Morador de Rua

737 72 96
                                    

Laura

Subimos para o décimo andar e o elevador me causou náuseas. Participar de uma reunião nesse momento, era a última coisa que queria ou poderia fazer. Estava absolutamente sem condições e tinha plena ciência disso. Ao entrar na sala, os três maiores investidores da minha empresa, me esperavam, sentados à mesa, com expressões fechadas, diferente do costume.

- Bom dia senhores - os cumprimentei cordialmente - Sejam mais uma vez, bem vindos ao Complexo Veigas.

Responderam secamente bom dia, no entanto, quase fiquei desnuda com os olhares para meu corpo. Mesmo estando levemente alcoolizada, foi possível sentir os olhares, que me causaram repulsa.

- Dêem-me licença, estou com uma dor de cabeça terrível, vou pegar uma água - falei, dirigindo ao frigobar da sala, antes de juntar-me a eles na mesa.

Precisava esconder meu hálito de álcool e justificar meu olho pesado. Sentei na cadeira à ponta da mesa, eles me olhavam atentamente, aguardando o começo da reunião. Tom permaneceu em pé, próximo à porta, atento ao tablet e, minha mente, continuava presa no episódio de hora atrás.

- Bem senhores, podemos começar? - dei início à reunião.

- Rrr - limpou a garganta o senhor Virgílio - Senhorita Laura Veigas, nosso encontro será breve, para não lhe roubar o tempo.

Senhor Virgílio, é um dos mais antigos acionistas das empresas Veigas. Descendente de uma família muito antiga de São Paulo, detém hoje, praticamente 30% de todas as ações das minhas empresas.

- Fica à vontade, senhor Virgílio - falei cordialmente - Não se preocupe com o tempo.

Os outros dois, sr. Boaventura e sr. Penhour, mantiveram-se quietos e com expressão insípida, com as mãos cruzadas, apoiadas sobre a mesa.

- Pois bem, senhorita, como já investimos a tanto tempo nas suas empresas, achamos de bom tom, marcarmos essa reunião para comunicar nossas próximas ações.

- Sim, pois não - franzi o cenho ao falar, tentando me concentrar o máximo que conseguia.

- Viemos te anunciar, que, a partir de hoje, não investiremos mais em suas empresas e queremos os valores corrigidos das nossas ações.

Ouvi aquela declaração com tanta incredulidade, como se aparecesse no mesmo momento, uma nuvem de algodão doce à minha frente. Não podia acreditar ser verdade.

- Não entendi, senhor - dei de ombros - Por qual motivo, fariam isso?

- Senhorita Laura - tomou a palavra, o sr Boaventura - Nós somos homens de família e tradicionalmente, de bons costumes. Somos cidadãos de bem e honramos pelos valores da família, acima de tudo. Não podemos compactuar com certas, modernidades.

Passei a entender menos ainda, após essa fala, do segundo maior acionista.

- Senhores - tentei manter a pose, falando segura - Eu definitivamente não faço ideia do que estão falando. Eu também sou uma pessoa que, acima de tudo, prezo pela família. Perdi a minha muito cedo, mas fui acolhida por minha tia e..

Bateram à porta e Tom, prontamente a abriu. Ouviu em cochicho algum recado de quem entregara um envelope. Fechou a porta e dirigiu-se a mim, entregando-me o pacote.

- Perdoem-me. Como falava, fui adotada pela minha tia, irmã do meu pai e - abri o envelope enquanto falava - pude receber toda a educação como - meu coração disparou e meus olhos arregalaram-se ao abrir o folder que tirei do envelope - Só um minuto, senhores.

No folder, tamanho a3, impresso em alta qualidade, estava uma foto da minha casa, tirada do alto, com zoom óptico. Na fotografia, eu e Alice nos amando no sofá da minha sala. Em cima da foto, escrito com letras garrafais: EU TE AVISEI, VOCÊ NÃO ME OUVIU. SE PREPARE, ESSE É SÓ O COMEÇO. VOU TIRAR TU-DO DE VOCÊ!

AmorasOnde histórias criam vida. Descubra agora