20.Emily

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O relógio tiquetaqueava na parede do quarto e Emily se acomodou na cama. Tinha pensado em várias coisas durante a noite anterior: Será que a mãe realmente abriria mão de Emily frequentar as aulas na universidade? E Alfred? Será que seu pai sabia do plano dela e tinha compactuado com tal? Emily sustentava um pensamento cético em relação a isso. E realmente haveria um casamento. Por horas ela pensou que a mãe estava apenas a afastando de tudo e todos, principalmente de Jack. Essa era sua ideia inicial, um simples susto, causando em Emily um impacto emocional tão grande que a filha desistiria de caminhar com os próprios pés, continuando a estar na imensa sombra projetada das asas de Ivy Buster. Contudo havia uma parte nela que sabia da capacidade da mãe de agir fora das margens, e que provavelmente, aquele noivado estaria arranjado e William Lambert era seu futuro marido.

Era um fator sórdido, beirava a total invasão de suas escolhas, e Emily não aceitava tal decisão. Ela caminhou pelo pequeno corredor que dava à sala de tevê, montada paralela à sala de estar. Seus pés descalços sentindo o chão frio. Seu cabelo desgrenhado assumiu um coque no alto da cabeça quando ela o viu pelo espelho a sua frente. Ficou deveras estranho, mas ela não se importou. Ela se dirigiu à cozinha, mas não viu Will. Será que ele ainda estava no quarto, dormindo?

Isso era algo que Emily tinha gostado no caráter de Will Lambert. Ele poderia assumir o posto de noivo (por mais que nunca tivessem se visto) e ter dormido no mesmo quarto e na mesma cama, com Emily dividindo os mesmos lençóis, mas preferiu se reservar em outro cômodo, respeitando a fragilidade dela com o impacto de tudo.

"Tudo bem. Você pode se recolher." dissera Will após a segunda tentativa do jantar. "Seu quarto é aos fundos do corredor."

Emily tinha se esquivado um pouco e resistido, mas acabou tendo que se encaminhar para lá, notando que ele deixara os pratos na pia e caminhou até a sala, sumindo depois do outro corredor. Ela ficara um minuto ali parada, então entrou no quarto. Não tinha chaves, então ela encostou a porta. Demorou quase uma hora para dormir, então caiu no sono, sem esperar por ele. E nessa manhã quando despertou o outro lado da cama estava vazio, assim como estava quando ela dormira. Ele não tinha se aproveitado da situação.

E agora ela retornava da cozinha e olhava através do corredor do outro lado da sala. Nada de Will. Então ela ouviu um barulho surdo, pancadas abafadas por algo que ela não soube dizer. Vinha distante, então não seria dentro de casa. Ela se arriscou a olhar pela janela, quando o viu. Ele estava a frente da casa onde ficavam algumas flores. O barulho vinha dali, da enxada que William segurava nas mãos, elevando-a um pouco e capinando uma parte do gramado. Ele vestia uma calça de moletom preto, apenas. Emily viu o peito nu dele, suar em resultado do trabalho. Ele se abaixou, limpando o suor da testa, em seguida pôs uma muda dentro do buraco formado, preenchendo-o de terra. Jogou um pouco de água no local com o regador e começou a cavar outro buraco. O processo se repetiu, duas, três vezes...

Emily saiu, agora estava na varanda, observando o trabalho de William. Por um momento ela quis ser educada e dizer "Bom-dia!", mas as palavras não saíram. Ela não digerira tudo ainda, e não seria o comportamento aprazível de Will que a faria ceder. Então, ao notar a presença dela ali, de pé, no primeiro degrau da varanda, os braços cruzados no peito e um olhar concentrado, William sorriu:

- Ah, você acordou... - ele parou de fazer o que estava fazendo, levando a enxada ao ombro. - Está linda sabia?

Ela não suportou. Como ele poderia ter tal cinismo? Ele tinha planejado tudo junto com sua mãe e mesmo assim a tratava como se nada tivesse acontecido, como se na verdade tivessem ido a um acampamento longe da cidade! E entre todas as coisas que tinha a dizer a única que saiu de sua boca numa rápida atitude fora:

O Amor É CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora