Capítulo 4

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01 de março de 2026 (10:40 - Santa Barbara, EUA)

Louis

A melhor parte das férias é ficar livre para escolher o que eu vou fazer e quando eu vou fazer, então o primeiro lugar que eu decido ir é visitar minha avó, uma decisão lógica com base nos últimos acontecimentos. Quando paro o carro, vejo dona Emily sentada do lado de fora, ao lado de Natalie, a enfermeira que eu e Lucy contratamos para garantir que nada aconteça com a nossa avó, porque apesar de ter três filhos, nenhum deles parece se importar com a mãe.

-— Bom dia, Natalie. — Ela sorri antes de me responder.

— Oi, Louis, como está?

— Muito bem. E vocês? — Me aproximo e percebo minha avó bastante alheia ao que acontece ao seu redor, mas bastante atenta aos passarinhos que tentam fazer um ninho no telhado da casa da frente.

— Estamos bem também, não é Emily?

— Oi vó.

— Vó? Que vó? — Meu sorriso desaparece e eu tento não chorar.

— Sou eu, o Louis.

— Eu não conheço Louis, mas você é bem bonito. Meu nome é Emily. — Ela estende a mão para me cumprimentar e depois de alguns segundos em silêncio, estendo a minha.

— Obrigado. É um prazer.

— Talvez ela não esteja tão sã, mas está tranquila hoje. — É, talvez eu tenha notado.

— Posso entrar um pouco?

— Óbvio, a casa está arrumadinha. Nós duas cuidamos disso hoje né? — Ela se direciona a Emily.

— Foi? Acho que foi sim.

— Vou entrar rapidinho ali. — Sinalizo e respiro fundo.

— Fique à vontade, daqui uns minutinhos nós entramos também.

— Ok.

Ando pela casa, passando pela sala e subindo para o segundo andar, onde ficava o quarto da minha avó, que agora é no andar de baixo, pois facilita a locomoção e o contato com a Natalie, que também fica ali. Passo o olho pelo lugar, me lembrando da época que ela pelo menos se lembrava de mim, que não se confundia tanto com o tempo e os acontecimentos. Há três anos ela recebeu o diagnóstico de Alzheimer e meu mundo caiu, nunca imaginei que algum dia isso pudesse acontecer.

As coisas estão no mesmo lugar que sempre ficaram, daria trabalho demais transportar tudo

pra baixo então optamos por deixar. Abro algumas gavetas e vejo uma infinidade de cadernos, álbuns e papéis soltos. Me sento na cama e começo a olhar tudo, amo ler as coisas antigas dela. Tem fotos dela e do meu avô, os filhos dela, os netos, várias e várias fotos minhas e da Lucy. Cadernos com inúmeras receitas e papéis com coisas irrelevantes escritas. Quando decido colocar tudo de volta no lugar, percebo um envelope amarelado no meio, com um endereço que eu não reconheço, mas o nome do remetente sim. É uma carta da Alice. Uma carta que a Alice mandou para a minha avó. Contrariando tudo que me diz que é errado abrir a correspondência alheia, tiro o papel do envelope e começo a ler.

"Oi Emily, como você está? Eu amei a última carta que você enviou. É bom saber que o Louis continua investindo na música. Ultimamente eu tenho ouvido bastante sobre ele por aqui, o que é impressionante para uma cidade minúscula no meio da Alemanha. Você também falou que ele não fala sobre mim e eu até acho isso bom. Ele provavelmente ainda tem muita mágoa pelo que eu fiz, mas talvez um dia ele entenda que eu não fugi daquele jeito por capricho, orgulho ou algo do tipo, você sabe que eu precisei fazer aquilo por nós dois, você apoiou minha decisão. Hoje eu vejo que talvez não tenha sido a forma mais madura de lidar com a situação, mas ainda confio que tenha sido bom. Por mais que as consequências possam ser horríveis, eu só fiz o que eu fiz para garantir que o Louis conseguisse conquistar o sonho dele. Eu só quero que ele seja feliz, com ou sem mim.

Eu sei que já disse isso algumas vezes, mas preciso reforçar que você estava certa, ter o bebê foi mesmo uma decisão maravilhosa e eu não me arrependo em momento algum. Obviamente ter um filho não estava nos meus planos quando aconteceu, mas eu não mudaria absolutamente nada, ou então, apenas o fato de ter escondido esse menino do Louis por tanto tempo, mas estou planejando consertar isso o mais rápido possível, as coisas saíram do controle. Não se preocupe quanto ao nosso menininho, ele está ótimo e amou o presente que você mandou de presente de Natal. Essa criança é igual ao pai, um clone quase que perfeito. Tem uma foto dele na próxima página. Prometo que um dia você vai conhecer seu primeiro bisneto. Fique bem, até algum dia.

Alice."

Ainda atônito, pego a outra folha e vejo. Uma foto de um garotinho sorrindo. Ele tem os cabelos castanhos como os meus, compridos, quase alcançando o ombro. Os olhos enormes brilham como os dela, a diferença é que ele possui olhos azuis, como os da minha avó. O tom é exatamente o mesmo. Ele usa um vestido da Minnie e tênis com luzes piscando. Procuro alguma data e percebo que é de mais de três anos atrás, no Natal de 2022. Faço as contas e percebo que esse menino está com quase seis anos hoje. Releio a carta mais de uma vez, ela realmente fala que ele é meu filho, que sabia que estava grávida quando foi embora e que fez isso para o meu bem. Como esconder uma criança por tanto tempo pode ter sido algo bom? Guardo o papel de volta no envelope, com exceção da foto.

— Vó, ei, posso te perguntar uma coisa? — Me aproximo das duas mulheres, que agora estão sentadas no sofá da sala.

— Está falando comigo?

— Sim. Você sabe quem é esse menino da foto? — Mostro o papel para ela, esperando que isso resgate alguma memória dela. Preciso de mais informações sobre essa criança. — Sabe o nome dele?

— Não lembro, mas ele é uma graça, parece com você. — Sinto como se tivesse levado um soco no estômago.

— É, ele se parece comigo sim. — Estou prestes a chorar, mas não sei se é raiva, decepção, angústia, desespero. Não sei.

— Algum problema, Louis?

— Não, nenhum. Natalie, preciso ir. — Coloco a foto no bolso outra vez. — Volto outro dia pra ficar por mais tempo.

— Tudo bem, se ela estiver lúcida em algum dia eu ligo.

— Eu agradeceria se fizesse isso. Tchau, vovó. — Ela não responde.

Entro no carro e finalmente deixo as lágrimas escorrerem. Eu passei mais de seis anos sofrendo por ela, sofrendo pela ausência dela, sem entender o motivo exato por ter sido abandonado daquela forma e agora que eu sei de tudo, continuo sem entender. Nada disso justifica, na verdade. Esconder isso de mim não foi justo, não importa o que pudesse acontecer, eu tinha o direito de saber desde o início, queria ter sido presente na vida dele desde antes do nascimento dele. É inacreditável que aquela Alice que eu namorei tenha feito isso comigo.

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