Capítulo 15

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14 de março de 2026 (11:45 - Cochem, Alemanha)

Alice

Para o meu completo desespero, Lexie ligou avisando que ia se atrasar, e que não ia conseguir pegar Lily antes do almoço. Normalmente, eu não paro para comer, costumo pegar uma fruta ou um sanduíche pequeno, mas nada elaborado demais para não ficar muito parada. Já Peter sempre trouxe o almoço de casa, o que me salvou bastante. Quando o movimento aliviou um pouco, eu corri na cozinha e preparei o mais próximo de um almoço que eu consegui, para que Lily não ficasse sem comer, logo depois, pedi que meu amigo a levasse para comer na sala de descanso para nossas pausas. Lá não é adequado, mas é o mais próximo de calmo que pude pensar e é onde ele come também.

Logo que terminei de engolir minha maçã, voltei para o balcão, esperando o movimento aumentar logo. Mesmo em uma cidade tão pequena, muitas pessoas comem fora aos finais de semana e como servimos quase de tudo, algumas famílias optam por vir aqui. O sino indicando a entrada de um novo cliente toca e como sempre, eu espero para ter certeza de que vão se sentar em uma mesa ou fazer o pedido direto aqui. O homem passa por mim com a cabeça abaixada, eu olho para a menina no caixa e nós duas percebemos que é um cliente novo, ou pelo menos, vem muito pouco aqui.

— Bom dia, no que posso... — Começo a frase, mas ele levanta a cabeça e reconheço imediatamente. Ele não mudou absolutamente nada.

— Oi Alice. — Até mesmo a voz é a mesma. Na televisão parece diferente.

— Louis? O que você tá fazendo aqui? — Hope não me disse nada. Por que Hope não me disse nada? Hope sequer sabe que ele está aqui?

— Não se faça de boba. Você sabe o motivo de eu ter vindo até aqui. — Eu gostaria de não saber. Queria que fosse apenas uma visita a uma cidade minúscula no interior da Alemanha.

— Como me achou?

— Cartas normalmente constam com o endereço do remetente. E aparentemente você é a única Alice Hoffmann da cidade. — Droga de sobrenome.

— É um lugar pequeno.

— Alice. — Ele está sério. Tento manter o mesmo tom de voz que ele, firme.

— Louis.

— Eu sei que você teve um filho. Sei que eu sou o pai dessa criança. — Meu corpo inteiro treme e tenho a ligeira sensação de que ele percebe e gosta de saber disso.

— Louis, eu não posso conversar agora. Não aqui.

— Mas nós precisamos...

— Mas as coisas não funcionam do jeito que você quer. — Não deixo que ele termine de falar. Ele pode estar acostumado com as coisas como ele quer em outros lugares. Aqui é diferente. — Nós podemos precisar salvar o mundo, mas esse ainda é meu local de trabalho.

— Que horas você sai?

— Às 18.

— Eu espero. — Que homem insistente e teimoso. Lily realmente teve a quem puxar porque quando coloca alguma coisa na cabeça, nada muda.

— Você precisa pedir algo pra ficar aqui.

— Você sabe o que eu quero. — Coloco um milkshake de morango na fila. — Onde está a criança? — Se ele souber que ela está aqui eu me complico de vez. Como explicar que tive que trazer uma criança para o trabalho?

— Em casa. — Minto com tanta convicção que quase acredito na afirmação. A porta faz barulho novamente e eu olho rápido para garantir de que não é Lexie, mesmo sabendo que ela só vem daqui umas duas horas.

— Com quem? Seus pais?

— Meus pais estão mortos, Louis. — Sou direta. Não quero mais suposições. É irritante e estressante. — Eu já disse, não posso falar agora. Isso aqui não é nem perto de ser igual ao Tom.

— Mas Alice.

— Mas nada. Você tem suas prioridades e eu as minhas.

— E eu posso saber quais são as suas?

— No momento? — Ele exibe um sorriso debochado que se desfaz assim que eu termino a frase. — Não perder esse emprego pra poder criar minha filha do jeito que ela merece.

— Tudo bem. Eu espero.

— Ei, Ali. — Droga. Era pra ele estar lá dentro. — Tudo bem aqui?

— Peter! Sim. — Me aproximo dele e falo o mais baixo possível. — Cadê a Lily?

— Lá dentro. — Ele responde no mesmo tom.

— Volta pra lá. — Mal termino de falar e ele já está na parte de dentro novamente. Provavelmente entendeu que é pra manter a menina lá também.

— Seu namorado novo?

— Louis, eu estou tentando, mas se você não colaborar vai ser impossível.

— Eu só fiz uma pergunta. — Mais uma vez o tom debochado. E eu jurei que Hope estava só exagerando e que a convivência tinha desgastado a relação de todo mundo.

— Não. Eu conheço esse jogo. Você quer me desestabilizar. — Eu já estou desestabilizada. — Isso não vai acontecer.

— Tanto faz. Mas saiba que só estamos nessa situação por conta do que você fez. — Sinto tudo girando e quase preciso me apoiar em uma das mesas para não cair, mas me recuso a esboçar qualquer reação na frente dele. Eu sei que eu fiz a besteira, mas o fato dele reforçar só piora as coisas.

— Você não tem o direito...

— Alice, tá demorando tanto por que? — A garota do caixa quase grita, exalando mau humor, e Louis me encara parecendo assustado. Talvez agora ele tenha entendido como as coisas funcionam por aqui. — Esqueceu como colocar o pedido no sistema?

— O pedido dele já está no sistema.

— Ótimo.

— Louis... deixa. — Não vale a pena alimentar essa discussão, ou o ego dele. Pelo menos não por enquanto.

— Você tem pelo menos uma foto? — A pergunta dele me pega de surpresa, mas sim, eu tenho uma foto.

— Oi?

— É... a da carta é antiga. — Pego meu celular e tiro a capa, pegando a foto que está na parte de dentro. — Quero ver como ele está.

— "Ele" é uma garota. — Coloco a foto na frente dele. A foto da Lily sorrindo, com os olhinhos quase fechados. — Se você quer tanto falar da criança, acho melhor ir se acostumando com os pronomes da sua própria filha. — Ele fica sem resposta, encarando o papel jogado na mesa, enquanto eu volto para perto do balcão. Ele vai ficar aqui o dia todo, e eu não sei se vou conseguir lidar com essa situação.

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