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- Ele pulou! Num ato de desespero o rapaz que antes se pôs a frente das viaturas, agora se jogou da ponte!

Meu Deus!- Os clientes falavam no restaurante.

A aquela altura do campeonato, as pessoas no salão já estavam sabendo da nossa ligação com os envolvidos, graças ao ataque de choro de Taylor, eu não a culpo, também estava com medo do pior.

Uma das madames de meia idade, se sentou ao lado dela num gesto de solidariedade e compreensão - Calma querida, vai dar tudo certo tenha fé - suas mãos alisavam os braços da minha amiga numa tentativa de confortá-la.

O helicóptero iluminava o rio com uma luz forte, a procura de Harry no meio das águas, o carro já se encontrava quase totalmente submerso.

- Vamos Harry, cadê você- esperávamos um sinal de vida, que ele voltasse a superfície - não pode fazer isso com a gente agora, não pode! - me exaltei.

- Não estamos vendo mais o homem... Espera...- um movimento na água se fez, até que, com os cabelos totalmente molhados e visivelmente necessitado de ar Harry emergiu- Ele está vivo!

Graças a Deus! É isso aí garoto! - as vozes se elevaram nas mesas, gritei junto com eles, todos na mesma energia e expectativa com fim daquilo tudo.

                             ...

- Harry está bem?!- O delegado gritou com o megafone de cima da ponte.

A água estava incrivelmente fria, meu peito subia e descia a procura de oxigênio para respirar, tirei o cabelo dos olhos a procura de onde estava o carro vermelho.

Não estava muito longe - Estou! Preciso que iluminem o carro!

Lá de cima ele não entendia o que eu falava, pude ouvir um berro pedindo silêncio para os policiais, repeti novamente - O CARRO! PRECISO DE ILUMINAÇÃO ENTENDEU!?

- OKAY! VOU ARRUMAR ALGUMA COISA!

Nadei em direção ao automóvel quase todo coberto, e a cada braçada que eu dava, percebi que uma luz forte me seguia, olhei para cima e vi o helicóptero, claro a mídia, fiz um sinal de positivo e apontei para onde queria chegar, não sei se tinham entendido o recado mas a iluminação estava ajudando então só prossegui.

Cheguei no carro finalmente, peguei a maior parte de ar possível e mergulhei.

Estava complicado ver debaixo d'água mas não era impossível, nadei em direção ao vidro e pude ver, no banco de trás desesperada, Alana.

Bati no vidro pra que me visse, ela chegou o mais perto que conseguiu colocando a mão na maçaneta e puxando, a porta não se abria.

Sua testa e nariz sangravam, provavelmente por conta do impacto da batida. No banco da frente pude ver Niall desmaiado e... Denis?? O que ele estava fazendo aqui? Por um momento me perdi do propósito, voltei minha atenção a Alana.

- humm, hummm!- ela batia no vidro, o cabelo flutuava na água que já tinha chegado ao teto, Alana balançou a cabeça negativamente, indicando que não aguentaria mais.

Meu corpo também já pedia para voltar, tentei então chutar o vidro, uma, duas, até que na terceira vez ele começou a trincar, me segurava no carro sem jeito que se afundava cada vez mais, não aguentaria, voltei para que a garota me visse.

Como nos dias que estava com sono e a colocava pra dormir, Alana me olhava piscando devagar, distante, era um sinal de perca de consciência, não, não! Pensei, bati a mão na janela a chamando atenção, mas foi em vão.

Com boca já aberta, as bolhas com o último oxigênio que guardava sairam dela, meu coração apertou vendo que estava perdendo por entre meus dedos sua vida, NÃO!

Voltei pra superfície, contei até três e voltei novamente pra debaixo d'água, segurei aonde podia na parte superior e comecei a chutar.

Quatro, cinco, seis vezes e ele quebrou, com o pé tentei tirar os pedaços maiores pra poder passar por ele, entrei pela janela e pegando pelos braços saímos pelo mesmo lugar.

Nadei nos levando para fora da água, e quando consegui finalmente soltar o ar, chamei seu nome:

- Alana! Alana!- Não me respondia, boiando levei ela até o barranco onde havia terra as margens do rio.

Quando minhas pernas conseguiam pisar em barro enfim, a peguei no colo e levei ao local mais seco possível, minha camisa social estava manchada de vermelho, talvez tivesse me cortado no vidro mas aquilo pouco importava.

  Repousei seu corpo mole no chão, com os dois dedos chequei a pulsação abaixo da mandíbula no pescoço, ainda tinha batimentos, muito fracos mas estavam alí resistindo, comecei a massagem cardíaca.

Nos treinamentos de primeiros socorros, uma das coisas que ensinavam pra gente era manter a calma e persistir, que talvez o nosso cansaço poderia ser a última esperança pra sobrevivência de alguém, e aquilo nunca fez tanto sentido pra mim.

Salvar a vida de alguém é uma coisa, salvar a vida de quem você ama e convive é completamente diferente, você não tem a opção desistir ou não aguento mais, vai ter que fazer, e continuar, persistir, sem pausa.

Era o que fazia, minhas mãos davam impulso no peito de Alana, uma, duas, três, vinte, até parar e fazer respiração boca-a-boca - Alana! Alana?!- seu corpo continuou sem reação.

Voltei a massagem, e a cada vez que minhas mãos a pressionavam, meu coração gritava pra que o dela reagisse- Vamos! Você não pode me deixar agora, não agora Alana.

- Harry! Como ela está?!- Senhor Patrick gritou da ponte, e meu Deus, eu não conseguiria dar a pior notícia pra um homem que acabou de perder a esposa, não conseguiria e não era uma opção pra mim deixá-la partir.

Não respondi a pergunta, sem parar com o que fazia, reparei que os botes com os bombeiros chegavam do outro lado do rio, a luz do helicóptero ainda nos iluminava, tão forte, que por um momento jurei que o dia estivesse amanhecendo, me enganei.

- 34, 35, 36 - parei a contagem pra fazer a respiração novamente- Alana? Alana?!- sem resposta, meus olhos já marejados derrubaram as lágrimas mais doloridas da minha vida, mas não parei- vamos meu amor! Eu preciso de você comigo! Está me ouvindo? Eu prometi que não te deixaria e vou cumprir - reiniciei a contagem aos prantos - 1!, 2!...

E quando eu pensei que o chão abaixo de mim desabaria sem aviso prévio, ela tossiu.

- Alana! - E pude ouvir lá de cima os gritos de alívio, se engasgava com a água que botava pra fora, virei ela de lado para ajudar - Ah graças a Deus, graças a Deus - chorei aliviado.

Cof! Cof!- tossia, até que conseguiu puxar oxigênio, ainda desnorteada ela não conseguia abrir os olhos direito por conta da luz forte - Aonde... Cadê.

- Shiii, poupe as energias - limpei as lágrimas no rosto - fique parada, vamos cuidar de você, eu vou cuidar como já fazia...- tirei o cabelo da face parcialmente ensanguentada- eu te amo tanto... Meu Deus obrigado.

O bote finalmente tinha atravessado as águas que nos separavam, desceram e imobilizaram fazendo o que era necessário. Agora mais aliviado, pude observar os restantes dos bombeiros atendendo Niall e Denis, que até agora não entendia qual o seu envolvimento nisso tudo.

Um saco preto foi colocado sobre um deles, e pelo cabelo identifiquei, era Niall, estava morto.

...

Meu enfermeiro inesperadoOnde histórias criam vida. Descubra agora