54.Jack

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"Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, pois tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me protegem." (Salmos 23:4)

- Você está grávida, querida. - Mandy tinha certeza do que dizia. - Confie em mim. Sei quando tenho razão!

Jack escutou a sua mãe falando aquilo para Emily atentamente. Grávida? Emily... tinha um filho dele ali, dentro dela?

Seu coração pulou do peito. Emily tivera enjoos durante todo o dia e Mandy sabia reconhecer os sintomas. Não era a primeira vez que ela fazia aquilo. Há um tempo, em Soumerboro, sonhou que sua colega de quarto iria ter uma bela menininha. No dia seguinte os sintomas que a garota teve, como o tempo só veio a certeza. Dera luz a Alice.

- Isso é maravilhoso, meu amor. - disse ele para Emily. - Um filho...

- Um filho! - Emily ainda não acreditava.

Jack sabia que precisavam realmente ter a comprovação, indo a uma consulta médica e provando. Mas confiava cegamente na mãe, sabia que não havia erro. Sua felicidade pulava em seu peito drasticamente. Seus olhos seguiram os dela e pela primeira vez ele se sentiu seguro em dizê-la:

- Eu te amo. - um beijo fortaleceu o momento. - Sempre vou te amar, sempre, sempre... não se esqueça disso!

- Eu também amo você, Jack. Sempre. - ela retribuiu o beijo, ainda mais feliz.

* * *

Era a confirmação. Emily Buster estava realmente grávida.

O médico tinha falado que tinha apenas algumas semanas.

- Então... - Jack a encarou carinhosamente. - Acha que foi no rio após pularmos o penhasco ou no piano...

- Jack! - ela o repreendeu, rindo. - Isso não importa! Realmente não importa agora! O que importa é que já estou amando o que há dentro de mim...

Ela tocou a barriga e Jack pôde fazer o mesmo. Beijou e cochichou:

- Não se preocupe, meu amor... estarei sempre com você! Vamos ser muito felizes juntos! - deu vários beijos na barriga dela, sempre com muito cuidado.

No início da tarde visitaram Simon em seu restaurante. Desta vez ele vinha sozinho, sem a ajuda do neto. Apoiava-se de cadeira em cadeira, percorrendo o corredor da cozinha às mesas. A grande notícia foi melodia para os seus ouvidos.

- Que ótimo, que ótimo! Sempre soube que vocês dois iriam ser felizes! - Simon beijou ambos no rosto, num gesto de gentileza e amizade. - Não esqueçam... não há maior gesto no mundo do que o simples fato de amar.

- Obrigado Simon. - agradeceram.

Eles sabiam que Jeyne e Lea estavam em viagem, portanto tiveram que se segurar para contar a novidade pessoalmente. Por enquanto tratariam de convencer Simon a passar algumas horas de seu dia na companhia deles para comemorarem.

* * *

O ano era 1997 e Jack corria pela alameda entre Sanstella e Maribald, tomando cuidado com o coelho que levava consigo. Tinha recebido o animal de Helena Persbolm, uma jovem empresária de Nova Jersey que abrira um negócio na cidade.

Cuidara do animal por muito tempo, dividindo as atenções com a irmã Clarice, que também tinha muito apreço pelo lindo coelhinho. Dois anos depois Jack entrara em contato com a primeira experiência de morte. Chorara a perda do animal. Nunca pensou que sentisse tanto.

Enterrara o animal num campo gramado que ficava a duas quadras dali. O espaço vazio que ficara em seu peito nunca fora preenchido por qualquer outra forma de amor. Mas agora parecia que um amor maior o invadia. Bem maior.

* * *

Estava se preparando novamente para ir ao viaduto quando Emily pediu que o acompanhasse.

- Tem certeza? Você precisa de descanso...

- Claro que sim, mas estou apenas no começo da gravidez... não tem problema! - explicou Emily.

- Ela tem razão, querido... - concordou Mandy. - Tudo bem, Emily. Sinta-se à vontade para nos acompanhar.

- Sim, sim. Vamos, Emily, acho que será uma boa experiência! - Michael levou Emily para fora e em seguida todos estavam no carro para mais um dia.

Jack já estava na posição rotineira. As flores na mão e o corpo novamente em cinza. A mãe tinha lucrado um pouco mais com os tecidos e comprado novamente tintas para ele. Sua plataforma sob seus pés era um ponto alto que se podia ver ainda mais aberto o sorriso das pessoas. Tudo era contagiante, tudo era resplandecente.

Nunca se imaginara pai, tampouco que uma alegria inexplicável o invadisse de maneira arrasadora. Ele sentia, sobretudo, mais leve, um tanto quanto renovado. Olhou para o céu e viu entre as nuvens uma esperança. E agradeceu. Emily tinha se dirigido rapidamente à plataforma onde Clarice estava. Ela tinha se sentindo um pouco cansada das sapatilhas e Emily resolveu ajudá-la. Jack viu uma multidão se dispersar. Se perguntou o que estaria acontecendo, quando viu luzes surgirem no viaduto. Nunca tinha visto qualquer veículo passar por ali, até então. Este estava em alta velocidade, ainda por cima.

Parou a frente da plataforma de Jack e o motorista desceu. Todas as pessoas estavam assustadas, reclamando, mas bastou que ele retirasse uma pistola da cintura que todos se afastaram. Jack assustou-se quando se deparou com nada mais nada menos que Alfred Buster a sua frente. O cano dirigido a ele.

Alfred começou a ri e ficar furioso, alternando entre uma expressão e outra.

- PAI! - Emily vinha pela direita, aos tropeções. - Pai, não, não... abaixa isso! Não...

- Emily... - Alfred notava a filha, surpreso. - Se afaste! Você se provou ser uma bela traidora, ingrata! E esse daqui é o responsável por todo a sua queda na família!

Jack mantinha as mãos no alto, o olhar indo de Emily para Alfred.

- Pai, pense bem... vamos conversar! Abaixe essa arma e...

- NÃO TEM DIÁLOGO! VOCÊ NÃO ENTENDEU? - sua voz assustava ainda mais quem estava por perto, porém ele não abaixava a pistola. Mantinha sempre na direção de Jack sobre a plataforma. - EU NÃO TENHO HERDEIROS, ALÉM DE VOCÊ! E VOCÊ FAZ O QUÊ? JOGA TUDO FORA! TUDO!

- Eu sou culpada disso tudo, não Jack! Então se tiver de fazer algo então que seja comigo!

Alfred levou a arma para a direção de Emily, sem pestanejar.

- Tem certeza disso? - perguntou.

Jack saiu da plataforma. Tudo que passava por sua cabeça era Emily e o filho. Saltou no braço de Alfred, tentando tirar a pistola de suas mãos.

- Jack! - gritou Emily.

Jack insistiu em retirar a arma das mãos de Alfred Buster que lutava insistentemente.

Gritos apavorados enchiam o ambiente. Michael corria ofegante em direção a cena, Mandy, desesperada, fazia o mesmo e Clarice tremia, chorando.

- Larga ele! Larga! - Emily agora estava sobre o pai, agarrada aos seus ombros, lutando para tirá-lo de Jack.

- SAI DAQUI! - gritou perturbadoramente Alfred, caindo sobre o carro, derrubando Emily e jogando o braço para frente, fazendo Jack cambalear para trás.

Michael se aproximava, correndo.

- Deixe meu filho em paz! - gritaram Jack e Michael juntos.

Alfred encarou Emily, segurando a barriga e compreendeu. A fúria o tomou.

- Adeus, Jack! - e atirou.

Michael saltou sobre o homem, mas a bala já percorria o caminho que Alfred a colocou. Jack sentiu um puxão violento na cabeça, a dor trespassando seu crânio e ele perdendo os sentidos. Ele sentia uma voz longínqua, se afastando cada vez mais...

Michael teve forças o suficiente para erguer Alfred do chão e empurrá-lo com tudo por cima do beiral do viaduto. O homem caiu por metros a fio e antes de atingir o chão lá em baixo, um dos veículos o jogou trinta metros a frente. Era o fim de Alfred Buster.

Jack Field...

Ele também esperou pelo fim... Parecia bem próximo em sua agonia.

O Amor É CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora