Sonhos e Sereias

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Agnes

As instalações dos piratas não eram as melhores, mas eram melhores do que a cela. As pequenas divisórias deixavam as coisas menos invasivas, principalmente agora com estranhos no navio, era melhor do que a fábrica ao menos, ela pouco se lembrava de dormir.

Ela escutou a canção no início da noite. Arrepiante e mortal, como nenhum mortal ouvia. Aflição e incredulidade a tocavam sempre que ela lembrava que não era mais mortal.

Ela viu uma sereia de cabelos escuros e levemente azulados. Seus olhos eram dois espelhos para o vazio, um tunel de ódio. Ela nadava enquanto sua voz encantava todo o oceano, a sua volta mais sereias do que se poderia contar cortavam as águas com risadas malignas e sedutoras. Ao lado delas, uma espécie diferente, como a que atacou Shivani no lago. Coisas horrendas ao lado de coisas belas, todas as coisas cruéis.

Então Agnes viu os navios acima delas. Voando no alto do céu, soltando fumaça como nuvens, os gritos dos corsários eram determinados se mesclando com o som melódico das sereias. Eles eram como um exército caçador, determinados e incansáveis.

Agnes sentiu as costas se arquearem com o terror que a atingiu, ela sentiu suas escamas voltarem e a voz dizer no fundo de sua mente:

- Junte-se a nós. - Aquilo cantou em seus sonhos. - Nós a vingaremos, ou a devoraremos.

Agnes sentiu o ar fugir de seus pulmões enquanto o pânico de alastrava, a voz lhe envolvia como uma nuvem de fumaça. Ela parecia sufocar. Parecia estar debaixo d'água sem guelras. Parecia ser afogada. A visão mudou sem mais nem menos. Acabando com o sentimento. As ombreiras de ouro a sua frente eram as mesmas que ela vislumbrara meses antes. O lugar feito de ferro sólido, as botas de aço cirúrgico, os cabelos penteados para o lado, negros como a escuridão. Ela não poderia não reconhecer a mansão, ouo homem.

- Não seja tolo. É um acordo simples. - A mesma voz melódica do outro sonho rosnou. - Mangata está ameaçada como meu ninho esteve. Você sabe que eu estou certa, Reinier.

O Ditador se virou e Agnes percebeu que estava vendo pelos olhos da sereia. Ela tentou se mover, assustada, mas não tinha vontade naquele corpo. Era apenas uma visão do passado.

Ele marchou até ela, o rosto endurecido, ele ergueu uma mão e Agnes estremeceu para apenas sentí-la descansar sobre o seu ombro. Ele suspirou com um leve sorriso.

- Não sou um dos marujos que voltam para você até os ossos, Eris, eu sou sensato. Foi assim que cheguei à minha posição. - Agnes observou o rosto dele. O homem com quem se casaria, de quem ela fugiu e para quem voltaria se pudesse. Agora tudo parecia muito distante. Ele aceitaria uma esposa com escamas, garras e caninos? Ele era bonito, tinha olhos verdes e lábios que pareciam ter se acostumado a sorrir, um rosto anguloso e sobrancelhas cheias, que naquele momento estavam franzidas e sérias. - É por isso que você vai fazer o que eu mando e não o contrário. Você faz parte do novo mundo e não os piratas.

Ela teve a sensação de que uma noiva perdida era a menor de suas preocupações.

- Nossos portos foram bombardeados, nossos navios foram derrubados dos céus, nossas reservas estão morrendo e os malditos piratas estão prontos para o fim de Mangata. Não apenas eles, Adonis está no meu calcanhar até a última conspiração. - Ele colocou a outra mão no ombro dela, fechando todo o espaço. Expansivo e ameaçador mesmo com uma postura calma. - Tudo sobre o meu controle. Seu reino caiu mas o meu não ruirá. Traga suas sereias e eu as abrigarei, ou faça qualquer coisa sem a minha permissão e...

Ela se encolheu.

- Não é apenas uma ameaça. Libere seus homens e os dê a mim. Não vamos esperar mais. - Eris pediu.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora