Capítulo 74

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Boquiaberto e com as mãos tremulas, desdobrei a ficha e, ao ver a foto da garota com o rosto cheio cicatrizes, senti a adrenalina de vários ataques cardíacos.
Era ela! Era Maria de Fátima!
Fechei os olhos e imediatamente as lembranças em flashes invadiram minha mente, ligando um acontecimento a outro. De repente, cada frase, cada briga e provocação começaram a fazer sentido. A mesma garotinha que eu sentia como se me seguisse era a mesma mulher que arrancou de mim tudo que eu julgava ser importante.
Voltei meu olhar para a foto e, novamente, me senti culpado por tudo que lhe fiz. O lado direito do rosto de Fatinha era o mesmo que eu acabara de ver. No entanto, toda a sua bochecha esquerda, assim como o queixo e pescoço eram uma confusão de cicatrizes, as quais só me faziam lembrar que houve muitas outras espalhadas por seu corpo. E, naquele momento, realmente senti como se merecesse sua vingança.
Como eu podia ousar igualar minha dor à dela? Quando a perseguia, ela era só uma criança assustada e depois, quando transamos, era uma garota de 15 anos solitária e ingênua. Ao concluir esse pensamento, minha mente remeteu-me ao dia em que transamos na sala do diretor. Uma frase em particular abriu meus olhos para outra questão.
"Agora você me quer, não é?"
Ela devia estar se referindo à forma fria com que lhe tirei a virgindade. Depois disso, só precisei de um segundo para ligar a frase a um trecho de suas cartas.
"Minha história com esse rapaz é bastante complicada. Sempre nutri um sentimento muito forte por ele, algo inominável. Foi o primeiro a me tocar internamente e externamente, por isso meus laços com ele vão além do entendimento de muita gente."
Ainda em choque, finalmente me dei conta de que eu era aquele rapaz. Era de mim que Fatinha gostava!
– Como não percebi isso? Droga! –Larguei minhas coisas e corri o mais rápido que pude.

Fatinha PDV

Quando cheguei ao estacionamento, tirei o blaser do Democracy e o deixei deslizar por meus dedos até cair no chão. Livre dele e das desculpas que criei para não abandonar o lugar, caminhei até o Mustang.
Ao entrar no carro, segurei o volante com toda a minha força e pousei a testa sobre ele, sentido como se meu peito se contraísse em uma agonia silenciosa. Se alguém colocasse o ouvido em meu coração, provavelmente ouviria gritos ao invés de batidas.
Com dificuldade para respirar, pendi a cabeça para trás, simplesmente exausta... Sempre ouvi pessoas mais velhas dizerem que quando somos jovens os golpes da vida parecem mais fortes, porque erroneamente acreditamos que tudo é o fim do mundo. Eles podem até estar certos, mas, para quem sofre, independente da idade, é sempre O sofrimento. Vemos nosso mundo erguido de sonhos, esperanças, anseios e medos ruir em um estalar de dedos. Sofrimento é um sentimento, e para sentimento não existe lógica. No meu caso, “meu mundo” ruiu tantas vezes que me tornei uma garota psicologicamente instável e emocionalmente perdida. Então a questão era: como seguir em frente? Por onde começar?
Desesperada, coloquei as mãos na cabeça querendo gritar, mas infelizmente toda a angústia permaneceu fechada em meu peito. Revoltada com a minha incapacidade de exteriorizar o sofrimento, dei partida no carro e pisei no acelerador. No mesmo momento, Bruno se colocou na frente do veículo. Freei o mais rápido que pude, mas não consegui evitar que o impacto o derrubasse.
Nervosa, saí do carro e o encontrei estendido no chão. Ele se apoiou nos cotovelos, respirou fundo e, quando conseguiu se levantar sozinho, fiquei extremamente aliviada.

Paixão e Crueldade (Adaptação Brutinha)Onde histórias criam vida. Descubra agora