Fiber não pretendia lutar naquele dia, mas talvez fosse uma boa ideia.
Acordara às cinco da manhã, mais tarde do que o costume. Como todo Nova Espécie, dormia bem tarde e por menos de cinco horas por noite.
Sonhara com Mercille. No sonho estava numa das lutas que os médicos obrigavam para verificar os medicamentos que os tornavam mais fortes. Ele e seus companheiros eram forçados a lutar até um cair desacordado, senão ambos ou fêmeas seriam duramente castigados. Acordara tenso e desejando matar um dos seus aprisionadores.
Encontrar com a mulher mais cedo fora uma provocação ao seu humor, porém caminhar com ela era uma tentação. No escritório sentira o desejo de tocar nela. Mas durante a visitação à plantação não quisera somente tocar, queria tocar, beijar, lamber... O corpo dela o atraia muito, mas foram seus gestos , seu sorriso que o fizeram querer conhecê-la melhor.
A presença de Felipe o irritara cada vez que o rapaz se aproximava dela ou a tocava enquanto falava. Não sabia por que, mas aquilo o incomodara. Tratara de afastá-la do engenheiro agrônomo.
Agora, por provocação dela, lutaria com Blade. Lutava com seus amigos, pois usavam o momento para queimar o excesso de energia e agressividade. Justice sempre os incentivava a lutar, principalmente aqueles espécies que lidavam com humanos. E ele estava com dificuldades em lidar com uma humana em especial...
Foi para o tatame num canto do ginásio e viu que os amigos pararam de lutar.
— Vai lutar com quem, Fiber?
— Blade.
Um macho assobiou e outro falou com ele.
— Se precisar de ajuda é só pedir.
Fiber sabia que Blade era um grande lutador, mas soubera que Jaded quase o matara por causa de uma fêmea, agora sua esposa. Blade saíra de coração partido e viera para a Amazônia com o primeiro grupo, um ano atrás. Talvez o macho lutasse tanto para esquecer aquela luta e aquela perda.
Blade sorriu para ele.
— Quer uma luta de humanos?
— Não.
— Então será até cair?
— Você quer cair?
Blade deu uma gargalhada e Fiber teve que responder com um sorriso. Era bom ver o amigo alegre.
Deu uma olhada para Aruana e viu que ela estava com a máquina fotográfica.
Engraçadinha... - pensou, pois imaginou que ela torcia contra ele. — Tenho que ser mais gentil com ela.
Blade parou e esperou, com um sorriso no rosto. Fiber contou que levaria uma surra do amigo na frente da humana. Conformado, partiu para o ataque.Aruana ajeitou o foco da câmera para registrar fotografias de perto. Percebeu que os Novas Espécies que se exercitavam pararam e foram em direção à arena. Calculou que aquela luta era especial por algum motivo.
— Não acredito que Fiber vai lutar. - disse um rapaz humano ao lado dela.
— E com Blade!- continuou uma mulher sentada um degrau acima.
— Blade não é tudo isso.
Uma outra mulher se envolveu na conversa.
— Você acha, então por que vem todos os dias vê-lo lutar?
— E você também não vem? - perguntou, parecendo aborrecido.
— Gosto de ver todos.
— Queria saber o que o seu marido pensa disso!
— O que os olhos não veem o coração não sente.
— Cínica!
Os dois caíram na gargalhada. A mulher ao lado de Aruana chamou a atenção dos dois.
— Para, gente!
O rapaz zombou.
— Olha a admiradora número um do Blade falando!
A mulher fez uma careta para ele e quando viu que Aruana a olhava, sorriu para ela. Era claramente indígena.
— Oi. Você é a repórter?
— Sou. - estendeu a mão. — Aruana, prazer.
— Eu sou a Thainá. - respondeu cumprimentando. — Só veio você?
— Só.
— Vai torcer para quem?
— Tenho que escolher um?
— Os dois são ótimos lutadores.
— Mentira. - o rapaz interrompeu. — Ela está torcendo para o Blade. - ele fez uma expressão maliciosa. — É o predileto dela.
Thainá deu um sorriso sem graça.
— Fiber quase não luta.
— Então vou torcer por ele.
— Boa.
Aruana focou a câmera no momento que Fiber saltou sobre Blade; a câmera tremeu em sua mão com a violência.
Tirava uma fotografia atrás da outra, sobressaltando-se a cada golpe mais violento.
Estranhou que só os humanos na arquibancada faziam barulho, as Novas Espécies observavam a luta em silêncio, como se assistissem a um filme muito bom.
Aruana não conseguia tirar os olhos de Fiber. Apesar de grande, ele se movia com facilidade. A pele escura e os longos cabelos negros o assemelhavam a um indígena americano e poderia se misturar aos nativos acrianos se não fossem o tamanho e as feições marcadas. Ela via seus músculos se estirando e um estranho calor subia por seu corpo. Ele era tão grande, tão bem-proporcionado, tão... Apertou os lábios com força. Não podia estar atraída por ele, podia?
Blade deu um golpe forte e Fiber voou longe. Aruana deu um grito e ficou em pé. Thainá a puxou para sentar.
— Não se preocupe. Eles são durões. - e ,de fato, Fiber se levantou, juntou as mãos e deu um soco no peito de Blade, que recuou alguns passos, mas não caiu. — Eu não disse?
— Você vê sempre essas lutas?
— Dentro e fora do tatame.
— Como assim?
— Sou do corpo médico de Homeland III. - mostrou a maleta de primeiros socorros.
— Ah, que legal.
—Sempre que alguém do Centro Médico vem assistir, traz uma maleta. Esses garotos gostam de uma briga.
Aruana sorriu, porque era a segunda vez que uma mulher chamava aqueles homens-feras de garotos.
O rapaz deu um gritinho agudo quando Blade saltou sobre Fiber e caíram, se engalfinhando no chão.
— Eu não aguento ver! - ele reclamou.
Thainá riu.
— Josi sempre diz isso, mas sempre volta.
Passando o braço por cima da cabeça de Thainá, ele estendeu a mão para Aruana.
— Josivaldo da Conceição, prazer.
Aruana apertou a mão, rindo.
— Aruana.
— Eu sei, Estela me contou.
— Josi é nosso enfermeiro.
— Eu que faço curativos nos grandões. E eles se machucam pra valer.
Uma comoção dos Novas Espécies chamou a atenção deles. Fiber dava uma cruzada de perna em Blade e parecia que ganharia a luta.
— Nossa! - gritou Thainá, levantando-se.
Os homens assobiavam ou batia palmas. Quando Aruana dava a vitória de Fiber como certa, Blade se contorceu e deu um tremendo golpe com o calcanhar no rosto do outro.
A arquibancada fez uma arruaça, Blade se soltou e se ergueu, rindo. As Novas Espécies se levantaram e cercaram Fiber caído no chão; eles brincavam, mas Aruana notou que Fiber não se mexia.
— Thainá, ele não está se mexendo.
— O quê? - perguntou Thainá.
— Fiber está desacordado!
Thainá se levantou. No círculo, os Nova Espécies pararam de rir. Thainá chamou Josivaldo.
— Vamos lá!
Os dois correram para a arena e Aruana os seguiu.
— Para trás, pessoal! - pediu Josivaldo.
Aruana arfou ao ver o rosto de Fiber coberto de sangue que escorria do seu nariz; estava desacordado.
Thainá e Josi ajoelharam-se e começaram a prestar os primeiros socorros em Fiber. Blade se ajoelhou do lado de Thainá.
A médica e o enfermeiro foram rápidos para interromper o sangramento.
— Fiber! - Thainá chamou; ele não reagiu. — Fiber, pode ouvir?
Aruana se abaixou e ajoelhou ao lado de Blade.
— Ele... ele não quer acordar?
As pálpebras dele se mexeram, mas não abriu os olhos.
Thainá levantou uma pálpebra.
— A pupila está reagente. Vamos erguer a cabeça. - Blade ergueu a cabeça de Fiber. Sem pensar, Aruana se colocou por trás de Fiber e Blade pousou a cabeça nas coxas dela. As narinas de Fiber estremeceram e seus olhos abriram.
— Fiber, pode me ouvir? - perguntou a médica, porém ele não respondeu. Ela levantou o indicador. — Se estiver vendo meu dedo, pisque os olhos.
Fiber fechou os olhos. Aruana segurou seu rosto e abaixou a cabeça.
— Senhor Fiber? - ele abriu os olhos. — Oi! Está me ouvindo? - ele piscou lentamente. — Olhe o dedo da doutora Thainá. - Fiber focou o dedo da médica. — Isso mesmo. Agora preste atenção nela.
— Fiber, siga meu dedo com os olhos. - Thainá mexeu o dedo de um lado para o outro e ele o seguiu.
Fiber fechou os olhos de novo e, quando os abriu, olhou para Aruana. Ela sorriu para ele, feliz por estar reagindo.
Fiber ergueu a mão direita e cobriu a dela em seu rosto.
— Oi. - ele falou e fechou os olhos.
— Fiber. - chamou Blade, entretanto o amigo permaneceu de olhos fechados. — Cara, fale comigo.
Thainá segurou o braço de Blade.
— Vamos levá-lo para o Centro Médico.
Quatro Novas Espécies levantaram o corpo pesado do Nova Espécie e Aruana foi substituída por Josi. Os homens saíram rapidamente do ginásio, seguidos por Thainá e Blade .
Aruana ficou um momento sem saber o que fazer. Olhou para as mãos manchadas com sangue, piscou e saiu correndo atrás do grupo.
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Fiber: Uma história Novas Espécies 4
FanfictionQuando Fiber foi libertado do laboratório Mercille no Colorado, ele encontrou a sociedade das Novas Espécies estabelecida. Mesmo com todo o apoio da ONE, Organização das Novas Espécies, Fiber sente que não se adaptou totalmente ao mundo. Sente-se ma...