Capítulo 5

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Aruana estava atrasada. Ficara até tarde conversando com Creek, ouvindo  sobre as Novas Espécies e sentindo-se cada vez mais fascinada por eles.
Creek fora secretária de Justice North até poucos anos atrás e contara sobre os ataques e perseguições que sofrera, mas também sobre as muitas histórias de amor. Sua preferida era a sobre um Nova Espécie chamado Obsidian que estivera em coma e se apaixonara pela médica que o sequestrara para mante-lo.
Mas a noite de conversas lhe custara o atraso, pois acordou com batidas fortes à porta. Sentou-se assustada na cama, sem saber onde estava. Mais batidas soaram e ela olhou ao redor, para o quarto de paredes brancas e para as cortinas coloridas. Estava em Homeland III! E estava atrasada!
Levantou-se e correu para a sala. Creek não estava ali. Foi até à porta e a abriu, a forte luminosidade a fez estreitar os olhos. Fiber a olhou com o rosto carregado.
— Marcamos às sete horas. - falou num português com muito sotaque.
Aruana observou o homem que ocupava toda a visão da porta. Usava uma bermuda curta preta e uma camisa de malha também preta com a sigla ONE bordada no peito esquerdo; botas curtas completavam o uniforme. Era o mesmo que vira todos os Novas Espécies usando quando a buscaram em Santa Rosa.
— Bom dia, senhor Fiber.
Ele piscou.
— Está atrasada.
Ela sentiu o rosto esquentar, chateada por ter perdido a hora. Passou as mãos pelo cabelo arrepiado.
— Me desculpe. Eu vou me arrumar rapidinho.
Fiber a olhou de cima a baixo e ela sentiu-se grata pela blusa velha e shorts largos que usara para dormir. Não gostaria que ele a visse de baby doll.
Ele não se mexeu e ela admirou sua altura e os ombros largos; um colar indígena aparecia no colarinho da blusa.
— O senhor me dá licença?
Ele apertou os lábios e assentiu com a cabeça. Deu um passo para trás.
— Esperarei aqui.
— Não precisa, eu  posso encontrar o senhor no escritório.
— Sou sua escolta.
— Escolta? - Aruana se lembrou de que a revista a informara que teria um acompanhante durante a visita, mas não imaginou que seria uma escolta. — Há animais selvagens ao redor?
— Mais do que possa imaginar.
— Está bem. - segurou a maçaneta. — Com licença.
Ela fechou a porta mesmo com ele parado ali do lado de fora. Correu para o quarto e pegou uma calça cáqui e uma camisa leve. Resolveu deixar o banho para depois, porque não queria se atrasar mais. Se vestiu rapidamente e verificou sua bolsa transversal. Calçou botas macias e saiu da cabana, insegura com o dia que teria.
Ao sair deu com Fiber de costas no degrau da varanda. Piscou com a visão dele; sua figura era impressionante, os músculos das costas se ressaltando na blusa, as pernas longas e de músculos destacados. Sabia que as Novas Espécies haviam sido criadas para serem fisicamente melhores que os seres humanos, porém eles também eram muito atraentes. Pensou nos pôsteres de Justice e Fury North e Jaded Wild que há anos enfeitavam paredes femininas no mundo todo.
— Estou pronta. - ele se virou e, ao olhá-la, franziu  a testa. Aruana se empertigou. — Algum problema?
— Nenhum. - Fiber balançou a cabeça. — Vamos.
Cismada, ela o seguiu.
À luz do dia, admirou o aglomerado de cabanas espalhadas por uma grande área. Eram todas brancas com cortinas coloridas e varandas com cercas azuis. Algumas tinham flores na entrada. Mais à frente, as cabanas compridas imitavam as menores. Trilhas de pedriscos ligavam as cabanas ao caminho asfaltado por onde ela viera na noite anterior.
Caminharam na direção da entrada. Passaram pelo Clube e ela pensou no café da manhã. Como se despertado, seu estômago roncou. Ele a olhou.
— Com fome?
— O senhor não vai tomar o café da manhã?
— Tomei há duas horas.
— Ah...
Fiber se direcionou para o pavilhão. Aruana viu diversos Novas Espécies circulando por ali e todos a observavam atentamente.
Uma mulher que carregava um grande cesto de vegetais na cabeça parou na frente deles.
— Já está indo? - perguntou em inglês para Fiber.
— A humana tomará café.
A mulher a encarou. Era bronzeada com cabelos castanhos presos debaixo de um boné.
— Bom dia, humana. Sou New.
— Aruana. Muito prazer.
— Vou entregar  as verduras e esperarei vocês.
— Obrigado. - disse Fiber.
New continuou a caminhar e Aruana pensou que Fiber era um ogro por não se oferecer para ajudar com o cesto.
— Você quer ajuda, New? - perguntou, dando uma olhada para ele.
— Com o quê?
Aruana estranhou a pergunta.
— Com o peso.
A mulher deu uma risadinha.
— Mas está muito leve.
— Me parece bem pesado.
New olhou para Fiber e sorriu para ele.
— Viu? A humana se importa comigo.
— Você precisa de ajuda? - ele perguntou, com o que Aruana considerou sarcasmo.
— Está brincando comigo?
— Nunca.
— Você é um macho fofo.
Aruana ficou confusa com a conversa e muito mais por New o tratar com carinho. A mulher riu novamente e Aruana os seguiu em silêncio.
Entrou no refeitório do Clube e ficou surpresa ao encontrar muitos humanos. Viu uma mão acenando para ela e se virou, era Estela.
— Aruana, sente-se aqui!
Ela olhou para Fiber que concordou com a cabeça. Aproximou-se da mesa onde estavam Estela, uma criança de cerca de seis anos e uma mulher baixinha. Chegando mais perto, Aruana foi tomada de surpresa. Tanto a criança quanto a mulher eram Novas Espécies!
— Bom dia, Estela.
— Bom dia, Fiber. Bom dia, Aruana.
— Bom dia. Aruana, esta é Bella. - falou em português.
O nariz achatado e as maçãs do rosto destacadas mostravam que a pequena mulher era especial, mas seus traços eram delicados e os olhos castanhos muito doces.
— Como vai, Aruana?
— Vou bem, obrigada.
Estela passou a mão na cabeça do garotinho
— Este é meu filho, Peace.
Aruana ficou embasbacada com o garotinho. Não parecia com a mãe, seus cabelos abundantes e castanhos rodeavam o rostinho diferente e seus olhos de um azul elétrico brilhavam.
— Oi. - o garotinho falou, subindo na cadeira.
— Pode sentar, menininho. - a mãe ordenou.
— Quero ficar alto igual o papai.
— Se não tomar o seu leite não ficará, não.
Peace sentou, não sem antes fazer uma careta.
— Pegue o seu café, senhorita. - disse Fiber.
Aruana não o olhou.
— Já volto, Estela.
Ela caminhou para o bufê e as pessoas a cumprimentavam. Percebeu que a maioria era brasileira, mas havia alguns norte-americanos.
Aruana se serviu de pão com manteiga, uma fatia de bolo, uma xícara de café com leite e um potinho de salada de frutas. Gostava de se alimentar bem pela manhã.
Voltou para a mesa e parou diante da cena que acontecia nela. Fiber estava com Peace no colo e segurava o copo de leite que ele bebia. O garoto afastava o rosto e Fiber lhe dava pedaços de bolo na boca. Peace parecia muito pequenino entre os braços dele.
De repente Peace balançou a cabeça rejeitando o leite.
— Não quero.
— Tem que tomar tudo.
— Bebe primeiro.
Fiber tomou um gole do leite e o garotinho riu.
— Pronto. Agora, beba.
Peace tomou o restante do leite, balançando as pernas, enquanto mexia nos cabelos de Fiber.
Aruana se sentou, fingindo não ver o enorme Nova Espécie com o menininho no colo. Estela sorriu balançando a cabeça.
— Ele é grande, mas só tem quatro anos.
— Sério?
— Nossas crianças se desenvolvem muito rápido.
— Que interessante!
Aruana soprou o líquido na xícara, pensando que tinha muito a aprender sobre aquele povo.
Olhou para Fiber por cima da xícara. Como podia um homem tão rude e desagradável ser capaz de tratar uma criança com tanto carinho?
Bebeu o café com leite . Talvez precisasse aprender sobre aquele homem-fera também.

Fiber: Uma história Novas Espécies 4Onde histórias criam vida. Descubra agora