A Caixa da Perdição era uma penitenciária ao sul da Carolina do Norte. E tal nome apenas quem já passara por lá que saberia explicar do por quê. As sombrias noites que se elevavam todos os dias, reforçando o perigo nos pátios e celas, o frio que deslizava pelos corredores, se infiltrando através das barras e impregnando os músculos dos detentos, espantando o sono e estabilizando os olhos até o amanhecer.
Ao redor do grande pátio da Caixa da Perdição a cerca elétrica passava boa parte do dia ligada. Havia um horário em que desligavam a chave por um momento, cerca de cinco minutos, para reparos e testes. Nenhum dos detentos sabia que parte do dia isso ocorria, tampouco se a história realmente era verídica.
As alas divididas entre os corredores era bem afastadas umas das outras. Cada uma delas com uma numeração, escrita em letras enormes na parede que iniciava cada uma da repartições. A de crimes hediondos era a 14, e possuía o maior número de policiais em posto na entrada, reforçando segurança, assim como no interior, bem treinados contra qualquer tipo de contratempo. A ala 13 ficava ao norte, e era a segunda maior de toda Caixa, deixando de liderar apenas por causa da 7, de roubos e furtos. Era lá que dois detentos, frente a frente, encaravam um ao outro. Um deles se chamava Carlton Fedrich.
A ala 13 ocupava pouco mais de duzentos detentos, quase todos por assassinatos. Carlton encarou um rapaz alto, com músculos sobressaltados e de rosto inchado pela briga que tivera dois dias antes com outro detento.
- Soube que sai amanhã, Fedrich... - disse Rock, o detento musculoso. - Eu ainda terei que pagar um bom número de dias nessa Caixa da perdição até que ganhe minha liberdade.
- Eu estou aliviado. - Carlton estava ansioso, suas mãos trêmulas. - Se eu consegui, Rock, não tenho dúvidas que poderei ver você lá fora qualquer dia.
- Talvez para jogar xadrez na praça, velhote? - disse Rock, ironizando. - Porque você terá que me esperar bastante! Terá cabeça branca quando me encontrar.
Carlton riu e cumprimentou o companheiro de cela com um movimento de mãos que criaram durante o tempo que passaram na Caixa. Rock tinha razão, Carlton sabia disso. Ele estava ali por assassinato triplo. Invadiu a casa de uma família durante a noite e ceifou a vida de um casal e do filho de treze anos. Usara uma espingarda no ato e fora pego dois dias depois quando as câmeras de vigilância da casa o entregaram. "O sujeito tinha ameaçado o meu filho na saída da escola por causa do filho deles. Heitor chegou em casa com um olho roxo e aos prantos. Aquele sujeito tinha segurado meu filho na porta da escola para que o filho dele descontasse o soco em decorrência da briga que tiveram no intervalo das aulas. Perdi a cabeça." contou Rock, enquanto fazia companhia a Carlton no pátio. "É como digo, meu caro Fedrich, podem enterrar uma bala no meu peito, mas não se atrevam a apontá-la para meu filho!"
No dia seguinte Carlton estava liberto. Saindo pela porta da ala 13, deixava Rock para trás. O último gesto que viu o companheiro de cela fazer fora uma mão em formato de soco dentro da palma com a outra, o rosto franzido dele dizendo: "Rock esmaga!". Carlton fez o mesmo gesto e disse: "Eu amigo de Rock". Então virou-se, deixando uma amizade trancada nos fundos sombrios da Caixa Da Perdição. Junto a isso os mais de quinze anos que enfrentara, injustamente, por algo que não fez.
* * *
Oito anos depois de deixar a Caixa da Perdição, Carlton Fedrich tinha deixado a vida nos eixos. Montara o próprio negócio, uma empresa de tintas ao norte da cidade de nome TOMORROW'S COLOR e havia reorganizado tudo que perdera durante os quinze anos naquele lugar. Por um momento pensou em procurar Ivy Buster, tentar reverter tudo e se explicar, mas era inútil. Havia se passado tanto tempo e era hora de caminhar para uma nova vida, atingir novos objetivos e procurar se manter limpo de qualquer acusação, longe do que destruiu sua vida.
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O Amor É Cinza
RomanceJack Field é um jovem de vinte anos que é reservado à família e não pensa duas vezes quando quer ajudá-la em qualquer coisa. O emprego de artista de rua não está rendendo, porém a persistência de que um dia tudo será melhor o torna focado em seus ob...