Durante o tempo em que teve aquele antebraço pressionando sua garganta, Hikari percebeu o tamanho do engano que cometera ao imaginar que, usando aquele corpo, Cyane se tornaria uma oponente fisicamente fraca. Provavelmente, não tinha um décimo da força que possuía enquanto usava Kali, mas, ainda assim, aquela não era a capacidade física normal que Catherine teria. Era como se conseguisse fazer facilmente uso do máximo de força que aquela menina de dez anos poderia possuir. O suficiente para fazer aquelas mãos serem plenamente capazes de quebrar o pescoço de alguém, algo que Hikari jamais imaginava que sua frágil sobrinha conseguiria.
— Pare com isso, Cat... Por favor...
A pressão do antebraço aumentou e Cyane riu.
— Sabe o que a "Cat" quer nesse momento? Ela implora para que você acabe com o sofrimento dela. Tem coragem para isso?
Para Cyane, aquilo se tornava a cada instante mais divertido. Pela primeira vez, poderia provocar seu adversário, mesmo estando em uma situação fisicamente inferior, na total certeza de que não seria ferida por ele. Achava deplorável aquele sentimentalismo barato.
Por isso, não tinha qualquer pressa em matar Hikari. Quando percebeu que ela estava prestes a desmaiar, soltou o pescoço dela, observando, com um imenso prazer, enquanto ela tossia e tentava retomar o ar. Aproveitou o momento para puxar o sabre da ariana e, com ele em mãos, caminhar tranquilamente até uma cadeira, que era o único móvel existente naquele cômodo. Sentando-se lá, olhou com atenção enquanto tanto Anne quanto Hikari se levantavam, ambas com esforço. Achou patética aquela persistência, tanto quanto o fato de as duas trocarem um olhar de preocupação uma com a outra.
— Sabem que ambas vão morrer aqui, não é? Estou disposta a fazer com que isso ocorra com muito sofrimento. Só resta saber qual das duas vai suportar mais tempo e qual morrerá primeiro.
Hikari foi para a frente da irmã, encarando Cyane.
— A sua questão é comigo. Se quer lutar, vamos lutar, mas deixe Anne ir embora. Minha irmã já sofreu demais para ainda ter que presenciar isso.
A sugestão fez Cyane ter uma nova ideia de diversão para aquele momento.
— Tem razão... Não há necessidade de as duas passarem por isso. Mas vou deixar que vocês resolvam.
Ela jogou o sabre, que caiu pouco à frente dos pés das guardiãs, que olharam para aquilo sem entender.
— Quer se poupar do sofrimento, Anne? Então mate a sua irmã, e te deixarei sair daqui com vida. Ou talvez, Hikari, seu discurso seja só da boca para fora, não acredito que ninguém seja capaz de dar a vida por outra pessoa. Então, por que não acaba com toda essa hipocrisia e mata logo a sua irmã, que aí eu serei benevolente e pouparei a sua vida? Simples assim, senhoras... Não me importa quem mate quem... Para uma de vocês ter a chance de sair daqui com vida, a outra tem que morrer.
Por um momento, Hikari se esqueceu completamente que aquele era o corpo de sua sobrinha e, em fúria, avançou sobre ela. Puxando-a pela gola do vestido, socou o rosto da menina com força suficiente para que o nariz sangrasse.
Anne gritou para que ela parasse e começou a puxá-la antes que continuasse os ataques e acabasse matando a criança. Mas Hikari estava cega de ódio e parecia, enfim, compreender que aquele corpo não pertencia mais à sua sobrinha, mas sim a um monstro da pior espécie. Preparou-se para dar outro soco quando foi traída por seu próprio emocional. Os olhos de Catherine se voltaram para ela e sua voz tornou-se mais mansa.
— Está me machucando, tia...
Hikari sabia que não era Catherine. Ainda era aquela maldita Cyane brincando com seus sentimentos, destruindo toda a sua estrutura emocional. Ainda assim, não foi capaz de continuar. Soltou-a e retornou alguns passos, se afastando enquanto passava as mãos pelo rosto, desesperadamente pensando em alguma solução que não envolvesse matar sua sobrinha.
Mas tal solução simplesmente não existia.
— Não tem mais jeito, não é? — a voz de Anne chamou a sua atenção.
Quando a olhou, Hikari sentiu seu ódio triplicar. Anne estava completamente destruída. E que outra mãe não estaria, em uma situação como aquela?
— Não tem jeito, Anne. E parece não ter mesmo, porque... eu não vou matar a Catherine.
— Nós não a mataremos, mas sabemos que alguém o fará. Porque é o único jeito de deter Cyane.
— Sabemos. Mas essa culpa eu não vou carregar comigo.
— Talvez seja melhor fazer o que ela quer.
— Se quer me matar, vá em frente, Anne. Não pretendo fazer isso com você.
— Eu já tive meus filhos, Hikari. Você está grávida do próximo Guardião de Áries. Se uma de nós tem que morrer para que a outra sobreviva, que seja eu. Precisamos ser racionais.
Hikari quase riu com a última frase.
— Por favor, oneechan... Sabemos que isso de ser racional não é o seu forte.
— O seu também não.
— Pois é. Eu sou puro impulso, você é pura emoção... e nenhuma dessas duas coisas nos ajudam agora.
Cyane começou a se irritar com a conversa.
— Ou vocês se decidem, ou terei que matar as duas.
Determinada, Hikari caminhou até onde seu sabre havia caído e o apanhou do chão. Olhou para Cyane de forma desafiadora e provocou.
— Comece por mim, então.
Um sorriso de satisfação surgiu no rosto da menina.
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Guardians II - Metamorfose
FantasyDez anos depois. Uma nova ameaça. Uma nova aventura. Todas as quartas-feiras, a partir de 26 de abril. Enquanto isso, ainda não conhece Guardians? Leia também no wattpad: https://www.wattpad.com/story/5029608-guardians