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O vestido apertava meu corpo, o cabelo preso estava me incomodando, o salto estava latejando meus pés, e a cada batida que meu coração dava, fazia com que eu quisesse gritar.

Foi assim que eu compareci ao jantar que se sucediu um dia depois da minha última surra, na casa do meu tio.

— você está linda, Eva — meu tio me saldou. E enquanto eu o olhava com um sorriso minimalista, que me custou dor, eu me perguntava o porque dele ter vinte e nove anos e meu pai quarenta e cinco. O porque dele ser o meu tio e não pai, eu queria tanto que meu tio fosse meu pai,  queria com todas as minhas forças aquilo. — você quer ir para a biblioteca lá encima?

Mas nunca falaria, mesmo que isso estivesse óbvio em algumas situações.

— obrigada, tio — minha voz saiu em um susurro, devido as poucas falas que eu disse nessas pouco mais de quarenta e seis horas que se seguiram. — obrigada...

Quando eu estava prestes a virar meus calcanhares para subir as escadas marrons brilhantes, meu pai e mãe apareceram em meu campo de visão, fazendo com que eu estremecesse  imediatamente.

— para onde vai, Eva querida? — minha mãe perguntou, com um sorriso doce nos lábios. A encarei tentando suprimir a minha dor.

— eu estava indo ao tolete, mamãe — falei, olhando para baixo. Desejando mais que tudo que eles me deixassem sair dali, para que eu pudesse desabar e voltar para o meu posto novamente.

Eu era boa nisso.

Sempre fui.

— é claro que sim, querida — meu pai falou, recebendo um aceno de cabeça da minha mãe, também em concordância. Meu tio encarava tudo boqueaberto e eu fiquei feliz por ele não ter falado nada.

— fique o tempo que precisar — disse, dois minutos depois que eu entrei no banheiro, soluçando alto no segundo andar — eu resolvo o resto.

Eu sabia que, por mais que tentasse, meu tio não iria conseguir resolver o que quer que estivesse acontecendo.

E ele também sabia.

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