Um Bom Homem

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A espada caiu no colchão pesadamente. Reinier sorriu. Shivani não estendeu a mão para pegá-la, ela não tinha medo daquele homem.

- Eu não sou um homem mau. Sou justo e quero que você seja justa comigo, Shivani. - Ser justa com ele? O homem que destruiu sua Ilha, matou centenas dos seus amigos, colocou sereias para caçá-la e destruiu seu navio? Ela bufou. - Não sou o tipo que faz ameaças e tenho a sensação que você também não é. Preferimos uma boa e velha... troca.

O que ele tinha a dar que pudesse interessá-la? Nada a não ser a própria vida para que ela pudesse levar o anel de governador para Axel Adonis e receber seu navio. Ela não faria acordo algum com aquele homem, nem para salvar a própria vida.

- Eu sei o que você quer. Mas antes de chegarmos a isso, preciso explicar porque a manti viva. Não é apenas por causa das histórias e da minha curiosidade. - Ele ainda girava o frasco com o mapa nos dedos. Aquilo a deixava nervosa. Ele poderia usar aquilo contra ela? Era aquilo que ele achava que ela queria? - Durante uma cerimônia, eu tenho um pequeno vislumbre dos devotos. Meu deus me mostra pequenas partes da fortuna futura e, às vezes, do passado. No seu futuro, eu vi algo... alguém, que eu preciso encontrar. - Ele parou, como se congelado no tempo, seus olhos da cor do mar profundo perdidos em algum lugar. - Não é segredo nenhum que após aqueles que vieram antes de mim unificarem o continente, eu desejo conquistar os arquipélagos da Ásia.

Ele se levantou, passeando pelo quarto. Shivani não podia dizer que estava surpresa, a Ásia era um paraíso de piratas e samurais, um território vasto e rico, com centenas de ilhas. Reinier pegou um livro em uma cômoda.

- Na verdade, como já disse na noite anterior, a caça aos piratas é nula de minha parte. Toda a minha frota vem se preparando há muito tempo para a invasão das cinquenta ilhas mais próximas. - Ele ergueu uma sobrancelha com um sorriso. - Não me olhe assim, você não é melhor que eu bombardeando meus portos. - Ele voltou o rosto para o livro, o sorriso desaparecendo. - Quando você governa um território grande o bastante para ser chamado de "Continente" você precisa provar ser capaz. Precisa se mostrar à altura. É solitário. A política é uma baía de tubarões. Você não pode sangrar. Tudo o que pode fazer é conquistar e crescer. E é tudo o que eu devo ter fazer.

Shivani entendia. Ela sabia bem como uma tripulação poderia ser pior do que tubarões famintos. Ela mesma tinha mordido o próprio Capitão e arrancado um pedaço dele. Mas ela não estava interessada em ajudar Reinier de forma alguma. Não tinha pena dele, nem simpatizava.

Era difícil acreditar que ele não mandou Zain e as sereias atrás dela. Se ele não o fez...

- Axel Adonis vem sendo uma pedra no meu caminho. Quando eu imaginei que estávamos em bons termos por causa do casamento... - Ele pôs os dedos entre os olhos, suspirando. - Não vou matá-lo porque é útil, é um bom comerciante e um bom líder, péssimo homem mas bom político. Ele sabe que eu quero aquelas terras, é por isso que mandou você aqui. Provavelmente ele tem arquitetado... Mandando as tropas, instigando os piratas, fazendo vocês me odiarem quando na verdade eu não tive nenhum dedo nisso. - Ela olhou em volta, trancando o maxilar. - Eu espero... - Ele hesitou. - Eu espero que Raquel não seja outra artimanha dele.

Reinier parecia realmente acreditar na união entre ele e Agnes. Ela não teve coragem de lhe dizer que a garota estava ali para criar um escândalo, mesmo que os planos do pai já estivessem frustrados. E ela não poderia de qualquer maneira, afagou o pescoço pensando.

- De qualquer maneira, - Ele retornou os pensamentos, abrindo o livro na cama, de forma que ela pudesse ver. Ela arregalou os olhos, a silhueta conhecida na ilustração. - Há algum tempo, os profetas me revelaram que não vou ter êxito em meu governo se não oferecer um coração específico para o templo. Deve ser um maculado, nada de virgens ou crianças. Simplesmente a pior alma humana. - Shivani passou os dedos pelas páginas, incapaz de falar uma palavra, ela sentia a agonia se esgueirando sob sua pele. - Que alma humana pode ser a pior de todas senão uma alma que condena os outros eternamente?

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora