²²

358 42 4
                                    

Uma semana depois...

O dia estava chuvoso e carrancudo, tão frio que não sabia ao certo se era o tempo ou o clima da casa. No espelho vesti minha camisa social preta, dobrei o colarinho depois de fechar o último botão, ajeitei os cabelos com os dedos, ainda me acostumava aos fios curtos.

Fui ao criado mudo ao lado da cama e coloquei meus anéis, um com a inicial "H" e a outra com um "S", no anelar vesti aquele que continha uma pedra verde, peguei meu paletó preto no cabide e coloquei por cima da camisa, estava pronto, pisquei diante do meu reflexo, respirei fundo e me retirei do quarto.

Hoje era o velório da Sra. Clarisse- que Deus a tenha- a casa estava num silêncio ensurdecedor, Sr. Patrick estava se preparando, assim como Alana.

Os últimos dias tinham sidos arrastados e cansativos, alguns parentes da mulher vieram para dar o último adeus, busquei eles no aeroporto, primos e irmãs, e seus pais claro, dois senhores muito agradáveis. Senhorita Stanford apesar de mal querer sair do quarto e se alimentar pouco, atendia a cada visita atenciosamente, com muita calma abraçava, prestava e recebia os pêsames, depois ao ver as visitas irem embora, voltava a sua cama.

Max teve aqui algumas vezes para saber sobre o estado do pai e da irmã, todos muito abalados ainda.

Toc! Toc! Toc!- bati a porta, ouvi um- entre Harry.

Adentrei seu quarto escuro, ela não fazia mais questão de acender a lâmpada, encontrava-se na frente do espelho, um vestido longo preto, sem estampa cobria seu corpo, descia até até seus pés- pode me dar o blazer em cima da cama por favor?- pediu-me, peguei a peça e fui ao seu encontro, abri para que pudesse colocar o braço na manga, o outro lado ficou apenas por cima do seu ombro, puxei seu cabelo para fora do blazer cor creme- obrigada.

Sua feição tão séria diante do espelho, não combinava em nada com ela, depois de arrumar as mangas soltou um longo suspiro pra sí mesma.

- Não vai sentir frio só com o vestido?- perguntei, a paciente me olhou e levantou o vestido, me encarou finalmente com um sorriso fraco no rosto, tinha colocado calças por baixo, ninguém iria perceber- ah claro, muito inteligente- dei um sorriso esperando que ela retribuísse, não o fez, ao envés disso, se concentrou em seu reflexo.

- Hoje vai ser um dos dias mais difíceis pra mim Harry- sua voz falhou, e ela engoliu, seus olhos marejaram rapidamente, mas olhou para cima para que as lágrimas não caíssem, havia chorado muito nos últimos dias, também não dormia direito, perdi as contas de quantas vezes acordei de madrugada ouvindo ela pela babá eletrônica, levantava para ir consolá-la, exausta o desânimo tomava conta pouco a pouco- eu não aguento mais essa dor, queria esquecer de tudo por um minuto e respirar aliviada, eu não sei como vou seguir sem ela.

A voz saía embargada e baixa, e me doía tanto vê-la daquela forma, uma parte de mim se despedaçou ao ouvi-la, e a outra a puxou para um abraço, para poder protege-la inutilmente das piores sensações que a consumiam, que levavam Alana pra longe mim, pra longe de si.

- Eu sei que está difícil Alana- dizia enquanto meus braços a envolviam, uma das mãos acariciava seus cabelos sedosos perto a nuca, cheirava a amêndoas- olhe pra mim- pedi, lentamente levantou seu rosto, os cílios molhados pelas lágrimas cobriam os olhos castanhos, o brilho deles apagara- você é uma garota muito forte, creia nisso, nunca conheci outra pessoa com uma trajetória tão conturbada quanto a sua, muito menos que continue sendo tão doce e gentil como você é apesar de tudo- as pálpebras piscavam, prestava atenção em cada palavra- a vida é assim, cruel em alguns momentos, mas não existe dor no mundo que dure pra sempre, ou que ao menos não se torne suportável- levei uma das minhas mãos ao seu rosto, passei o polegar por suas sardas quentes- você vai conseguir seguir, sua mãe estará te guiando lá de cima, e eu - pausei a fala - sempre estarei aqui pra cuidar de você, passaremos por essa juntos baby.

Meu enfermeiro inesperadoOnde histórias criam vida. Descubra agora