Capítulo 4

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Havia anotações de pelo menos seis meses. O diário estava quase todo preenchido com datas e horários em que as minas eram operadas, havia também registros de patrulhas e horários das trocas de turno. Pelo visto metade dos prisioneiros ficavam trabalhando nas minas de cobre no turno da noite enquanto outra metade voltava ao continente. O nome do meu pai aparecia por diversas vezes nos registros noturnos dos últimos três meses. O diário estava quase todo preenchido com esses registros. Como o Noah teve acesso a essas informações? Como se estivesse lendo meus pensamentos ele se levanta da poltrona e contorna a mesa de carvalho, cada passo calculado e silencioso. Ele retira o caderno das minhas mãos trêmulas antes de se recostar na mesa.
Então indaga:

- Sei que deve ter muito o que perguntar -, sua voz grave sai fria. Entediada. - Mas advirto que elas terão seu preço. - Mal conseguia encará-lo, meu foco estava no caderno que Noah sopesava em suas mãos como se fosse um troféu recém lustrado, esse gesto me fazia querer avançar em sua garganta a apenas um metro de distância, embora fosse um pouco difícil por ele ser o dobro do meu tamanho. E ele sabia disso a julgar pelo modo que me avaliava. Era um desafio e ele estava jogando.

- Como você conseguiu. E não era uma pergunta.

- Me custou bastante sabia? Devia ao menos me agradecer por isso. - Sua voz como um ronronar de um amante aos ouvidos.

- Como. Você. Conseguiu.- Minha voz saiu hesitante. Anestesiada. Noah contornou novamente a mesa e voltou a sentar na poltrona, guardando o caderno novamente na gaveta. A chave agora em uma corrente de prata presa em seu pescoço.

- Um dos meus saqueadores durante uma negociação, ouviu casualmente de um dos nossos colaboradores do continente que alguns presos estavam sumindo durante os turnos noturnos sem que nenhum dos Duplicados se quer notasse, eles acreditam que os desgraçados de alguma forma estão mexendo no sistema deles. Mas o fato é que a fuga também estava atrapalhando os meus negócios. Você imagina quanto cobre perdir nesses últimos meses?

- Vá direto ao ponto. - Pelo sol! como minha cabeça latejava.

- O fato é que decidir cuidar eu mesmo dos meus negócios, então enviei alguns homens para vigiar as minas de cobre e relatar como os desgraçados estavam sumindo com meus investimentos. Demorou três meses até conseguir todas as informações de que precisava para descobrir que seu querido pai estava entre os presos, e mais - ele passou a mão em uma mecha preta do seu cabelo que caia nos olhos -, que estava ajudando nas fugas. Talvez ele seja o líder que os rebeldes estão tão empenhados em resgatar das garras do continente. Mas por que ele não tentou escapar, voltar para vocês? Eu só Imagino o quanto seria tão mais fácil se eu simplesmente entregasse o diário para o continente. As coisas voltariam a ser como eram antes, eu com meu cobre, os rebeldes expurgados... todos ganham. - Arrogância. Pura e cruel arrogância era o que delineava seu rosto bem definido e belo.

- Esse caderno não prova nada. Você pode muito bem ter forjado as informações ou conseguido nomes aleatórios nos registros, não deve ser difícil para você conseguir o que quer.- Isso é um pesadelo. Um dos muitos que estou encarando ultimamente e irei acordar a qualquer momento ao lado da minha irmã na cama. Isso é um pesadelo... um pesadelo... um pesa...

- E quanto a isso -, Noah jogou sobre a mesa uma pasta, que ele retirou de uma das prateleiras próximas a ele. Se quer notei quando o fez. - Todo o registro do seu pai, desde o dia da sua captura. Sabia que ele escrevia cartas... para vocês? Talvez seja uma forma de manter a sanidade naquele buraco, os bilhetes foram encontrados escondidos entre uma rocha nas minas, queimaram quase todos mas meus saqueadores conseguiram resgatar um deles, é recente, data de duas semanas atrás. Talvez eu seja bondoso e lhe permita lê-lo. - Um meio sorriso cobria seus lábios agora.

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