42.Emily

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Emily tirou o excesso de manteiga do frango, passando-o na massa ao lado. Ela não tinha como saber se Jack apreciava mais seco ou besuntado. De qualquer forma era uma surpresa. Se admirou quando o viu com apenas alguns ossículos no canto do prato.

- Estava delicioso. - ele recostou-se na cadeira. Levantou. Retirou os pratos, limpou a mesa e em seguida lavou a louça.

Emily estava adorando os dias que passava ao lado de Jack Field, amava as noites que passava embalada em seus braços, sentir a respiração dele sobre seus cabelos quando estava deitado sobre seu peito. Os lençóis amassados, tomados de certa luxúria. Ela tinha a felicidade nas mãos e não queria desperdiçá-la por muito tempo trancafiada ali.

Já tinha se passado quase uma semana após ter deixado a casa. Os dias que passou em Nervana's tinham sido maravilhosos e por enquanto isentos de qualquer perigo. Achou que não teria problema em passear um pouco, respirar um ar livre...

- Sinto-me entediada. - sua voz era áspera e cansada, tomada de um ardor matinal. - Conheço um lugar que podemos ir.

- Acho que não devemos nos arriscar. - Jack tinha certa propriedade no que falava. - Não sabemos o que vamos encontrar lá fora.

- Eu sei. - ela o puxou para um beijo simplório. - E queria saber se você também quer saber!

Jack não precisou pensar muito para atender ao desejo de Emily. Esperou que ela tivesse razão, que lá fora o  perigo não estivesse rondando ou planando acima do hotel. Preferiu crê que nada tinha a temer quando estavam juntos.

- Eu confio em você.

Emily  riu com as palavras dele e o beijou mais uma vez. Este era renovador.

* * *

O penhasco de Rewbutt tinha pouco mais de cem metros e dava para um rio que corria a leste. Jack olhou para baixo, e embora Emily já estivesse ali uma vez quando criança, custou a chegar à beira do abismo. As pedras eram calcário e sedimentadas, junto pendiam algumas flores silvestres que cresciam aos montes com a ajuda de uma vegetação rasteira que se infiltrava entre uma rocha e outra, como uma espécie de ninho de plantas. Tal processo se estendia por metros à esquerda e à direita.

Estavam a sós. Um olhou para o outro e nada tinham de apavorados. Na verdade seus olhares sorriam enquanto eles gargalhavam. Emily retirou o lenço da cabeça e os óculos escuros, os colocando sobre uma pedra quadrangular ali perto. O mesmo fez Jack com os disfarces, um chapéu coco preto e os óculos. Ao saírem do Nervana's tiveram o extremo cuidado de analisar cada pedaço de rua e o rosto de cada uma das pessoas. Nada era suspeito. Por um momento Emily achou estar enlouquecendo, tomando atitudes precipitadas e fora do senso de realidade. Eram seis dias longe de casa e tudo estava bem. Ela preferiu que ficasse assim.

- A coragem se reserva nos corações valentes. - Jack se aproximou dela e a deu a mão.

Juntos foram para a beira do penhasco. Lá embaixo o rio corria e sussurrava. As águas batiam nas pedras que se desprendiam da parede do abismo.

- E os corações valentes nas pessoas fortes. - ela completou o pensamento.

Ambos deram as mãos e se atiraram. Emily vestia um belo maiô com pedrinhas incrustadas numa faixa de abdome. Jack, um simples calção de banho lhe fazia ficar à vontade. Os corpos, unidos num aperto de mão, caíam e caíam. Emily soltou um gritinho até a metade do percurso. A sensação de uma mão de gelo entrando em sua barriga, atravessada pelo umbigo e apertando seu estômago com toda a força dos dedos frios, era atormentadora. Em poucos segundos a mão gélida lhe subiu ao peito e então à garganta. Seus olhos só abriram em três quartos de percurso, quando sentiu o impacto da água no corpo. Seus pés tinham deslizado suavemente pelo fundo do rio, carregando todo o resto do corpo com eles. Abriu novamente os olhos na escuridão que abraçava o rio. Avistou o rosto de Jack a sua frente, o sorriso de ponta a ponta das orelhas. Bolhas de ar escapavam por entre os dentes.

O Amor É CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora