me, peguei no telemóvel e avisei o Ryan.
Ao empurrar o meu telemóvel, de volta ao bolso, o meu olhar raspou no rapaz inconsciente no chão.

- Filho da puta. - Falei entre dentes assim que conectei o meu pé com a sua cara.

- Pára, por favor— Chega.. - Chorava baixo.

Coloquei as mãos na cabeça e encarei o céu.

Não acreditava que aquilo tinha acabado de acontecer— Não acreditava que tinha permitido uma merda daquelas acontecer! A minha mente, o meu coração, o meu peito, o meu sangue, insultava-me aos gritos. Havia um peso em mim, nunca antes sentido em mim. Uma culpa. Caralho! Sentia-me culpado. Naquele momento, a minha única vontade era, fechar os olhos e quebrar em pedaços. Encontrar-me com um inimigo e deixá-lo tirar a minha vida do meu corpo. Queimar a minha alma...

- Jas— - Ryan calou-se ao observar aquele cenário.

Virei-me na direção deles, que acabavam de chegar. Ignorei os olhares arregalados, e até aguados da parte de Vanessa e Caitlin, encarando-os de maxilar cerrado, com um olhar de uma profundidade de escuridão, imensa.

- Caitlin e Vanessa, levem-na para casa. - Iniciei. - Arrumem as coisas delas e ponham-na num avião, o mais rápido possível. Nem que tenham de alugar um caralho de um jato privado.

Caitlin rapidamente baixou ligeiramente a cabeça.

- O quê?

Ouvi os seus soluços já altos, e podia jurar que todo o meu interior sangrava.
Evitei olhar para ela, pois eu realmente não conseguia... Deixava-me sem chão.

Elas hesitaram, o que me enervou ainda mais.

- Já, foda-se! - Falei alto, bruto e autoritário.

Virei-lhe as costas, e mesmo com as mãos preenchida de rastos de sangue, acendi um cigarro entre os lábios. Estava todo cortado, por dentro, com os soluços e gritos altos de Jazzy.

- Caralho ouve-me! Olha para mim, Jason! Tu não tens culpa! Estás a ouvir? - Perguntava com o seu choro alto.

Eu apenas ignorava tudo. Não respondia a nada. Tudo o que ela poderia dizer, não iria mudar o que sentia naquele momento. Aquela dor, aquela escuridão desconhecida, aquela frieza. Aquele sentimento de culpa. Era uma merda de irmão, de amigo, de tudo!

Abaixei-me levemente, e com um olhar vazio, um sentimento pesado, fiz um corte profundo no seu pescoço, tendo a certeza que não voltaria a acordar. Nunca mais.
Se estava a pensar nas consequências? Não.

Eles estavam paralisados enquanto observaram a capa preta que, agora, vestia.

- Livrem-se de evidências. Todas elas. Até a merda desse chão. - A minha voz grossa acordou-os.

Não cruzei o olhar com nenhum deles, e saí daquele parque.
Entrei dentro do carro e acelerei dali. Pelas estradas, fazia curvas perigosas a uma velocidade forte, estas que podiam tirar a minha vida num segundo. Era isso que pretendia.

Senti o meu telemóvel a vibrar mas ignorei-o.

Eu não fazia falta. Como é que deixei a minha irmã ser violada? Como? És uma merda Jason!

- Fuck! - Bati naquele volante com força.

— Flashback OFF —

O meus batimentos estavam exorbitantes assim que soltei o fumo levemente, e abri os olhos. Parecia que conseguia sentir o sabor de cada emoção sentida naquela noite, de anos atrás.

Decidi tomar um dos comprimidos, receitados, para forçar-me a dormir, sem hipótese de pensar em mais nada. Ou seja, era uma boa oportunidade de qualquer pessoa que tivesse vingança por fazer, matar-me naquele momento, pois eu provavelmente não acordaria.
  Olhava-me ao espelho, enquanto debatia em tomar ou não o comprimido. Foi difícil habituar-me a dormir sem a ajuda daquele comprimido azul. Não debati mais, e engoli aquele medicamento enquanto ainda me encarava nos olhos através daquele espelho.

Secret Agent // jelena.Onde histórias criam vida. Descubra agora