A única coisa que realmente me abate é a lembrança dos tempos
de liberdade. Do rabo batendo nas costas para espantar os insetos,
das patas sujas de lama trotando compassadamente na relva
úmida e, principalmente, das inúmeras vacas no cio, loucas para
romper a cerca a cada momento, da porteira aberta,
ou mesmo fechada, pois, eu já aprendera a tirar a tranca com
meus chifres, e, à noite, passar para o pasto das virgens e me
refestelar de prazer e orgasmo.
Hoje só me cabe um pequeno cercado coberto, uma medalha
de tricampeão e a maldita hora em que me enchem de alfafa
vitaminada para depois levar-me a laço para a tortura das
cordas me apertando o corpo e o pescoço, o rabo preso no teto
e o mil vezes maldito humano, totalmente vestido de branco,
que me enfia um enorme cassete nas profundezas do meu ventre,
dá uma descarga elétrica que me faz estrebuchar e bambear as
quatro pernas, enquanto outro maldito bípede de branco colhe
meu sêmen em pequenos frascos que são rapidamente congelados
e pressurizados.
Quando arrefecido e zonzo tento levantar-me e não consigo
lembro-me da Mimosa, aquela malhada de ancas largas que
me deu tanto prazer outrora, e que hoje de mim só tem o
sêmen gelado inserido por mãos estranhas com uma grande
seringa de vidro.
Quantos tourinhos, de alguma forma meus filhos devem estar
por aí pulando pelos pastos, mesmo que cercados, sem sequer
imaginar que seu fim será o matadouro:
"Carne de Novilho Precoce",
ou pior, o maldito laboratório dos choques nas entranhas!
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Aliás Voadoras
Short StoryFazendo um breve preâmbulo; esta crônica é um dos capítulos de um livro que escrevo há mais de uma década intitulado "Aliás Voadoras". Aleá era o nome que os moradores de certo lugar do oriente, que foi dominado pelos portugueses, davam às fêmeas...