carminho
- Christian?
O Ander afastou-se de mim, indignando com a presença do (ex) amigo. Era muito tarde, ainda nem se tinham resolvido.
Começou a olhar-me um tanto desconfiado, o que me preocupou bastante. Sentia um enorme medo de deixar o meu namorado inseguro com a presença de Christian na minha vida.
Porém, era das pessoas mais próximas de mim, com quem podia contar.
- Porque raio lhe ligaste?
- Mano, ela só estava preocupada contigo. Não descarregues na tua miúda, ok?
- E tu pensas o quê? Que podes aparecer e salvar o mundo? - Riu-se, um tanto irónico. - O que vale é que já estou habituado.
Balançava a cabeça, incrédulo.
Percebi que se estava a sentir ameaçado com o facto de ter ligado para Christian.
A verdade, é que não soube o que fazer quando o vi deitado no chão. Jamais me correu acordar a sua família, então, apenas liguei para o amigo mais fiel e preocupado que tinha.
- Ander...
- Conta-me a verdade Carminho, não mereço que me mintas... - A forma como me encarava, apenas me partia o coração.
- A verdade é que estou contigo. E que te amo, é essa a única verdade.
- Então... Porque ligaste para ele?
- Porquê Ander? Ainda perguntas? - Atirei os braços ao ar. Ele não podia estar a falar a sério naquele momento. - Era suposto ter acordado a tua família para te encontrarem demasiado? E por causa de drogas?!
- Não! Por favor. Os meus pais não podem descobrir nada. - Alcançou os meus braços, um tanto desesperado. - Não contes.
- Então pára! Pára com insinuações e acusações sem qualquer fundamento e deixa-te ser ajudado, podes fazer isso? - Balançou mais uma vez a cabeça.
O rapaz parecia estar perto de delirar.
Era óbvio que tinha consumido antes, apenas lhe bateu bastante mal a certa altura. Sabia que tinha uma história longa com a cocaína, nunca imaginei que fosse esta a realidade novamente, pois nunca me contou.
Já tínhamos conversado bastante sobre a Danna e o período em que o controlou e jamais mencionou as recaídas. O que me deixou triste, embora não o quisesse mostrar.
- Eu não queria. Eu juro que não queria. - Com os olhos quase a revirar, cambaleou.
- Christian! Faz qualquer coisa.
- Não há nada que possamos fazer. Tens que te manter calma, quanto mais agitado o Ander se sentir, pior vai ser o branco.
Com a ajuda do Christian, o Ander entrou para o carro e deitou-se nos bancos de trás. Levou as mãos à cabeça e começou a lamentar-se sobre o seu estado e a pedir desculpa por ser mau filho e a dizer que era uma desilusão.
Queria abraçá-lo e conforta-lo nos meus braços, mas não o fui capaz. Apenas me sentei no lugar de acompanhante e Christian afastou-nos da casa do Ander.
E da minha, o que me aliviou também.
- Acho que ele adormeceu. - Murmurei, virada para trás, de modo a olhar para Ander. - Nunca pensei que ele estava assim.
Alcançava os cabelos suados do moreno, enrolando-os aos meus dedos. Sentia-me triste e uma inútil naquele momento. Não sabia com que cara olhar para o Ander, visto a não saber sequer como o ajudar.
Queria que ele se apoiasse em mim e permitisse que estivesse ao lado dele. Que fosse totalmente honesto e transparente.
- Há anos que não o via assim. - Lamentou por sua vez, o melhor amigo do moreno.
- O que podemos fazer?
- O Ander superou muitas vezes os vícios, mas cada recaída se torna pior. Pensei que fosse ser um caminho sem volta há uns anos, embora ele me ter surpreendido muito.
- Achas que pode ser uma ida sem volta desta vez? Eu percebi que havia uma história entre o Valério e o Ander...
- E havia. - Interrompeu. - Está mais que encerrada para o Ander, embora o Valério não se ter confirmado com isso. Quando ele largou tudo e ficou limpo, eles insistiram para voltar e ainda lhe bateram.
- Sim, eu lembro-me dessa noite. Sei pouco, mas o suficiente para perceber que o Ander não está consciente das coisas.
- Cabe-lhe a ele...
- O que posso fazer? Tenho medo do que possa dizer amanhã. - Admiti a Christian.
Respirei fundo, encarando-o.
O Christian prometeu que ia ter uma conversa séria com o moreno e ajudá-lo no que fosse ou não fosse possível. Era o seu melhor amigo, era obvio que o iria fazer.
Concordei com o rapaz à minha frente, quando este comentou que o ia levar para a sua casa, de modo a não preocupar os pais de Ander. Não ia ser nada bonito, pois ambos acreditavam que o filho mais velho estava bem.
Livre de drogas.
- Vai deitar-te Carminho, amanhã prometo que o Ander te vai ligar. Fica descansada, sei como tomar conta dele... Neste estado.
- Obrigada Christian. Não sabia o que fazer, nem percebi o que se passava... Até ele mostrar o pacote de cocaína. - Tirei-o do bolso. - Ainda tirei a tempo...
O rapaz suspirou, observando o amigo.
Era simplesmente triste ver uma pessoa por quem sentimos um carinho enorme, afogado e a perder o controlo dele próprio.