Capítulo vinte - Até o último segundo (Parte 3)

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As duas foram escoltadas até a entrada do castelo e, a partir dali, o soldado as deixou sozinhas, retornando para seu posto de defesa dos portões. Ainda que não pudesse enxergar, Ling Su era capaz de sentir a atmosfera pesada na qual aquele local estava envolto. E Hikari conhecia muito bem aquela sensação. Odiava ter que voltar àquele lugar. Na verdade, perguntava-se como a irmã Kiara conseguia viver ali. Aquelas paredes acinzentadas remetiam a uma prisão, não a um lar. Pensou que aquele seria um péssimo lugar para Hina crescer e cogitou, quando reencontrasse a meia-irmã, convencê-la a se mudar dali. Dez anos não tinham sido tempo suficiente para demolir aquilo ali e construir um novo castelo? Aliás, este poderia, inclusive, ser até um pouco menor. E menos confuso de se andar também.

— Nós ainda vamos ter que virar quantas vezes? Estou ficando tonta! — Ling Su se referia à quantidade de vezes em que entravam em um novo corredor, seguindo por aquele labirinto pelo caminho que Hikari torcia para ainda se lembrar com perfeição.

— Foi você quem quis vir comigo, agora não reclama!

Desde o momento em que entraram, quase vinte minutos se passaram até que chegassem ao salão. Ali, Hikari parou e estendeu o braço diante de Ling Su, obrigando-a a fazer o mesmo, quando avistou Ryan caído, ferido, em meio as escadas, com Maurício e Riki ao seu lado. Correu até eles e a chinesa a seguiu, confusa.

— Ryan! — Hikari abaixou-se no degrau diante do cunhado, preocupada. — O que aconteceu com ele?

Foi Maurício quem respondeu:

— Nós já o encontramos assim.

— E a Anne, onde está? — Olhou para Riki. — Ela não estava com você?

Maurício explicou:

— Ela estava comigo e com a Live, mas acabamos nos separando.

Hikari sabia que aquele não era um bom sinal. Não gostava nem de imaginar sua irmã andando sozinha pelos corredores confusos daquele castelo, tendo que relembrar todos os horrores que passara ali em duas épocas diferentes de sua vida.

— E a Live, não estava com vocês?

Riki e Maurício olharam ao redor, só então parecendo perceber a demora de Live em retornar. O garoto respondeu:

— Ela subiu as escadas, foi verificar alguma coisa no andar de cima, mas já devia ter voltado.

Hikari sabia que aquele era um péssimo sinal. Levantou-se a apontou para Ling Su, pedindo:

— Vocês fiquem aqui cuidando do Ryan, e não deixem essa menina ir atrás de mim. Vou ver onde a Live está.

Dito isso, ela subiu as escadas. Sabia que deveria ser mais cautelosa em fazer isso, caminhar devagar e fazendo o mínimo de barulho possível, mas estava aflita demais para fazer as coisas da forma correta. Sendo assim, subiu correndo, com seus passos ecoando nas paredes de pedra. Ao chegar lá em cima, viu que uma das portas estava aberta e foi diretamente para lá. Chegou no momento em que Live se levantava diante de um corpo sem vida.

— Algo me diz que não é uma youkai... — pensou em voz alta.

Live se voltou para ela e só então Hikari viu que ela chorava, além de ter as roupas sujas de sangue.

— Não é uma youkai — a indiana confirmou.

Agora, sim, Hikari se aproximou devagar, com certo medo do que veria. Ao observar melhor o corpo, avistou uma mulher bem idosa, com traços indianos. Não demorou a supor quem seria.

— Cyane está morta? — questionou, confusa.

Live adoraria confirmar aquilo. Mas a verdade precisava ser encarada.

— Não. Kali está morta.

Nenhuma nova palavra precisou ser dita para que Hikari compreendesse o que tinha acontecido. Em pânico, ela saiu do quarto, novamente correndo, desta vez ainda mais rápido do que antes. Atravessou todo o extenso corredor até chegar aos pés de mais uma escadaria, a qual subiu na maior velocidade que conseguia. Chegou a um hall, onde havia uma única porta que levava a um gigantesco salão. Mal colocou seus pés naquele extenso cômodo e suas pernas travaram em pânico com a cena que visualizou. Correntes que pendiam do teto prendiam, juntos, os pulsos de Anne. Se fosse alguma outra pessoa, talvez Hikari agisse por seu habitual impulso, correndo até lá para soltá-la. Mas ela viu-se completamente paralisada pelo medo de constatar que a irmã estava morta, pois esta era a impressão nítida que tinha àquela distância.

— Anne-chan... — tentou chamá-la, mas sua voz saiu em um sussurro angustiado.

Forçou-se a dar os primeiros passos, mas logo voltou a parar ao ouvir o estrondo atrás de si, da enorme porta de ferro se fechando violentamente. Ao se virar, aquela que fechara a porta lhe sorriu de um jeito tão doce que, por um instante, quase a enganou.

Quase...

— Você demorou, tia. Estava esperando por você.

— Cat...

*****

Guardians II - MetamorfoseOnde histórias criam vida. Descubra agora