Capítulo Doze

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Deixamos as portas da biblioteca para trás indo em direção mais uma vez da praça central. O ser do qual ainda desconheço o nome nos leva até a fonte da praça e ali se senta.

— Por onde começo. — Ele olha para cima e desliza a mão pelo cabelo negro.

— Pelo começo seria bom. — Estella diz rindo. Ele a fita com um olhar de reprovação a piada. — Ok, me desculpe. — Ela pigarreia.

— Eu e Áster sempre fomos bons amigos. Uriel era o único que me deixava vê-la. Mesmo sendo uma grande porcentagem anjo, ainda assim sou visto com maus olhos nos céus, como sempre, anjos sendo arrogantes, nada mudou. Mas continuando, quando tínhamos doze anos o rei Tyr declarou guerra aos demônios sem razão aparentemente, por pura bestialidade, sempre achara que os anjos eram os místicos superiores, que deveriam dominar sobre todos os outros ao invés de coexistir em paz. As tropas angelicais se dirigiram ao vale de Mavka onde o combate aconteceria, os demônios por outro lado armaram uma emboscada pegando-os de surpresa. Tyr tentou contornar a situação mas era tarde demais, Abbadon já havia tomado o controle. Naquele dia duas legiões dos nossos foram mortos juntamente com o irracional rei Tyr. Áster ficou devastada com a notícia, por pior que ele fosse para os anjos ainda era seu pai. Ela deveria assumir o trono a partir daquele momento, mas ainda era muito nova, não conseguiria tomar conta de toda uma nação, principalmente dos problemáticos anjos. Então foi decidido que o arcanjo mais confiável do reino seria responsável de governar até que Áster atingisse uma idade razoavelmente boa para ser rainha. Uriel foi o escolhido, ele era o mais próximo que o falecido rei tinha de um amigo, e assim foi, Uriel governou durante seis longos anos e nesse tempo os anjos viveram em paz com todos os reinos. Áster até se tornou grande amiga de uma demoníaca chamada Lilith, as duas estavam sempre juntas, e quando eu ia até os céus sempre estávamos juntos. Os anos se passaram e Áster atingiu a idade esperada, a coroação chegou e ela se tornou rainha, a festa foi grande e ela e Lilith desapareceram no meio da multidão para tentarem ter algum tempo a sós, alguns anjos viram isso e não ficaram muito felizes, mas nada foi feito a respeito. A paz reinou mais quatro anos, até que inesperadamente um grupo de demônios invadiu os céus, a guerra foi árdua, as tropas estavam despreparadas e uma coisa chamou a atenção, eles não estavam em busca de destruir os moradores ou nossas bases, estavam atrás de duas únicas coisas: Áster e a pedra vermelha. A rainha lutou bravamente junto com seus soldados e Lilith se virou contra sua espécie para nos ajudar. Entretanto um demônio chamado Samael conseguiu atingir a nossa pedra central com algum poder demoníaco desconhecido, ela se despedaçou por completo quase se reduzindo a pó. Nesse momento todos anjos perderam suas forças, menos Áster, ela ainda emanava poder. Eu como híbrido ainda tinha parte de meu poder, meu lado élfico ainda era forte o bastante para continuar lutando, tentei dar cobertura a Áster mas fui preso em uma armadilha temporal, assim como todos os outros habitantes do céu. Quando voltamos ao normal Áster e Lilith haviam desaparecido e o reino estava em frangalhos. Fui em busca de Uriel para ver o que faríamos mas ele também havia sumido, a partir daí o reino angelical passou por um momento de desespero, estávamos sem nossa pedra central, sem poderes, indefesos. Com alguns esforços recuperamos parte de nossa pedra central, usamos nossos poderes mesmo que debilitados para atacar os demônios por uma última vez. Destruímos totalmente sua pedra central, deixando-os desamparados, sem qualquer resquício de poder único que um dia tiveram.

Estella e eu escutamos boquiabertas, e consigo sentir genuína verdade nele, não está mentindo. Ele mencionou Uriel. Quero pergunta-lo quem ele era, mas não sei se posso confiar nele ainda, então me contenho.

— Não faz ideia de onde Áster está não é mesmo?

— Não, não faço. — Ele diz derramando lágrimas.

— Não cogita a hipótese delas terem ido embora por vontade própria? Viram que os seus reinos estavam perdidos e resolveram fugir juntas? — Estella indaga.

— Elas nunca fariam isso, nunca fugiriam. Não sem mim. — Ele abaixa a voz.

— É uma possibilidade a ser cogitada. — Ela continua.

— Não, não é. Eu as conhecia e elas nunca fariam isso.

— Talvez não as conhecesse tão bem quanto pensa. Todo mundo é capaz de nos surpreender, ninguém conhece ninguém.

— Não ouse dizer que eu não as conhecia tão bem, você nem ao menos as conheceu, não pode opinar em nada. — Ele diz apontando o dedo no rosto de Estella.

— Tudo bem.

— Me desculpe, eu só sinto falta delas. Foi a quase trezentos e cinco anos, e eu ainda sinto falta delas como se tivesse sido ontem.

— Elas sumiram juntas e te deixaram, vocês eram algum tipo de casal?

— Não. — Ele diz rindo. — Eu não pelo menos. Mas elas, bem, elas sim, estavam juntas.

— Isso não é proibido? Duas espécies diferentes da realeza?

— Sim, mas elas não se importavam com isso, se amavam, com o amor mais genuíno que meus olhos já viram até hoje.

— Ninguém sabia?

— Ninguém além de mim, ou se não elas poderiam ser...

— Mortas. — Completo a frase.

— Sim.

— Não pensa que alguém pode ter descoberto e dado um jeito em ambas?

— Não seria possível, elas eram cautelosas, nunca seriam descobertas. Não como amantes.

— Mas devemos pensar sobre isso, não sabemos a verdade, é possível. — Estella diz.

— Mas por que decidiu nos contar toda essa história? — Pergunto.

— Eu vi o dia em que chegaram, vi você. — Diz apontando para mim. — Você é como ela, você emana poder. As chamas sem um fio de cabelo queimado, você é como ela, talvez possa encontrá-la. — Um raio de esperança surge nos olhos do híbrido e uma dor percorre meu coração como se uma espada o cortasse.

— Não sei se poderei ajudar.

— Você é minha última esperança, por favor, pode ao menos tentar?

— Posso tentar. — Digo receosa.

— Obrigada. — Ele me abraça e sussurra. — Muito prazer, Meliorne.

Não faço ideia de como ajudar mas quero tentar. Se eu realmente sou como ela, talvez, quem sabe, se tiver muita sorte, ela tenha as respostas de que tanto preciso.

Seis Mundos: Novas OrigensOnde histórias criam vida. Descubra agora