Capítulo 28

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Fiber precisou do pouco controle que lhe restara para não correr. Seu ouvido ainda zunia com as palavras de Aruana. Ela jogara por terra tudo o que ele pensava sobre seu relacionamento.
Imaginara que sua história fosse como as dos seus amigos que encontraram suas companheiras. Acreditara no sentimento que crescia entre eles.
Sentira um ódio visceral quando ela o recriminara por seus ciúmes, mas realmente se quebrara quando ela mostrou que o que viviam não era especial.
Atravessou a vila e foi na direção do ginásio. Ligou para Blade.
— Oi.
— Vamos lutar?
— O quê? Era para você estar agora com sua fêmea.
— Vamos lutar.
Blade fez silêncio por um momento.
— O que aconteceu, amigo?
— Quero lutar.
— Você nunca quer lutar.
— Agora eu quero. Você virá?
— Bem... Eu pretendia ficar um pouco com Thainá.
— Então deixe.
Não, não. Vou te encontrar.
— Estou chegando no ginásio.
— Estou indo.
Fiber entrou no ginásio e um jogo de vôlei estava em andamento. Machos e fêmeas jogavam juntos, enquanto alguns humanos assistiam. Passou direto pela partida e foi para o espaço de lutas. Não havia nenhuma acontecendo.tirou a camisa e os tênis, jogando-os longe. Um macho o notou e foi até ele.
— Vai lutar?
— Vou.
— Com quem?
— Blade.
— Você levou uma surra dele semana passada.
— Mais um motivo para eu querer lutar.
— Vou assistir.
O macho foi até a arquibancada e sentou. Outro se aproximou.
— Fiber vai lutar?
— Com Blade.
— De novo? Blade quebrou o nariz dele.
— Acho que ele quer revanche.
— Vai levar outra surra. - o macho falou e se sentiu também.
Fiber andava de um lado para outro, ruminando a última meia hora. Agira como um idiota, se lamuriando por Aruana ter escolhido passar o dia com Felipe. Se odiou, pois imaginara ser o macho dela e acabara sendo um apenas. Ele pensara que ela sentia algo maior por ele.
Ele se encolheu quando a palavra amor caiu pesada em sua mente. Era o que estava sentindo por ela? Rosnou para si mesmo, sentindo o peito pesar comum sentimento que nunca sentira antes, que lhe tirava o ar.
Viu Blade entrando no ginásio segurando a mão da doutora Thainá. Mais um de quatro por uma humana!
Percebeu que vários espécies começavam a observá-lo, mas não se importou. Queria lutar para diminuir a energia provocada pela raiva.
Blade se aproximou.
— Ei. - Fiber apenas grunhiu.— O que aconteceu?
— Quero lutar.
— Eu sei disso, mas por quê?
Ele não estava disposto a desabafar com Blade, pelo menos não na frente da médica. Apenas balançou a cabeça e o amigo pareceu entender.
— Fiber... - começou a doutora Thainá. — Você teve uma concussão há menos de uma semana. Não aconselho lutar.
— Obrigado, doutora, mas estou bem.
Blade apertou a mão da namorada.
— Fique na arquibancada.
— Blade, é melhor ele não...
Blade tocou em seus lábios, interrompendo-a.
— Fique tranquila.
A médica foi para a arquibancada, nada satisfeita. Blade tirou a blusa e os tênis; hesitou um momento e tirou as calças.
— Não quer sujar suas roupas de sangue? - Fiber provocou.
— Eu prefiro que não tenha sangue nenhum. - dobrou as calças e a colocou junto à blusa. — O que aconteceu?
— Nada.
— Nada e você quer lutar?
— Isso.
Blade torceu os lábios.
— Podemos conversar.
— Quero lutar.
— Certo.
Um macho de longos cabelos claríssimos, Morning, chegou correndo.
— Posso lutar com vocês?
— Não. - cortou Blade.
— Pode. - respondeu Fiber.
— Você quer se machucar, não é? - acusou Blade.
— Vamos lutar. - e sem nenhum outro aviso se jogou contra Blade.
Os dois começaram a lutar e Fiber sentia a raiva percorrer seu corpo. A primeira pancada que levou no rosto o fez rosnar e devolver o golpe com fúria. Com os olhos arregalados, Blade mostrou sua surpresa. O outro macho já se despira e pulava à beira do tatame, se aquecendo.
Blade se jogou contra Fiber e recebeu um chute na barriga que o fez dobrar-se de dor. Morning deu um grito, animado, e pulou sobre Fiber.
Sentindo o corpo eletrizado pela adrenalina, Fiber agarrou o macho pela nuca e o jogou longe. Blade se levantou e se atracou com Fiber, trocando golpes.
Morning se aproximou e agarrou Fiber, prendendo seus braços nas costas. Não esperava, porém que Fiber lançasse a cabeça para trás e acertasse seu nariz. O homem se curvou com a dor, sangue escorrendo do seu nariz.
Blade se jogou e segurou Fiber pela cintura, tentando derruba-lo, mas apenas conseguiu que o amigo lhe desse um golpe com o joelho que o desestabilizou.
De repente a partida de vôlei foi interrompida e uma pequena multidão cercou o trio. Uma fêmea apareceu com uma maleta de primeiros socorros.
Morning agarrou Fiber e os dois rolaram no chão. Fiber deu uma chave no pescoço do homem, fazendo-o perder o ar e bater várias vezes no chão, desistindo.
Blade pulou nas costas de Fiber, porém ele usou o ímpeto do amigo para arremessa-lo longe.
A torcida urrou quando Fiber ficou em pé no meio do tatame. De um lado Morning respirava pesadamente, segurando a garganta. Do outro, Blade se levantava devagar. Os três estavam cobertos por marcas vermelhas dos golpes trocados. Blade mostrava as presas, mas Fiber não se importou.
— O que aconteceu, Fiber?
— Você veio para lutar ou conversar?
Blade respondeu dando um salto, porém os instintos felinos de Fiber eram muito apurados. Quando Blade chegou ao canto do tatame, Fiber já havia saltado por cima dele. Assobios e palmas soaram no ginásio.
Blade rosnou e correu para Fiber. Os dois colidiram e voltaram a trocar golpes cada vez mais violentos. O olho esquerdo de Blade estava quase fechado, o supercílio sangrando e Fiber tinha um corte no lábio inferior. Ambos estavam cobertos de suor.
Thainá se dividia entre atender Morning e acompanhar a luta do namorado.
Fiber e Blade se engalfinharam no piso e os que estavam na luta deles na semana anterior reconheceram que Fiber fez a mesma manobra do final da luta. Prendeu Blade com uma chave de braços e o macho tentou se soltar.
Novamente Blade procurou acertar o rosto de Fiber, entretanto não conseguiu.
— Eu desisto. - Blade rosnou.
A multidão foi ao delírio. Até onde se sabia, o único macho que conseguira vencer Blade fora Jaded; e numa luta verdadeira.
Fiber ouviu Blade, mas estava intensamente agitado e não soltou o amigo à princípio.
— Ei, amigo. - chamou Blade. — A luta acabou.
Fiber chacoalhou a cabeça, como se estivesse se livrando de algo. Soltou Blade, que gargalhou. Fiber se levantou e estendeu a mão para o amigo.
— Você está bem?
— Você me deu uma surra. - respondeu se levantando.
— Foi uma boa luta.
Morning acenou para eles; tinha gaze nas narinas. Os dois evitaram os espécies que os cercavam e chegaram até o homem.
— A luta foi ótiba. Obrigado por me deixarem participar.
Fiber fez uma careta.
— Era para você lutar comigo e não contra mim.
Bela sua cara, achei que o Blade precisava bais.
— Agradeço pela parte que me toca. - reclamou Blade.
Thainá segurou queixo de Blade.
— Abaixe o rosto.
O grande macho obedeceu de pronto e ela pressionou seu supercílio com uma gaze. Thainá olhou para Fiber.
— Coloque um gelo nesse corte.
— Vou para casa.
— Se você se sentir tonto, me ligue.
— Tudo bem.
Fiber apertou o ombro de Blade.
— Obrigado pela luta.
— Te ajudou?
— Sim.
Fiber acenou com a cabeça para Morning, foi ao tatame e pegou sua camisa e os tênis.
Enquanto caminhava para a saída do ginásio, recebeu vários cumprimentos. Todos sabiam que evitava lutas e que Blade era um lutador muito superior a ele, daí a comemoração.
Saiu do ginásio e caminhou para sua cabana. A raiva que sentira se transformou numa mágoa que jamais sentira antes.
A tarde estava agradável, com a temperatura amena para a época do ano e, em qualquer outro dia, estaria admirando a natureza amazônica. Tentava não pensar em Aruana, porém o rosto dela não saía de sua mente. Certamente ela já devia ter recolhido sua bagagem e voltara para a cabana de Creek.
Ele respirou fundo. Não apenas a aborrecera, como assustara também.
Chegou na sua cabana e parou na varanda. Naquela manhã ela o abraçara com tanto carinho, mas... Descobrira bem rápido que o sentimento dela, fosse lá qual fosse, não era profundo como ele desejara.
Lembrou dos dias anteriores da sua libertação de Mercille. Estava fraco de fome, extremamente magro, com ossos recém quebrados e chorara sozinho em sua cela, desesperançado. Agora era livre, estava saudável, porém fazia força para conter as lágrimas. Ser solitário era o seu destino?
Entrou na cabana e o cheiro de Aruana o fez gemer. Teria que trocar sua roupa de cama e pedir que limpassem sua cabana. Deixou cair os ombros, satisfeito que estava em casa. Tudo o que queria era tomar um banho frio e deitar. Solitário.
Abriu a porta do quarto e estacou, surpreso.
Aruana estava sentada na beirada da cama. Seu rosto estava inchado e seus olhos úmidos. Ela se levantou e pousou as mãos na cintura.
— Vamos conversar.

Fiber: Uma história Novas Espécies 4Onde histórias criam vida. Descubra agora