A Caçada de Drazhan

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As luas passaram. O Sanrrokah tinha feito algum tipo de viagem para as ilhas vizinhas sob o domínio de Atlantis e Asmus deixou de ir a Sala dos Deuses. O que era bom, ele sempre voltava com perguntas martelando o fundo de seus pensamentos, precisava de algum descanso.

Ele não conseguiu encontrar Mako pela manhã. Todo o templo estava agitado. Os acólitos se apressaram e a cozinha trabalhava a mil por hora, cavalos e liteiras entravam e saíam.

Não demorou para que Asmus fosse levado de volta ao quarto, junto de Aramis. Os servos do templo foram instruídos a preparar os dois para a Caçada de Drazhan, a deusa realmente não tinha os esquecido.

As mãos dos servos foram ásperas quando banharam, secaram e perfumaram os dois mesmo depois das objeções. Asmus sabia que Aramis queria cobri-los de insultos, mas segurou a língua, o que não era do seu feitio.

- Onde estão nossas armas para a Caçada? - Aramis perguntou, mas foi ignorado. Apenas apertaram os botões de suas roupas mais rapidamente, calçaram as botas e lhe entregaram uma pequena capa branca. Asmus recebeu o mesmo. - Não vão nos entregar os arcos? Eu estou falando com vocês!

Eles saíram em um silêncio mudo deixando Aramis espumando. Ele se sentou na cama pesadamente, bufando.

- Esse lugar, essas pessoas! - Ele derrubou a chaleira que repousava na mesa de centro com um chute. Asmus se encolheu com o som dos estilhaços. - Eu quase desejo voltar a ser um pedinte a ter que lidar com isso! - Ele virou a mesinha num baque. - Estou ficando cansado de ser ignorado e deixado para trás! De que me adianta viver aqui como um príncipe quando eu me sinto um fantasma? Somos mais invisíveis do que quando éramos mendigos?

Asmus não era. Ele tinha um amigo.

Ele sabia o porquê os acólitos evitavam Aramis, mas ele tinha visto as mudanças com ele desde que Mako lhe deu um pouco de confiança. Foi como se todo o templo tivesse aberto uma janela apenas para ele. Todos o conheciam agora.

Mako lhe ensinou algumas regras para viver ali: Você não vê, mesmo se vir. Você não toca, mesmo que te ofereçam. Você não ouve, mesmo que ouça. E se quiser alguma coisa, aja como se não quisesse, mesmo que queira.

É por isso que todos os servos se mantinham afastados das "propriedades" do Sanrrokah e mesmo dos deuses.

Eles deixaram o quarto, a noite estava iluminada, os fogos fátuos guiando todos até a floresta úmida. As tendas estavam montadas ao luar, acólitos se moviam de um lado para o outro, desempacotando baús para o banquete. Os preparativos para a Caçada quase prontos. Eles viram os convidados, nobres de rostos tatuados em sua maioria, colocando cordas nos arcos e preparando bestas.

Asmus segurou a mão do irmão mais velho, subitamente nervoso.

- Está escuro demais para caçar na floresta. - Aramis murmurou. É perigoso, pessoas tropeçam e são pisoteadas, quebram ossos quando caem e podem até mesmo serem atingidas por descuido. Asmus estremeceu, ele não sabia usar um arco. As ravinas eram perigosas na escuridão.

Havia também os mais novos, da idade dele, assim como acólitos mais velhos, usando a curta capa branca. Asmus passou por uma menina que ele via ajudando nos jardins quase todos os dias. Ele ousou lhe dar um sorriso, mesmo com Aramis ao lado. Mas a menina não olhou para ele.

Os olhos dela estavam negros, fixos no vazio a frente, vendo algo que ele não via. Os lábios dela estavam rachados como barro seco e o peito dela subia e descia em chutes.

Foi ali que ele percebeu... Algo estava muito errado.

Uma mão foi colocada sobre o ombro dele e Asmus se virou num salto. Era Aksel, o deus cego. Mas Akantha, sua irmã e sombra, não estava em nenhum lugar a vista.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora