Aquilo a que chamamos de orgulho

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Uma jovem criada dentro dos limites da Cidade dos Cervos saiu em busca de uma chave, sem a qual não conseguiria abrir o banco que guardava toda a riqueza de seu bando. Sabendo que tal objeto estava perdido na Cidade dos Leões, a corça seguiu uma jornada impensável, munida com sua parca coragem e com a juba escalpelada do antigo Prefeito dos leões. Após conviver com as feras por dias, finalmente descobriu o paradeiro da chave: estava com o Prefeito atual, uma criatura que exalava ferocidade. Parecia não haver como recuperar o tesouro dos cervos, e a jovem estava condenada a ver seu bando definhar de fome até a morte... porém algo inimaginável aconteceu: o próprio Prefeito Tukufu lhe entregou a chave do Banco dos Cervos, confundindo todos os presentes.

– S-senhor, o que isso significa? – Peyisai questionou o ato de Tukufu. Tanto ele quanto os demais estavam perplexos, lançando olhares maliciosos para a corça disfarçada de leão.

– Sabe que chave é essa, Abbo? – o Prefeito ignorou seu Organizador de Eventos, ainda com o olhar fixo no leão do interior.

Abbo controlou seu nervosismo e empolgação, respondendo o mais calmamente possível.

– É a chave do Banco dos... Leões, senhor?

– E você sabe o que os leões guardam em seu banco?

– Eu... Imagino que seja ouro, senhor...

Tukufu se sentou novamente, recostando-se em sua cadeira. Por algum motivo isso diminuiu a densidade do ar na sala, permitindo que Azizi respirasse novamente.

– Talvez você não conheça alguns dos presentes – o Prefeito estendeu sua pata, apresentando o leão à sua direita, que vestia um terno marrom e tinha a juba toda jogada para trás. – Este é Salmini, o Economista. Ele controla os registros financeiros da cidade e também calcula o valor das taxas de impostos e do nosso produto interno bruto – depois sua pata se voltou para um segundo leão desconhecido, que tinha a juba mais bagunçada que Abbo já vira: um chumaço de feno acinzentado que escorria sobre seus ombros. – Aquele ali é o Macaria, tem-se mostrado um excelente Sociólogo e auxilia no levantamento de dados populacionais – por fim, apontou para o último leão, um velho magro e esquelético, de aparência pálida e doentia. Abbo ficou surpresa por não ter reparado nele assim que entrou na sala. – Esse senhor dispensa qualquer elogio que eu possa fazer. Sua Fábrica de Sabão tem sido de grande utilidade para meu governo, de todas as maneiras possíveis. Não é mesmo, Kitunzi?

Dos três leões apresentados, nenhum tinha um ar mais sisudo que o último. Era como se sua carcaça sugasse o calor do ambiente, e suas patas magras lembravam grandes aranhas fantasmagóricas. Abbo apertava a chave prateada com força entre seus cascos, desejando poder fugir daquele ambiente opressor.

– Pois bem – Tukufu prosseguiu, pouco interessado se o jovem leão decorara os nomes de seus Secretários ou não. – Estamos com um pequeno problema de relações públicas aqui. Desde que instaurei a Lei do Bando Forte minha imagem parece ter sido abalada, embora meus peritos tenham me prometido o contrário – os Secretários pareceram incomodados com o que o leão-mor disse.

– Nossa situação econômica está mais estável do que nunca, senhor Prefeito. – o Economista se justificou.

– Sim – em seguida foi apoiado pelo Sociólogo –, e as pesquisas dizem que seu governo possui cem por cento de aprovação popular.

– Nada disso importa! – Tukufu rugiu, fazendo todos se segurarem nas cadeiras. – Eu vi o desgosto nos olhos deles, ontem à noite. Eles têm casa, comida e uma razão para viver: trabalhar! O que mais eles querem? Mais comida? Mais casas? Mais trabalho?

O Banco dos LeõesOnde histórias criam vida. Descubra agora