Capítulo 43

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Fiber só diminuiu a velocidade quando chegou na sua cabana. Abriu a porta com um safanão e ela bateu na parede. Fechou-a com um chute .
Ficou parado no meio da pequena sala, sentindo-se perdido.
Não estava no controle. A saudade e a raiva se misturavam ao desejo e ele não sabia o quanto conseguiria se controlar. Se era para sacudi-la ou transar com ela, não sabia. Colocou Aruana em pé e a encarou em silêncio.
Ela passou a mão nos cabelos, jogando a franja para trás.
— Eu senti muito a sua falta. - ela começou. — Eu achava que tinha tomado a decisão certa... para nós dois.
— Você sabia que eu queria me acasalar. Não devia ter ficado na colônia.
— Eu sei, eu sei, mas não conseguia deixar você.
— Você deixou.
— Fiber, você praticamente me expulsou daqui. Foi embora e não me deixou nem despedir.
— Para quê?
— Nós... tivemos um relacionamento muito intenso e eu estava muito confusa. Tentei te explicar, mas você não deixou.
— Você já tinha dito tudo que tinha a dizer.
Ela fechou os punhos.
— Você nunca me ouve! Sempre sai quando discutimos.
— É para não perder o controle, Aruana. - deu um passo para ela, quer ergueu o rosto para vê-lo. — Não sou um homem. Se perco o controle sou capaz de te magoar... ou ferir.
— Você disse que eu não precisava ter medo.
— Porque eu me afasto.
Ela piscou rapidamente.
— Podemos conversar agora? Você vai ficar?
Ele deu um rosnado e cruzou os braços.
— Estou aqui, não estou?
Aruana o encarou por um momento e depois se sentou no sofá.
— Sente-se também.
Fiber preferia ficar em pé, contudo sentou-se numa poltrona. Ela torceu os lábios, mas não reclamou. Cruzando as mãos sobre o colo, começou a falar.
— Minha avó foi para São Paulo, porque era espancada pelo marido. Ela tinha só dezesseis anos. Sua tribo não a protegeu e ela decidiu fugir. Conseguiu uma carona de barco até Manaus e foi de carona em carona que chegou em São Paulo. Ela precisou lutar para comer e ter onde ficar. Quando tinha vinte anos conheceu meu avô, mas teve medo de repetir a mesma história. Meu avô levou mais de dois anos para vovó aceitá-lo como companheiro. - Fiber estava sentado imóvel, a encarando, pensando onde pretendia chegar. — Minha avó lutou para os filhos terem uma educação e serem independentes, mas não os criou nas tradições da sua tribo. Ela queria que eles tivessem mentes livres.- Aruana esfregou as mãos. — Meu pai seguiu o exemplo da minha avó e também me criou para ser independente. Eu sou independente. Vivo sozinha desde os dezoito anos e percorri o Brasil e as Américas com meu trabalho. Nunca quis me casar ou ter filhos, minha maior realização era o meu trabalho. Te conhecer foi... - suspirou. — Nunca esperei ter um envolvimento tão forte com alguém. Eu sabia que não deveria me envolver contigo, mas... - inspirou. — Não resisti.
Fiber engoliu em seco. Também não conseguira resistir.
— Você quis se divertir. - acusou.
Aruana franziu a testa e ergueu o queixo.
— Você, não?
Fiber se lembrou da loucura que o acometera ao conhecer Aruana. Seu aroma o atiçava e a presença dela lhe causava um desejo que o transtornava.
— Eu quis você.
— E eu te quis, Fiber. Depois que fizemos amor eu não conseguia ficar longe de você, te queria o tempo todo. - o rosto dela ficou muito vermelho. — Quando você falou de acasalamento eu fiquei chocada, porque, na minha cabeça, nosso relacionamento duraria só até o final da reportagem.
— Você quis ficar.
— Eu quis, mas não sabia o que fazer com aquilo tudo. E aí... aconteceu Leona. Eu achei que era um sinal de que era tudo demais para mim.
— E foi embora. - ele declarou, se levantando. Estava cansado das razões de Aruana.
Aruna também se colocou em pé.
— Não vá embora!
Fiber ja estava com a mão na maçaneta.
— Para quê? Para me convencer que me deixar foi o correto?
— Eu pensava assim.
— Sua avó e seu pai te ensinaram a ser sozinha. Você quer ficar sozinha. - ele abriu a porta. — Não precisava ter vindo aqui para me dizer.
Aruana gritou.
— Se sair agora nunca mais vai me ver!
Fiber a encarou. Seu coração doía, tinha tanto medo do que ela diria que queria fugir dali. Receava ter esperanças e ela o despedaçar novamente.
— Não me ameace, fêmea.
— Está se sentindo ameaçado? Então tem medo de nunca mais me ver novamente, não é?

Aruana se tremia toda. Não esperava aquela reação de Fiber. Queria que ele entendesse os seus motivos, porém ele pretendia fazer o que sempre fazia: deixá-la.
— Você disse que me ama, mas não se preocupa comigo de verdade. - acusou.
— Isso não é fato.
— Queria se acasalar comigo, mas não se preocupou em me conhecer.
— Como é?
— Você viu que eu estava insegura com nossa relação e só quis me pressionar e pressionar. - ele franziu as sobrancelhas e ela viu suas presas. — Não se incomodou do meu medo por causa de Leona.
Fiber fechou a porta.
— Eu me incomodei. Iria te proteger.
— Mas eu ainda estava com medo... E não só das diferenças das Novas Espécies.
— Ninguém iria feri-la.
— Você não pode ter certeza. E não entendeu meu medo. Todo o meu medo. Meu medo de mergulhar num relacionamento sério.
— Você tem medo de ser uma companheira?
— Tenho.
Fiber balançou-se para frente e para trás.
— O que você quer, afinal, Aruana? O que veio fazer aqui?
Ela fez beicinho, magoada com a rispidez de Fiber. Ele estava sendo tão intransigente e orgulhoso! Seus ombros cairam.
— Perder meu tempo, vejo agora. - lágrimas encheram seus olhos e ela passou as mãos neles. — Mas eu finalmente disse tudo o que queria dizer.
Caminhou para a porta, contudo ele não saiu da frente.
— Você quer que eu te entenda, é isso? Eu entendi. Tem medo da selvageria do meu povo, tem medo de acasalar, tem medo de tudo.
— Dá licença, Fiber.
— Talvez tenha razão. Sou meio animal e vivo longe dos outros humanos. Você viveria insegura aqui e perderia sua importante liberdade.
— Deixe eu passar, Fiber.
— Veio aqui se justificar e eu devo fazer o gesto grandioso de perdoá- la. E depois, o quê? Voltará de alma lavada para São Paulo?
Aruana sentiu-se humilhada. Aquele homem não a perdoaria por agir como uma humana! Deu um passo para a porta e tentou passar, mas ele era como uma muralha.
— Saia, por favor.
— Quer falar, mas não quer ouvir?
— Fiber, por favor.
— Eu estou frustrando seus planos?
Aruana perdeu o controle.
— Me. Deixa. Passar! - gritou e o empurrou.
Fiber a segurou pelos ombros.
— Você sabia que iria embora e mesmo assim transou comigo. Foi isso que veio fazer aqui? Ter sexo com o homem-fera? - Aruana ergueu a mão com força e tentou lhe dar um tapa, ele porém agarrou sua mão. — Não faça isso. - rosnou, as presas de fora. Aruana começou a se debater para se desvencilhar dele. — É isso que você quer? Licença para trepar comigo quando der vontade?
Ela chutou a perna dele e tentou arranhar seu rosto. Fiber segurou-a pelo pescoço e a afastou com facilidade.
As lágrimas de Aruana explodiram e ela lutou contra ele. Tentou alcançá-lo, atingi-lo de alguma forma, mas sequer conseguia acertar um golpe. Cravou as unhas no braço dele e mordeu sua mão. Ele rosnou, mas não a largou.
O peito dela se rasgou. Viera com tanta esperança de se explicar, porém ele a odiava! Um arrependimento imenso a tomou e desejou nunca ter partido. Parou de lutar e se abraçou, deixando o pranto cobrir sua vergonha e frustração.
— Me deixa ir... - implorou, num choramingo.
Fiber soltou seu pescoço.
— Quer ir? Vá. - ordenou com uma voz cavernosa e saiu da frente da porta.
Aruana se lançou contra a porta e a abriu. O céu vermelho do crepúsculo a surpreendeu, algo tão lindo existindo ao mesmo tempo que sua dor. Correu, sem se preocupar para onde.
Disparou pelas alamedas da vila, as lágrimas rolando . Procuraria Creek e explicaria que tudo dera errado. Ele a odiava e não a queria.
Então ouviu passadas apressadas, cada vez mais perto e mãos a agarraram pela cintura. Ela parou bruscamente, sentiu-se ser puxada contra um corpo duro e suas costas bateram contra ele.
Foi abraçada por trás e logo sentiu o rosto no seu pescoço.
— Não, não vá. Por favor, fique comigo Aruana.

Fiber: Uma história Novas Espécies 4Onde histórias criam vida. Descubra agora