Uma noite com o Prefeito

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            – Que sufoco... algumas leoas quase arrancaram minha juba por causa de uma liquidação. Nunca mais piso em uma loja infantil perto do inverno chegar. E aí? Ainda não descobriu o que aconteceu com Imara?

Asani entrou no quarto de Abbo, trazendo consigo uma muda de roupas infantis. A corça e seu ratinho companheiro amparavam o leãozinho, que estava enrolado em uma toalha branca após um banho de areia.

– Ele não quer falar – a jovem cochichou para o leão, abrindo as sacolas que ele trouxe. – Pelo que entendi, o Sargento não conseguiu escapar.

– Bem feito – o leão encardido tirou uma espiga de milho da sacola, sem pretensão de dividir com os demais. – Ao menos você se livrou daquele capitão idiota.

– A questão não é essa – Abbo retrucou. Depois foi até Ghofiri, colocando-o de pé e vestindo as novas roupas no pequenino. O flhote era pesado, e Asani não estava interessado em ajudar. Em seguida ela voltou para terminar sua conversa com o leão encardido, falando em voz baixa: – A questão é que um leão pode ter morrido por minha causa. Por causa do meu plano maluco.

– Um plano maluco que deu certo – o outro apontou. De fato, o leãozinho trouxe a chave falsa, e feita de prata. A jovem ergueu os cascos, conferindo novamente o pequeno cilindro de metal com galhadas de cervo. Embora só tivesse segurado a chave do Banco dos Leões por alguns instantes, ela sabia que não havia diferença entre as duas... não ser, claro, nos dentes da chave falsa, que não abririam porta alguma.

– Espero que não tenham deixado rastros – Abbo suspirou, voltando a se sentar com o leãozinho que não desgrudava de uma misteriosa boina vermelha. – Isso... era do Imara, Ghofiri?

– Era do meu pai – o filhote respondeu.

– Seu pai era Sargento? –Asani se surpreendeu, exclamando com a boca cheia de milho.

– Meu pai era o melhor leão do mundo. Bom... Um dos melhores.

– Não quero abstrair desse instante de afinidade incomum – Ruffles saltou para cima da cama –, mas em uma fração de hora o Prefeito chegará, talvez antes.

– Meu padrinho vai mesmo passar a noite aqui? – o leão encardido chicoteou o ar com a cauda. A corça já tinha preparado tudo como o leão-mor solicitara, e estava ansiosa por sua vinda. A próxima etapa de seu plano era substituir a chave falsa pela verdadeira, e esperar que Tukufu não notasse a troca. Para tanto esquematizara a melhor solução possível, contando com a ajuda de seus amigos peludos. – Não gosto nada dessa parte do seu plano, corça.

Nosso plano. Você também está envolvido.

– Tecnicamente essa fera boçal não colaborou em patavinas.

– A ideia do café foi minha, não se esqueça. E pantufinha é você!

– Nós só vamos revisar o discurso dele – Abbo impediu a discussão. – Em três dias abriremos a Fábrica de Sabão para o bando visitar, e o Prefeito deve ser convincente ao dizer que aquele lugar serve para manter a justiça no bando, e não amedrontá-lo.

– Huh, boa sorte – o leão não queria nem pensar na Fábrica de Sabão. Já ganhara pesadelos o suficiente para uma vida com sua estadia lá. – Já que vai passar um tempo com meu padrinho... ao menos dê um jeito no seu bafo de hortelã.

– Eu adoraria, mas não achei capim de dentes à venda em lugar nenhum.

Asani desconhecia o termo capim de dentes. Quando um leão queria refrescar o hálito ele lambia os próprios pelos.

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