Relatos de fatos verídicos normalmente são interpretados
como inventados, aumentados pouco a pouco; vã ilusão,
a verdade espelha a experiência de vida, a vivência,
por mais inverossímil que seja.
Há anos atrás tive a oportunidade de desenvolver em
Salvador – BA, como "marqueteiro" que sempre fui,
o espaço, a propaganda e a venda de uma palestra de
pós-graduação para engenheiros.
Desenvolvi o esquema comercial, vendi, fiz contatos,
consegui hotéis, os descontos, os pacotes turísticos...
Ocupei uma sala envidraçada, dando vista para a baía,
do instituto de engenharia local e, passei boa parte do
meu tempo trabalhando em frente à Ilha de Itaparica,
mas, mal tinha tempo para apreciar o visual.
Um amigo meu de São Paulo havia me convidado a estrear
uma suíte da sua nova pousada na Ilha então não me preocupei
com olhar de longe a beleza do local por saber que
logo logo a conheceria de perto.
O palestrante, professor emérito da USP chegou!
Tudo arranjado, tudo pronto, um sucesso, elogios,
abraços e tapinhas nas costas...
Agora com o dinheiro do trabalho bem feito no bolso sonhava
passar quinze dias na Ilha de Itaparica, com suíte gratuita e tudo.
Durante o primeiro dia de palestra, que fiz questão de assistir,
apesar de não ser versado no assunto técnico de que tratava,
meus olhos começaram a arder, inchar e doer.
CONJUNTIVITE!
Não aguento mais. Saio da palestra (nem sequer precisava estar lá)
e procuro alguém que possa me ajudar.
Desço a "ladeira da preguiça" – que ladeira!
Entro em uma pharmácia cheia de vidrinhos coloridos,
linda de doer, e como doía – conjuntivite!
Sou atendido por um simpático senhor nos seus oitenta anos
de vidrinhos coloridos, que olha para mim e diz:
- Conjuntivite, já sei paulista, você está com conjuntivite.
Eu interrompo: - Como o senhor sabe que sou paulista?
- Com este branco, fácil de saber (vidrinhos coloridos agora
ofuscantes e a vista lacrimejante).
Tenho um colírio aqui que vai te curar rapidinho.
Agradeço, pago, saio da pharmácia injuriado com meus
planos de conhecer Itaparica rolando a ladeira abaixo
sem preguiça.
No dia seguinte, já estou em São Paulo no ônibus da Cometa.
Milagre! Chego aqui curado e puto da vida. Lá se foi meu
sonho de conhecer a Ilha por pura precipitação, covardia,
e, ao mesmo tempo, respeito pelo amigo que me convidara
para estrear sua pousada, pois, esta doença é contagiosa e
não seria de bom tom hospedar-me lá com conjuntivite.
Guardo o colírio como algo precioso, milagroso, e convicto
de que se tivesse acreditado piamente no senhor da
pharmácia eu teria "curtido" Itaparica – A Ilha do Sonho!
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Aliás Voadoras
Short StoryFazendo um breve preâmbulo; esta crônica é um dos capítulos de um livro que escrevo há mais de uma década intitulado "Aliás Voadoras". Aleá era o nome que os moradores de certo lugar do oriente, que foi dominado pelos portugueses, davam às fêmeas...