Luas

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Tarde da noite Aramis e Asmus estavam no quarto. O Sanrrokah não apareceu o dia todo e eles estavam cansados de explorar o templo.

Aramis jogava um dado de um lado par ao outro, dançando com ele entre os dedos.

- Você podia pegar algo para nós na cozinha. Estou ficando com fome. - Ele disse sem olhar para o irmão. Geralmente, era Aramis que encontrava algo para comerem, ele nunca dizia que tinha fome. Então Asmus levantou e deixou o quarto o mais rápido que pode.

Ele se esgueirou até os fundos do templo, guiado pelos fogos fátuos dos corredores, onde uma grande instalação branca em hexágono fazia rodopiar fumaça e cheiros deliciosos no ar. Ele conseguia ouvir as pessoas conversando lá dentro, ainda que tarde da noite.

Abriu a porta devagar, não queria ser notado. No momento em que colocou os pés na cozinha várias cabeças se viraram em sua direção e todos se calaram.

As donzelas acólitas apressaram as crianças pelas portas pedindo desculpas, deixando massas descansando e panelas no fogo. Quando ele percebeu, estava sozinho. Se remexeu inquieto e um pouco envergonhado. Ele estava com um cheiro ruim? Tinha tomado banho cedo de manhã.

- Não se preocupe. - Pediu uma voz perto da janela. - Eles apenas ainda não confiam em você.

Asmus o viu. Mangas tão longas que tocavam no chão. Cintilantes botões em prata e roupas coloridas em verde e vermelho, uma tiara decorada com pequenas pedras de jade repousava na testa, fazendo seu caminho entre os cachos escuros. Olhos cor de mel brilhantes, sardas salpicando o rosto e os ombros. Era um garoto mais velho que ele, devia ter entre quinze anos, sentado junto a uma porção de almofadas.

- O que quer dizer?

- Que não sabemos se o tutelado do Sanrrokah pode ser um menino mau. Você é importante agora e isso afeta a todos.

- Ah. - Exclamou, torcendo os dedos nervoso. - E-eu já vou embora.

- Então há pães de batata no balcão, acabaram de sair do forno, cuidado com os dedos. - Disse o garoto bonito.

Asmus pegou alguns com cuidado, o bastante para encher os braços. Quis levar a forma toda, mas estava muito quente. Deixou um deles cair. Depois outro. E outro.

Uma risada explodiu atrás dele.

- Você só precisa de um, dois talvez. Não vai conseguir comer tudo. - Caçoou o garoto de longe.

- É para o meu irmão. - Resmungou Asmus, se tinha tanta comida, por que não podia levar tudo?

- Seu irmão também não vai comer tudo isso, ali no armário verde tem uma vasilha, pegue dois para cada, deixe o resto aí. - Instruiu.

Asmus fez o que ele disse. Os pães cheiravam bem. Estava pensando em sair quando lhe ocorreu de perguntar:

- E você? Não tem medo de mim?

O garoto bonito soltou um pffft sonoro.

- Eu não disse que tínhamos medo de você. E não, não tenho. Tenho mais com o que me preocupar. - Ele cruzou os braços. - Olhe para você, mal consegue segurar um pão. Onde o Sanrrokah o achou?

Foi Asmus que riu dessa vez. Gostava dele, decidiu.

- Por aí, em Atlantis. E onde te acharam? - Ele jogou um dos pães nas mãos do companheiro, que pegou e ergueu uma sobrancelha.

- Na ilha dos cães, na verdade. - Sorriu, dando uma mordida generosa, a geleia escorreu para fora, fumaçando.

Asmus parou de mastigar para perguntar: o Sanrrokah? Mas o garoto já continuava.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora