Capítulo vinte e sete - Consertando o passado (Parte 8)

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Mal o telefone foi desligado e Maire precisou lidar com a indignação de Live:

— Que papo é esse, tia Maire? Quem disse que pretendo voltar para a base? Não vou sair daqui.

— Não adianta ficar, meu amor. Provavelmente, caso autorizem alguma visita a Mic ainda hoje, será de apenas um familiar próximo e por pouco tempo. Vocês podem voltar amanhã.

Maurício também não se mostrou feliz com a ideia.

— Não vamos te deixar sozinha agora, Maire. — Ele olhou rapidamente para Gabrielle, de modo com que Maire compreendesse ao que ele se referia.

Mas ela tratou de tranquilizá-lo:

— Nada será capaz de tirar a minha paz hoje. Já tive a melhor de todas as notícias. E tudo ficará bem, não temo mais ameaças. Além do mais... — Olhou para Live — Alexia está se sentindo sozinha. Ela precisa de um pedacinho da família perto dela, para lhe trazer sensação de proteção e dizer a ela que tudo ficará bem.

— Se é assim — Mauricio voltou a falar — a Live pode ir, mas eu vou ficar com você.

— Sei o quanto você queria se despedir da Shermmie antes de ela ir para o aeroporto, Mau. Isso não será mais possível, mas sei que também tem um carinho enorme pelo Ryan e gostaria de estar na base para recepcioná-lo nesse momento. Por favor, não perca essa oportunidade. Ryan está a salvo, mas está passando por um momento muito difícil. Infelizmente eu não posso estar com ele nesse momento, porque Mic precisa de mim. Mas você pode. Não deixe isso para depois.

Por mais que lhe doesse concordar com aquilo, Maurício sabia que ela estava com a razão. Porém, ainda assim nenhum dos dois concordou tão facilmente em deixá-la lá sozinha com Gabrielle. Maire garantiu a eles que não aceitaria provocações. Por fim, os dois foram vencidos pelos argumentos e acabaram indo embora.

Com Enzo no colo, Maire se sentou a uma distância de três cadeiras de Gabrielle, ambas em silêncio. Passou-se quase uma hora até que o doutor Tamura chegasse, parando diante de ambas. Elas se levantaram, apreensivas, e antes que qualquer pergunta fosse feita, o médico contou:

— Ainda é um pouco cedo para considerá-la cem porcento fora de perigo, mas ela ter acordado foi uma grande vitória. Os sinais vitais também estão estáveis, mas vamos mantê-la ainda por alguns dias na UTI, apenas como garantia.

— Quero vê-la — Gabrielle se adiantou em falar.

E, antes que Maire pudesse rebater aquilo, o médico respondeu:

— Vocês duas poderão vê-la. Mas uma por vez e por apenas cinco minutos.

Gabrielle se indignou.

— Por que ela poderá ver a Micaela?

Tamura a olhou. Não conhecia aquela mulher, soubera apenas há poucos minutos que a mãe da paciente estava no hospital, e também mal conhecia Micaela Angeli. Mas vinha acompanhando o sofrimento e o empenho de Maire durante aqueles últimos dias, e isso era o suficiente para dar a ele a certeza necessária para responder aquela pergunta:

— Porque elas se amam. E sei que não há ninguém que Angeli mais queira ver nesse momento do que a companheira.

Maire sorriu, agradecida. Sem olhar para Gabrielle, falou:

— Não posso te impedir de vê-la, mas posso pedir que pense bem se realmente quer fazer isso agora. Talvez ter emoções fortes nesse momento seja péssimo para a Mic.

— Com certeza é — o médico opinou, antes de pegar Enzo dos braços de Maire e, segurando-o, guiá-la até a porta da UTI. No caminho, fez algumas observações. — Ela passou muitos dias entubada, por isso terá dificuldades para falar. Não a force muito a isso. Ela também está fraca, além de estar sob o efeito de sedativos, por isso não se assuste caso ela adormeça de repente. E nada de emoções fortes, como já disse. — Os dois pararam diante da porta aberta e avistaram Micaela abrir lentamente os olhos. Maire sorriu e o médico temeu que ela não estivesse mais prestando atenção a uma única palavra do que ele dizia. Ainda assim, completou: — Apenas cinco minutos. — E saiu, deixando as duas a sós.

Maire foi até a cama, apanhou delicadamente a mão de Mic junto à sua e, sorrindo, ao mesmo tempo em que segurava as lágrimas, falou com a voz baixa:

— Oi, dorminhoca. Que susto você nos deu, hein?

Micaela desviou os olhos de Maire por um momento, percorrendo-os ao seu redor. Com a voz fraca e rouca, indagou:

— Não estou certa se sei como vim parar aqui.

— Shiu... Não se force a falar. Ainda mais sobre coisas ruins. Já passou!

Mas Micaela insistiu, voltando a olhá-la nos olhos.

— Eu não me lembro de ter lacrado a barreira.

— Não lacrou. Mas não se preocupe, nós cuidamos bem disso.

— Como estão todos?

— Bem. Hikari e Ryan chegaram a ficar internados também, mas já tiveram alta. Estão todos apenas esperando pelo seu retorno.

— Enzo? Alexia?

— Estão ótimos e sendo bem cuidados, não se preocupe.

— Maire... foi uma mera impressão minha ouvir a voz da minha mãe quando acordei?

A ruiva deixou de sorrir, pega de surpresa pelo questionamento. Esperava que Mic não tivesse ouvido aquilo, para não ter que entrar no assunto naquele momento. Porém, decidiu omitir algumas partes da verdadeira história.

— Não, não foi. Ela realmente está no hospital. Marco contou a ela sobre o seu estado e ela se preocupou com você.

— Eu queria muito poder acreditar nisso, Maire. Mas não consigo. Me diga a verdade, o que ela veio fazer em Tóquio?

— O que mais ela teria vindo fazer, Mic? Eu sei o quanto esse reencontro é inesperado, e o quanto você deve estar confusa com tudo isso. Mas agora, tente não pensar tanto a respeito disso. Você precisa descansar, para se recuperar logo e podermos voltar para casa.

Maire bem sabia o quanto seu pedido era quase impossível. De que forma Micaela poderia não pensar a respeito daquele reencontro depois de mais de uma década sendo renegada pela mãe? Tudo o que desejava naquele momento era que Mic fosse forte o suficiente para aguentar mais aquela decepção quando soubesse das reais intenções de sua mãe ali.

Chegou a agradecer a Deus quando aconteceu o que o médico advertiu e Mic adormeceu, vencida pelos fortes efeitos dos medicamentos. Mas Maire continuou ali, até o último segundo que lhe restara, até que Tamura voltasse a abrir a porta, informando-a que o tempo estava esgotado. A ruiva se despediu deixando um leve beijo nos lábios da companheira e saiu. Na recepção, enquanto voltava a pegar Enzo nos braços, notou que Gabrielle não estava mais ali.

*****

Guardians II - MetamorfoseOnde histórias criam vida. Descubra agora