Capítulo 18

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14 de março de 2026 (18:40 - Cochem, Alemanha)

Alice

Tranco a porta e observo Louis por um tempo. Ele olha tudo ao redor, provavelmente reparando no quanto a casa é pequena. O lugar também não é dos mais organizados, mas nem sempre dá pra manter tudo no lugar quando se tem uma criança como a Lily por perto. Prefiro mil vezes ter brinquedos jogados pelos cantos do que minha filha vidrada em uma tela na maior parte do tempo.

— Você veio conhecer a Lily? — Eu sei que a resposta é óbvia, mas o silêncio estava me matando.

— Como você pôde?

— Como é?

— Como você pôde esconder isso de mim por tanto tempo? Você fez todas as pessoas ao meu redor mentirem para mim.

— Tecnicamente, você nunca perguntou se eu tinha tido um filho. — Ele me encara e eu mal consigo olhar em seus olhos. Ele está tão diferente. — Perguntou?

— Alice, você tem noção do que você fez? Sabe a proporção disso?

— Eu tenho uma ideia sim, mas Louis, eu nunca quis te machucar, nunca quis que...

— Ah, agora você não queria me machucar? — O tom de voz dele só aumenta, mesmo que eu tente manter o meu baixo, na tentativa de evitar uma briga ainda pior. — E sair do país sem falar nada foi pra que eu não me machucasse?

— Você precisa tentar me entender. Nós éramos dois adolescentes... — Ele não me deixa terminar a frase, desse jeito vai ser impossível.

— Isso não te dá o direito de esconder um filho de mim por quase seis anos. Eu perdi seis anos da vida dele. SEIS ANOS, ALICE. — E eu sei o quanto isso foi doloroso para ela também. Eu pensei que fosse forte o suficiente para essa conversa, mas eu não sou. Estou prestes a desabar.

— Eu nunca vou saber como você se sente, mas me deixa tentar explicar. — Tento manter a calma, porque eu sei que se eu me estressar, vou acabar causando uma confusão ainda maior.

— Não tem o que explicar. Está tudo muito simples pra mim. Você fugiu com um filho meu na barriga, e se eu nunca tivesse encontrado aquela carta, eu nunca ficaria sabendo da existência dessa criança.

— Isso não é verdade. Eu queria te contar, mas...

— Mas o quê? Você não pensou que eu fosse rejeitar meu filho, pensou? — Tem muito mais além disso envolvido, mas antes de tudo, ele precisa entender que tem uma menina, e não um menino, como pensava.

— Filha.

— Que seja. É uma criança, não se importa com isso. — Meu sangue ferve. Só eu sei o que eu passei até conseguir entender aquela criança tão pequenininha.

— Aí é que você se engana. Isso é sim muito importante para ela, e se você em algum momento ousar desrespeitá-la ou se recusar a aceitá-la como ela é, eu mesma garanto que você nunca a conheça de verdade.

— Você não pode fazer isso. Eu sou o pai dela, tenho esse direito. — Mas se precisar eu vou até o inferno para evitar que aquela criança se decepcione com o próprio pai.

— Então se você não consegue me respeitar, aprenda a respeitar a sua filha. Não é porque naquela carta, escrita há sei lá quantos anos, eu falei sobre um garotinho, que esse garotinho ainda existe.

— Talvez se você não tivesse escondido a criança de mim por tanto tempo, eu hoje saberia exatamente como me referir a ela. — Ele vai continuar batendo nessa tecla. Quantas vezes eu preciso reconhecer o meu erro?

— Que droga, Louis, me escuta. Eu sei que eu fiz errado, mas eu não tinha escolha, eu não tinha mais opções.

— Tinha sim. Você tinha muitas opções. E essa confusão toda agora, é por causa de você, por sua culpa. — Sinto vontade de chorar, por um segundo visualizo aquele teste de gravidez outra vez na minha mão, o caos que foi me mudar do nada. A despedida que nós nunca tivemos.

— Eu sei disso, você não precisa reforçar em cada frase.

— Preciso sim. Você precisa entender o que me tirou. Você me impediu de ver minha filha crescer. Você foi capaz de impedir sua própria filha de conhecer o pai. — E isso me machucou em vários dias, por muito tempo. — Como você conseguiu dormir esse tempo todo?

— Não fala assim.

— Você não tem o direito de me falar como eu posso ou não posso falar. É do que eu perdi que nós estamos falando agora.

— Eu também perdi muita coisa com isso tudo. — Perdi amigos, minha família, o garoto que eu amava e que pelo visto, nem existe mais.

— Perdeu, foi? Você perdeu os primeiros passos da sua filha? Perdeu as primeiras palavras? Você perdeu o nascimento dos primeiros dentinhos dela? — Sim. Eu perdi tudo isso porque estava estudando para tentar dar uma vida melhor para ela, mas não posso falar isso. Sei que não é nada comparado com o que ele perdeu. Eu pelo menos a tinha por perto. — Você não perdeu absolutamente nada.

— Louis, por favor, se acalme. — Tem um nó gigante na minha garganta, mas eu não vou chorar na frente dele. Eu não posso ceder, porque se eu fizer isso, ele vai perceber que eu ainda sou fraca, que eu ainda não consigo me controlar.

— Como você quer que eu fique calmo? Eu perdi tudo de mais importante nos primeiros anos de vida dela. Tudo por conta de um capricho seu, por causa desse seu orgulho ridículo. — Minha vontade agora é de desaparecer. De voltar no tempo. Qualquer coisa que acabe com essa bagunça.

— Eu tinha a melhor das intenções, não faz isso comigo.

— Você é inacreditável. Como você se tornou esse monstro egoísta? — Eu não faço a menor ideia. Até agora eu não imaginava que eu tinha me tornado em algo tão ruim. — Quando isso aconteceu que eu não percebi? Eu te amava, Alice.

— Eu também te amava.

— Não. Quem ama, não faz o que você fez.

— Quantas vezes eu vou ter que falar que foi pro bem de todo mundo?

— Quantas vezes eu vou ter que falar que isso não vai funcionar? Essa historinha de que só queria nosso bem não funciona comigo. O que eu quero agora é recuperar o tempo perdido. De um jeito ou de outro. — Isso não pode significar o que eu acho que significa. Se ele tirar minha filha de mim eu morro. Eu não vou conseguir viver se ele tirar a Lily de mim.

— Você quer conhecê-la.

— Obviamente. Amanhã eu passo aqui.

— Amanhã? Você ficou maluco?

— Não. Você fez as coisas do seu jeito até agora, então a partir de hoje vai ser como eu quero. — Ele tem um ponto. De certa forma, ele tem direitos, e está em desvantagem. — Amanhã eu passo aqui pra conhecer a Lily.

— Tem que ser à noite.

— Você trabalha?

— Saio uma hora mais cedo do que hoje.

— E a tal Lexie?

— Ela estuda, não pode ficar por conta de um encontro assim. Fora que eu preciso preparar a Lily. Conversar com ela. — Ele precisa entender apenas isso.

— Amanhã às seis eu passo aqui. — Vai ser corrido, mas é melhor do que nada. Posso tentar me organizar.

— Louis, tem uma coisa que você precisa...

— Não. — Ele me interrompe mais uma vez. — Eu não preciso de nada. Quem precisa de alguma coisa aqui é você. Precisa entender que quem dá as cartas agora sou eu. — Não contesto. Ele está no direito dele. Eu errei. — Até amanhã.

Ele sai da casa e eu levo um tempo para sair do choque do que acabou de acontecer. Ele quer recuperar o tempo perdido, ele quer conhecer a Lily. Ele vai querer a guarda dela. Mesmo sem dizer, eu sei que ele vai. Eu pensei que estava fazendo o melhor, mas vou acabar destruindo a vida da minha filha.

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