O Banco dos Leões

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– Está dizendo... que tem cervos no Banco dos Leões?

A jovem não conseguia acreditar no que o leão de juba penteada dissera. Poderia ter sido apenas um mal entendido, fruto da tensão e fome que Abbo vinha enfrentando nos últimos dias, mas Azizi foi categórico, confirmando aquilo como se fosse a coisa mais natural do mundo:

– Só tem cervos no Banco dos Leões – suas palavras eram frias e definitivas. – Dizem que é a carne mais macia e suculenta de todas, quase doce, mas ninguém vê um há décadas. Só alguns idosos caducos comentam ter experimentado, na infância... Mas o importante é nos concentrarmos na promoção do Prefeito... Como se eu já não tivesse meus problemas. Ai, pelos meus bigodes... Isso é sarna para eu me coçar.

Azizi se levantou, chicoteando o ar com sua cauda e indo em direção à porta do quarto. Abbo queria saber mais sobre aquela estória de um banco de cervos, mas não sabia como abordar o leão sem que parecesse suspeito. De repente uma vozinha soou, vinda do topo de sua cabeça:

– Como posso aprender mais sobre o Banco dos Leões?

– Vá para o Departamento de Registros, no segundo andar... Espera – Azizi se virou, estranhando aquela voz fina e baixinha. – O que... você... – seus olhos cansados viam somente a corça-leão, em pé, no meio do quarto. – Nossa, eu podia jurar que... Estou precisando dormir urgentemente.

Abbo trancou a porta após o Assistente do Prefeito sair. Estava confusa e inquieta com tamanha revelação:

– Cervos! Tem cervos nesta cidade! – ela saiu andando pelo quarto, mal notando quando o ratinho cinza saltou de sua cabeça para a cama. – E eles estão presos no banco! Eles... são mercadorias? Como assim só existem cervos no Banco dos Leões?

– De onde você veio, senhorita Abbo? – Ruffles tinha uma leve ideia da situação.

– Da Cidade dos Cervos, ora... De onde mais uma corça viria?

– Isso me soa familiar... Devemos ir ao segundo andar, respostas nos aguardam no departamento do qual aquele leão falou.

– Não sei... Já é noite, e eu estou com muita fome, não consigo pensar direito...

– Acho melhor que o novo Auxiliar Organizacional da Cidade dos Leões se atualize acerca das construções da metrópole o quanto antes – Ruffles saltou da cama, correndo até os cascos da corça. Abbo deu um sorrisinho, abaixou-se e apanhou o ratinho cinza, enfiando-o novamente em sua juba falsa.

– Tudo bem – ela concordou, indo abrir a porta novamente. Depois a trancou pelo lado de fora, seguindo pelo já conhecido corredor de quartos dos servidores. – Ah, queria não ter que pensar nessas coisas horríveis, agora...

– E no que gostaria de pensar?

– Em abóboras, talvez – havia trechos acarpetados, no trajeto até as cabines para subir, tão macios que faziam a corça querer deitar no chão e dormir um longo sono. – Abóboras bem docinhas, vermelhas e gordas. Acha que Tukufu gostaria de abóbora, se ele experimentasse?

– Acho que ele já comeu algumas – Ruffles fez a corça rir, afastando seus pensamentos de comida –, mas as engoliu inteiras, e estão até hoje em sua pança redonda.

No hall à frente, dois leões discutiam sobre uma campanha de vacinação antirrábica, enquanto um terceiro, usando um terno cinza claro, aguardava a cabine que o levaria para o térreo. Abbo se aproximou, aguardando ao seu lado.

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