Convite recusado

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Laura

Tom veio me receber na porta do edifício me apresentando a agenda do dia. Me informou que já tinha encomendado meu almoço e logo seria servido em minha sala.  Após a alimentação, estava com três reuniões  programadas e previsão de término por volta das dezoito horas.

Adentrei meu empreendimento cumprimentando a todos, como sempre faço. Procuro tratar todos os meus colaboradores da forma que eu gostaria de ser tratada, mas ainda assim, não entendo o motivo de me olharem como seu eu fosse superior a eles. A postura que adotei devido o ramo que escolhi trabalhar, tem que ser de seriedade e uma certa firmeza, mas isso não impede que a boa educação vá a frente de tudo.

Meu pai sempre me falou: Filha, tem coisas que o dinheiro não compra! O modo como você trata as pessoas, diz muito sobre quem você é! - e se tem algo que me irrita, é encontrar pessoas que tratam outras com desprezo e falta de educação.

- Já não te falei para limpar esse espelho direito? Veja essas marcas de dedos!! Limpe novamente até que seja possível enxergar a sua alma!! - ouvi essas palavras vindas em alto tom do final do corredor que dava para o pavilhão superior e era composto de paredes revestidas por vidros espelhados.

Estranhei o tom ouvido e ao invés de subir para minha sala, segui de onde vinha o som. Tom me acompanhava, seguindo meus passos que devido o salto agulha escolhido pela Didi, ecoavam pelo salão de entrada.

Ao chegar no local, contemplei uma senhora negra, de aproximadamente cinquenta anos, expressão sofrida e os cabelos já branqueando, vestida com o uniforme da equipe responsável pela limpeza do nosso complexo, esfregando vigorosamente o espelho da fachada e ao lado dela, uma jovem senhora branca, de aproximadamente trinta anos, vestida igualmente e com expressão furiosa, observando a senhora limpar.

- Bom dia senhoras! - disse me dirigindo a elas.

- B- Bom dia senhorita Veiga! - me respondeu a mais jovem me olhando com espanto.

- Bom dia! - respondeu a de mais idade, meneando a cabeça em sinal de cumprimento e logo baixou os olhos para o chão.

Não pude evitar me lembrar mais uma vez da minha mãe. Ela e minha avó trabalharam de faxineiras na casa dos patrões a vida inteira. Eu a acompanhava sempre que podia, e o que ela mais repetia pra mim era: Não olhe diretamente para os patrões. Responda educadamente e olhe sempre pra baixo. Para nós - e esfregava o dedo sobre o braço apontando a linda cor de ébano que a  cobria - é reservado apenas obedecer e não conversar.
E assim aprendi que educação e valores são ensinamentos valiosíssimos que dinheiro, raça e classe social não é possível comprar.

- Gostaria de saber o que está acontecendo aqui?! Estava entrando e ouvi vozes altas vindas dessa direção, me preocupei. Está tudo bem? - perguntei para as duas.

- Está sim senhorita. Só estava ensinando a dona Chica a limpar o espelho. Ela não tem costume com esse tipo de limpeza - respondeu a mais nova com um certo desdém.

- Como é seu nome, querida? - perguntei a ela

- É Lurdes, dona Laura - e sorriu sem vontade

- Certo, Lurdes! Talvez ninguém tenha te comunicado, mas aqui - e apontei o dedo indicador para o cima, fazendo um círculo com a ponta de modo a explicitar todo o prédio - temos por hábito tratar as pessoas com respeito e educação. Faz parte dos requisitos básicos para participar da nossa equipe.

- Sim senhora.

- Senhorita, por favor!

- Senhorita. Desculpa - ela respirou e continuou - é que a dona Chica não está fazendo o serviço adequadamente, não esfrega direito esse espelho e veja só como fica sujo - se dirigiu até onde a senhora acabara de passar o pano seco e alisou com o dedo indicador, deixando marcas.

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