A Forca

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O convés estava limpo. O calor naquela época do ano era mais que notável.
Agnes sentia o suor descendo nas costas e a língua pesada na boca.
O general estava no Timão. Como quase nenhum capitão faria. Como apenas um desocupado faria, ou alguém que não sabe realmente como navios funcionam.

- Senhor? - Ela manteve a voz firme. Segurando um chapéu bordado no topo da cabeça. Naquele momento, ela era Agnes Adonis. Ela repetiu o sobrenome. Repetiu e repetiu, como se pudesse lhe dar forças. Como se ela não temesse ao ouví-lo antigamente.

Na noite anterior, não conseguiu dormir. Aquele sonho se arrastara até suas entranhas. O olhar duro e envelhecido a medida que sua cabeça despencava do corpo.

Ela não podia achar que era qualquer coisa diferente de um pirata agora. Ela aceitou a vida quando fez aquele acordo com Shivani. Shivani prometeu protegê-la, e ela deveria cumprir sua parte também. Pois mesmo agora, o nome da capitã a protegia. Era a única coisa que ela podia agarrar agora. Ayumi a deixou. E não havia futuro onde ela pudesse ser uma esposa.

- Senhorita Adonis. - Zain sorriu, seus olhos se estreitando sob o óculos. Simpático demais. - Não precisa me chamar de senhor, general ou Zain está bem. Como está indo sua adaptação? Acredito que seja melhor ficar longe das mulheres no navio, elas podem subir de vez em quando. Não se importe com elas, são parte do acordo para encontrá-la. Estamos há dez dias de viagem de Mangata, já estamos na costa, em breve poderemos celebrar o grande dia.

Que mentira sem propósito, pensou ela, sobre as sereias. Agnes arrumou a postura, lambeu os lábios e olhou dos cachos dourados dele até sua boca fina, de volta para seus óculos redondos, pronta para dar fim naquilo.

- Vamos até meu pai. Antes de tudo. - Ela cruzou os braços, colocando o olhar afiado que sempre via nos olhos da verdadeira Senhorita Adonis.

- Não podemos, a rota já está traçada. Estamos levando prisioneiros...

- Eu disse que vamos até meu pai. - Ela o cortou, dando um passo a frente. Seus olhos relampejaram. - Acha que vou me casar sem que meu pai saiba que estou bem apenas para que você assista seu Pontífice em um palanque? - Ela o testou, tenaz. Aquilo era perigoso, se ela não se encaixasse bem no personagem, ele não a ouviria, na verdade acharia uma piada. Era ser a mafiosa que sobreviveu à piratas ou uma garotinha assustada e traumatizada por eles. Naqueles poucos segundos, seria decidido. Se ela movesse ou desviasse o olhar, perderia aquela batalha sem palavras. Ele precisava recuar, fosse um general ou não. Ela foi audaciosa, esperava que não tivesse sido demais.

Ir à Mangata era morrer, ir aos Albatrozes era chance de sobrevivência. Só precisavam cruzar o Mar dos Alquimistas.

Zain piscou e ela sentiu os ombros relaxarem.

- É verdade, Senhorita Adonis. Fui insensível com você. A preparação deve ser impecável e não às pressas. Vou dizer aos senhores para mudarmos a rota. - Ele assentiu. Não derrotado, apenas convencido.

- Que bom que entende, Zain. - Ela freou o "obrigado" que saltaria da sua boca. Adonis não precisavam de favores. - Temos pressa.

- Senhor Zain. - Ele corrigiu seriamente, se contrapondo.

- Espero que não retire suas palavras tão facilmente assim na frente do meu noivo. - Ela sorriu como uma sereia. Cruel, doce e intensamente. Aquilo estava acabando com seus nervos, precisava sair daquela conversa o mais rápido possível ou choraria. - Ninguém gosta de um homem sem palavra, Senhor Zain. Mas eu não acredito que você seja esse tipo.

Ela desceu as escadas que levavam ao convés rapidamente, sem lançar um novo olhar.

Suas costas pesavam toneladas quando saiu de debaixo do julgamento do General. Sua respiração pesada fez suas pernas tremerem. Era muito mais difícil para a ovelha vestir a pele do lobo.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataOnde histórias criam vida. Descubra agora