O Arcanjo

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Olaáaaaaa!
Ontem foi meu aniversário então aqui está um capítulo diferente pra vocês:

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Debaixo da superfície. Fundo. Mais fundo que você pode imaginar. Mais fundo do que qualquer mente pode prever.

Onde a luz do sol já não alcança e onde os peixes já não podem enxergar, as criaturas mais demoníacas que até os deuses duvidam existir rastejam.

Lá embaixo o monstro das lendas mascava a madeira mais preciosa do mundo. Aquela madeira, já apodrecendo pelo sal e pela pressão, já havia feito parte do navio mais potente dos nove mares. Havia sido um monumento que havia cruzado o mundo, rasgado as águas e confrontado navios nos céus. Havia explorado, saqueado e se tornado um totém de terror para o mundo, e para alguns, de esperança.

Lá em cima, onde o Sol já havia deixado de brilhar e as nuvens não ameaçavam aparecer no céu, onde o frio se alimentava da noite, tão longe da costa que os pássaros não ousavam desbravar e onde havia acontecido a última grande batalha do Arcanjo, um navio singelo repousava pouco acima da água.

Na proa, estava um homem que não era um homem.

- Quase posso vê-lo. Lá embaixo.

O outro ao seu lado concordou, sem acreditar. Continuou escutando, com os olhos na batucada dos anéis contra o metal.

- Isso me tomou muito mais do que eu imaginei que tomaria. - Ele sorriu, murmurando. - Mas ainda assim, prefiro que seja ele lá do que eu, atado como uma estátua. - Ele ria, mas a boca se curvou levemente para baixo. - É melhor apressar as coisas. Ou em breve seremos nós dois apodrecendo lá embaixo.

- Tudo está correndo bem, ainda dentro do planejado. - Murmurou o outro homem.

O batuque parou.

- Quando se adota um cão... - Ele começou com a voz sombria. Seus olhos tinham um leve brilho azul, mas não se podia dizer se era apenas o reflexo da água e da lua. - Não se planeja que ele vá morder o dono.

A névoa lambeu o casco do navio. Um sopro gelado.

- Está no passado. - Sorriu gentilmente.

Ele se inclinou contra a borda, como se fosse contar um segredo ao mar. Deixou que uma moeda caísse.

- Tudo o mar dá, tudo o mar recebe. Tudo o mar sabe, nada o mar deve. - Entoou. - Tudo o mar quer. Tudo o mar é. Tudo o mar tira, nada o mar perde. E o que ele revolve; ele devolve.

As águas se tornaram revoltas. Pequenas ondas girando abaixo do casco voador do navio. Criando mais e mais espuma. Se tornavam grandes ondas. Cada vez maiores.

- Está vindo. - Disseram os homens.

As águas pareciam gemer. Não era feitio do mar devolver o que ele toma. Mas ele fazia exceções.

O deus da fortuna emergiu, nu e cheio de jóias. A estátua foi seguida pela proa, intacta. Polida. As velas, agora negras, encharcadas. Os mastros antes quebrados, restituídos. A meia-nau, a popa. Tudo estava em seu devido lugar.

O mar cuspiu o Arcanjo com esplendor.

- Olá, meu bom amigo. - O homem alisou seu mastro de onde estava. Cheirava a sal. Saltou do navio no ar, sentindo a madeira firme sob seus pés. - Tirado do seu túmulo molhado. Ninguém te deixa descansar em paz, não é? - Ele riu, pensando no significado das palavras.

Ele tocou o leme com leveza, depois segurou-o com as duas mãos.

O Arcanjo estava de volta. Era bom que estivesse.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora