Albatrozes ou Abutres

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A cadeira de Axel foi ao chão junto com ele. Agnes se levantou, assustada. Dante fechou os punhos.

O homem no chão esfregou a mandíbula, sorrindo de canto. Os cabelos grisalhos caindo sobre o rosto. Asmus ainda estava de pé, com o punho fechado e o rosto realmente, realmente, transtornado.

Ele entendía porque aquele lugar nunca fora um lar para Shivani. Porque era um covil, onde os Albatrozes se banqueteavam dos fracos. Axel Adonis mordeu os lábios, mesmo a tentativa dele de se vitimizar ainda era predatória.

- Não sei dizer se era isso que você queria ter feito anos atrás quando deixei você fugir, ou é isso que ela te mandou fazer quando eu passasse dos limites.

- Fiz isso para evitar afundar seu crânio na mesa, seu filho da puta.

Ele riu seus olhos deslizando para a "filha da puta" no sentido literal sentada a mesa.

Ele queria matá-lo. Deixá-lo quebrado como um brinquedo velho ali mesmo. Entre as piadinhas e os monólogos Axel Adonis era sorrateiro, as palavras dele caminhavam até o fundo da mente, elas colocavam ideias, lembranças, conselhos leves como plumas passando nas orelhas. A voz leve e o sorriso, não eram muito diferentes do que Asmus costumava usar. Ele fazia os pensamentos dos outros parecerem lentos em relação aos dele próprios.

- Ajude-o. - Shivani mandou. E Asmus arfou devagar. Ele foi ao outro lado da mesa e algo eletrizante o percorreu quando Axel Adonis tomou sua mão.

Num impulso para cima, o homem sussurrou no ouvido dele por alguns segundos.

- Não quero machucá-la, ao contrário do que você pensa. Ela consegue fazer isso por si mesma. Eu quero que ela volte para mim.

- Asmus, senta. - Ela chamou.

Axel o deixou e se sentou e Asmus voltou engessado até estar de novo ao lado da pirata. O que Axel quería dizer?

Ele não queria estragar aquilo, afinal, para Shivani, cada palavra, cada movimento, cada mordida, era uma arma no campo de batalha. Ele era um de seus soldados e o que ele fazia a enfraquecia. Mas ele não podia...

- Seu cão do mar, você deveria ter modos ao comer com...

- Dante. - Censurou o pai parando o próprio soldadinho de papel. O mafioso tirou algum pó imaginário das roupas, colocou a cadeira no lugar e arrumou os cabelos. - Não vamos fingir que eu não mereço essa. Eu quero um jantar pacífico. Mas não vou me abster de tocar em assuntos sensíveis entre nós, meu pequeno albatroz. - Vamos esquecer o que acabou de acontecer. Esse jantar começa agora. Não precisamos nos alarmar.

A risada charmosa dele fez a tensão se desfazer aos poucos. Era bizarro, aquela inversão de papéis, o sorriso no rosto de Axel e o ódio no de Asmus. Um dos serventes começou a tocar piano em algum lugar da casa.

Asmus não sabia se seria capaz de ficar até o final do jantar. Ele não era um homem violento. Não era o primeiro instinto na maioria das vezes. Mas o olhar dissimulado do anfitrião pedia por um par de hematomas. O monstro não entendia como Shivani conseguia olhar para o rosto do pai e comer.

- Acho que falar de mim suscita alguns ânimos. - A pirata sibilou. - Me fale de você, dos últimos anos...

- Venho trabalhando. Conseguindo aumentar minha influência. Fazendo a economia crescer. É o que eu faço. - Ele tinha voltado a comer. Os criados trouxeram o prato principal a pouco tempo. Codorna, ovos, molho. O que era bom pois Asmus estava cansado de peixe. - A verdade é... Você me conhece. Eu gosto de dobrar o mundo ao peso da minha vontade. E o mundo dobra. Quem você mais ama pode se tornar o cão de outro e quem você mais odeia é sangue e amor de alguém.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora