7.Ivy

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O verão de 1984 tinha sido uma porta de entrada para o clímax de sua vida jovial. Toda aquela gente saltando na piscina e recebendo amigos que consideravam que tivessem idade o suficiente para encher a cara para depois não serem responsabilizados pelas próprias ações, fotografias para todos os lados, sorrisos e restos de senso sendo distribuídos nos pátios abertos com balões coloridos; garotos com topetes altos refletindo o brilho do excesso de gel; garotas desfilando com biquínis, reparando nos garotos que as olhavam ao longe, debatendo com os amigos quem estaria mais bem agradável nos trajes de verão.

Seis jovens meninas se sentaram à beira da piscina, os olhares postos no reflexo do sol na piscina, enquanto a água tomava metade da perna (que a essa altura causava rugas nos pés), e vez ou outra se tomavam sussurrando ao indicar um dos garotos que estava do outro lado da piscina, vestindo regata de malha e calção florido, em verde e amarelo, num contraste quente. Uma das garotas sussurrou algo no ouvido de uma ruiva que estava ao seu lado. Ambas riram, e não durou muito para as risadas darem lugar a um rosto saliente ao encarar um jovem de cabelos claros que atravessava a piscina a nado. Um dos braços tomando a frente, enquanto o outro o impulsionava um metro adiante.

- Os meus filhos adorariam que o pai nadasse dessa forma... - disse a ruiva, olhando a amiga ao lado arrumando uma mecha atrás da orelha.

- Brenda... até onde sei seus filhos são inexistentes. Ou estou errada? - a amiga, que antes havia sussurrado a Brenda demonstrando interesse pelo nadador de cabelos claros, a encarou de um jeito promíscuo, ainda alternando o olhar de um para o outro.

- Por enquanto, por enquanto. O atleta aí não sabe ainda... mas teremos. - Brenda apontou para o rapaz que já chegava do outro lado da piscina, segurando na borda e se preparando para retornar.

A amiga que tinha os cabelos loiros, estirados até a cintura, sentiu algumas ondas se formarem com o movimento do rapaz na água chegarem à altura de suas canelas. Um grupo de outros rapazes atravessava o corredor entre a piscina e o grupo de jovens que tomava algum tipo de bebida. Um deles ri e a situação ganhara um tom crítico quando ele empurrou a amiga da ruiva na piscina. Eram sete deles e todos riram, formando uma onda de risinhos por toda parte. Antes que o rapaz tivesse percebido a ruiva estava frente a frente com ele, gritando: "O que você pensa que está fazendo? Ela não sabe nadar! Babaca!". Ela sabia que poderia muito bem ter tomado uma atitude muito mais agressiva em relação a amiga, que agora estava em algum lugar lá embaixo da piscina. Se debatendo para se salvar.

A garota sentia a água entrando pela boca e as narinas pareciam fechadas para qualquer tipo de ar. Ela sentiu seus pés se aproximarem do fundo da piscina, os braços debatendo em busca de socorro, tentando alcançar a superfície, emergir do fundo e conseguir respirar um pouco. Nada. Parecia tudo em vão, tolo e desnecessário. Ela sentiu os olhos embaçando e a força dando lugar a fraqueza. "Verão de 1984. O verão em que eu morri.". Em algum momento isso passou pela cabeça dela lá embaixo. Todos aqueles jovens que se divertiam, alguns com bebidas nas mãos, outros beijando quem os interessasse, outros apenas flertando com risadinhas nada discretas, estavam fora de seu alcance visual. Tudo que ela via era o reflexo do sol na água acima dela. Antes que tudo terminasse, antes mesmo que seus músculos desistissem de desenvolver mais um pouco de força, um braço a envolveu pela cintura, os dedos apertando a costela firmemente. Em algum momento ela sentiu apenas o fundo da piscina ficando para trás e o reflexo do sol se aproximar.

Lá embaixo os sons abafados haviam se transformado em uma caixa de silêncio, onde ela permaneceu em contato com sua força e sua fraqueza, nada mais. Mas agora, na superfície, os sons tinham vindo todos de uma vez. Desde as vozes assustadas de algumas meninas, os passos de jovens curiosos se aproximando da borda da piscina para assistir ao que ocorria. A jovem conseguiu em fim recuperar o ar, que parecia deslizar suavemente pelas narinas agora, chegar aos pulmões e ser liberado em seguida. Tinha sido uma sensação de libertação. Diante de todas as vozes circulando ao redor da piscina, a única que conseguiu ouvir com clareza a perguntou:

- Você está bem? - ela se esforçou para encarar nos olhos do nadador de cabelos claros. Ela afirmou que estava bem com um movimento de cabeça. Os pingos do seu rosto caindo suavemente no rosto dela. - Como você se chama?

Ela não tinha entendido o porque de ele ter feito a segunda pergunta. Mas lembrou-se que uma vez o tio tinha relatado um fato no hospital de San Antony sobre uma vítima de afogamento que perdera as noções de memória. Talvez o nadador entendesse sobre isso.

- Ivy... - a jovem respondeu, sentindo o braço do rapaz em torno dela. - Ivy Rames.

O rapaz deu um sorriso ao ver que ela estava bem.

- Bem, Ivy... eu sou Carlton Fedrich... - então começou a se movimentar em direção a borda da piscina com ela. - Melhor segurar firme. Vamos.


Ela ainda lembrava do rosto de Carlton rente ao dela, os olhos claros combinando com os cabelos ainda tomavam parte de seus sonhos. Tudo que ele havia feito por ela. Tê-la salvado, socado o rosto de Alex Feltz, o rapaz que a empurrara, e passado o resto do verão, todos os dias, em sua companhia. Foi logo depois que terminou o verão que Carlton foi preso. Edd Rames abominava o namoro de sua filha com Carlton, um rapaz de classe média que vivia na parte mais baixa da cidade. Edd tentara de tudo para separar Carlton da filha. Tudo em vão.

Era uma noite de outono, quando o telefone na casa dos Rames toca. A polícia local de Senthfill dá o comunicado a Trace Rames. Edd tinha sido assassinado no cruzamento norte da avenida Suntown com a Bemish. Nada tinha sido levado, o que não acusaria roubo. Todos os holofotes da família e de vizinhos que presenciavam a relação de Ivy se voltaram contra Carlton Fedrich.

Ivy Rames demorou algum tempo para aceitar o que todos diziam. Carlton não seria capaz. Carlton seria capaz? O jovem que salvara sua vida estava sendo levado por policiais da porta de casa. Ivy o fitou com os olhos cheios de lágrimas, mas não contava com o desespero de Carlton ao vê-la:

- IVY! IVY! Eu não fiz isso! Acredite em mim, meu amor! Eu não fiz isso... não seria capaz! Por favor acredite em mim! Ivy! Ivy! - seus gritos foram abafados quando um dos policiais o enfiou na viatura e fechou a porta.

Tudo que Ivy fez foi chorar por dias. Logo após o enterro de Edd Rames, Trace apresentou a filha a um jovem rapaz filho de um advogado da cidade. Ele tinha cabelos negro-cinzentos, a expressão de que convenceria Ivy a superar a morte do pai. O jovem se chamava Alfred Buster, e foi com ele que Ivy casou-se alguns meses depois. Alfred a transformara na mulher que ela é hoje. Ivy nunca mais soube de Carlton. Ele, provavelmente, saíra da cadeia, porém nunca recebeu informação alguma sobre ele. Ela estava convicta que a parte baixa da cidade tinha sido um empecilho na vida de sua família, e desde a morte de seu pai ela nunca mais caminhou pelas ruas depois das moradias do bairro de Ebristhy. Porém agora sabia que um passado amargo estava voltando. A filha Emily estava se envolvendo com um jovem da parte baixa da cidade. Ela jurou, com todas as suas forças, que isso não aconteceria. A filha não poderia passar pela mesma situação que ela passara. Emily tinha saído há quase uma hora e Ivy sabia que a filha tinha ido atrás do jovem. Alfred ficaria sabendo de tudo quando retornasse do trabalho, por ora Ivy quis relaxar. Então tomou o carro e preferiu fazer uma visita a um velho amigo no DUNIGAN

O Amor É CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora